Sempre que cometemos um erro ortográfico ou gramatical, seja em contexto pessoal ou profissional, podemos ser alvo de troça ou discriminação por quem nos rodeia. Erros linguísticos como “tu fostes à reunião?”, “foi uma perca de tempo”, “houveram pessoas que faltaram”, “ninguém se absteu” não só mancham a nossa imagem, como também podem fazer-nos perder, em poucos segundos, um bom emprego, um bom negócio e até um relacionamento!
A competência linguística, associada ao domínio da comunicação oral e escrita, assume, inequivocamente, um valor sociocultural relevante, promovendo cada vez mais aceitação, credibilidade e prestígio social.
Vejamos então alguns erros linguísticos que, do meu ponto de vista, podem manchar a nossa imagem pessoal profissional.
ERRO 1: p[ó]ssamos
Forma correta: possamos
As formas verbais da 1.ª pessoa do plural do presente do conjuntivo são graves, ou seja, o acento tónico recai na penúltima sílaba: tenhamos, sejamos, possamos.
ERRO 2: a gente vamos
Forma correta: a gente vai
Na expressão a gente, o verbo deverá estar sempre no singular, em concordância com essa expressão.
ERRO 3: houveram pessoas
Forma correta: houve pessoas
Sempre que é verbo principal, o verbo haver só se conjuga na 3.ª pessoa do singular, porque é um verbo impessoal (há, houve, havia, haverá, haveria, haja…).
ERRO 4: ele interviu
Forma correta: ele interveio
O verbo intervir conjuga-se como o verbo que está na sua base – o verbo vir: ele veio; ele interveio.
ERRO 5: vocês ha dem
Forma correta: vocês hão de
O paradigma de conjugação do verbo haver no presente do indicativo é: eu hei de, tu hás de, ele há de, nós havemos de, vós haveis de, vocês / eles hão de.
ERRO 6: faria-o, se possível
Forma correta: fá-lo-ia, se possível
No futuro do indicativo e no condicional, os pronomes pessoais complemento (-me, -te, -o, -lhe…) colocam-se em posição mesoclítica, isto é, no meio do verbo, antes das terminações de tempo e pessoa.
ERRO 7: como deve de ser
Forma correta: como deve ser
Ao contrário do nome dever, o verbo dever não requer a presença da preposição de.
ERRO 8: à muito tempo, à 1 semana
Forma correta: há muito tempo, há uma semana
A forma verbal há (verbo haver) pode assumir um valor temporal, podendo ser substituída pela forma verbal faz: faz muito tempo, faz 1 semana. Tem um valor durativo no passado.
ERRO 9: tu fostes
Forma correta: tu foste
A forma verbal correspondente à 2.ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo do verbo ir ou ser é foste. A forma verbal fostes corresponde à 2.ª pessoa do plural: vós fostes.
ERRO 10: Derivado a um vírus
Forma correta: Derivado de um vírus / devido a um vírus
A palavra derivado é acompanhada da preposição de (tal como o verbo derivar); a palavra devido é acompanhada da preposição a (tal como o verbo dever-se).
ERRO 11: Orgão
Forma correta: órgão
Esta palavra leva acento agudo sobre a vogal «o». As palavras graves terminadas em «ão», como sótão, órfão, bênção, são sempre escritas com acento gráfico, porque o seu acento tónico recai na penúltima sílaba.
Importa referir que o til não é um acento gráfico, mas sim uma marca de nasalidade, indicando vogais nasais (ex. lã) ou ditongos nasais (ex. coração). Muitas vezes, este ditongo coincide com a sílaba tónica (como é o caso de paixão), porém, nalguns casos, pode não coincidir com o acento tónico, de que orégãos é exemplo.
ERRO 12: Rúbrica
Forma correta: Rubrica
A palavra rubrica tem o seu acento tónico na penúltima sílaba (bri) e escreve-se sem qualquer acento gráfico, seja qual for o seu significado: “assunto, apontamento, matéria”, “programa radiofónico ou televisivo” ou “assinatura abreviada”.
Tendo a sua origem no latim rubrica, estava relacionada com o adjetivo rubrus (vermelho) e designava a terra ou argila vermelha que se usava para escrever os títulos dos livros antigos e dos manuscritos medievais.
Deve, assim, usar-se a palavra grave rubrica para todas as aceções.
ERRO 13: Saiem
Forma correta: Saem
A forma verbal saem corresponde à 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo do verbo sair e grafa-se sem qualquer «i» entre a vogal «a» e a vogal «e». A inserção da vogal «i» ocorre na oralidade (e com implicação na escrita) com o objetivo de estabelecer a ligação entre as duas vogais em hiato (encontro de duas vogais que não formam ditongo).
ERR0 14: Mau-estar
Forma correta: Mal-estar
A palavra composta mal-estar é formada pelo advérbio mal e pelo nome estar. O seu antónimo é bem-estar.
ERRO 15: Previlégio
Forma correta: Privilégio
A palavra privilégio escreve-se com «i» na primeira sílaba, pois provém do latim privilegiu. Essa vogal é frequentemente articulada como [e] devido a um processo fonológico designado dissimilação: um determinado som perde propriedades fonéticas que tem em comum com um som vizinho, diferenciando-se dele.
ERRO 16: Alcoolémia
Forma correta: Alcoolemia
A palavra alcoolemia pronuncia-se com «e» fechado e escreve-se sem qualquer acento gráfico. Na sua formação entra o elemento -emia, que é um radical de origem grega que
exprime a ideia de sangue. Este elemento entra na composição de várias palavras, como anemia, leucemia, glicemia, toxicemia. Trata-se de palavras graves, cuja sílaba tónica é a penúltima (mi), pelo que não devem ser escritas com qualquer acento gráfico.
ERRO 17: Ciclo vicioso
Forma correta: Círculo vicioso
O adjetivo vicioso está relacionado com o nome vício e entra na combinatória «círculo vicioso». Esta expressão designa uma sequência de acontecimentos ou situações que se repetem sucessivamente e se reiniciam, havendo um impasse na sua resolução.
ERRO 18: Despoletar
Forma correta: Espoletar / Desencadear
O verbo despoletar é derivado por prefixação a partir do verbo espoletar. Provêm ambos da terminologia militar e passaram a fazer parte da linguagem corrente. O verbo espoletar, que significa originalmente “pôr a espoleta em, fazer deflagrar a granada”, passou a significar também “desencadear uma ação”. O verbo despoletar, por sua vez, tem o significado de ação contrária de espoletar (“tirar a espoleta a, travando ou impedindo o disparo de”) e passou, por força do uso linguístico, a substituir o verbo espoletar, veiculando o significado desse verbo: “deflagrar, desencadear uma ação, fazer surgir repentinamente”, com base no valor de reforço do prefixo des- (presente em palavras como desinquieto, destrocar, desandar).
Ainda que tenha assumido esse significado, desaconselha-se o seu uso como sinónimo de desencadear em registo formal.
O que podemos fazer para eliminar de vez estes e outros erros que mancham a nossa imagem? Devemos ler muito (e bem!) para que sejamos expostos à palavra bem escrita. Tal como a leitura, a consulta de dicionários é também uma prática que deve ser regular no nosso dia a dia, sempre que tivermos alguma dúvida na grafia e significado de uma palavra.
Assim, se pretendemos projetar uma imagem pessoal e profissional credível, a nossa comunicação deve ser clara, relevante e, sobretudo, deve ter um elevado padrão de excelência linguística.