Publicado no Journal of Applied Physiology, um novo estudo vem defender que o gelo não só não ajuda no tratamento das dores e lesões musculares, como pode ainda atrasar na cura.
Quando se aplica gelo, os músculos ficam dormentes, aliviando momentaneamente a dor. O inchaço e a inflamação ficam controlados, o que leva as pessoas a pensar que está a ajudar na recuperação. No entanto, vários são os estudos que têm vindo a descredibilizar esta prática. Agora, a Universidade de Kobe, no Japão, em parceria com outros institutos, conseguiu verificar, a um nível microscópico, como o frio afeta as lesões e o que acontece realmente no tecido muscular. Para a investigação foram usados 40 ratos adultos e saudáveis, aos quais foram aplicados estímulos elétricos para contrair repetidamente os músculos da zona inferior das patas traseiras, criando uma sensação de exaustão e um esforço muscular semelhante ao de um treino intenso. Com a insistência neste estímulo, os cientistas começaram a danificar os músculos dos roedores, para conseguirem observar o processo de recuperação, recolhendo amostras do tecido muscular imediatamente após a aplicação dos estímulos elétricos.
Depois, em metade dos ratos foram usadas pequenas compressas de gelo, enquanto os restantes foram deixados a recuperar sem qualquer intervenção. Os cientistas continuaram a recolher amostras de ambos os grupos, durante dois meses, primeiro com intervalos de algumas horas, e, mais tarde, de dias.
Ao observar as amostras do tecido muscular ao microscópio, os cientistas conseguiram observar várias lesões nas fibras musculares (células que constituem os músculos). No tecido muscular dos ratos que não tinham recebido o tratamento com gelo foi possível observar uma mais rápida atuação das células do sistema imunitário, ou seja, quando não era usado gelo o processo de recuperação desse tecido começava de imediato. Em duas semanas, os músculos destes ratos estavam completamente recuperados e prontos para mais “exercício”. Já no que diz respeito aos ratos que tiveram um tratamento com gelo, podemos ver que o seu processo de recuperação foi atrasado. Só ao fim de sete dias é que a recuperação muscular se demonstrou idêntica ao que os outros já apresentavam no terceiro dia. Passadas as mesmas duas semanas, os músculos tratados com gelo ainda não estavam completamente recuperados.
A conclusão que se pode retirar é que o gelo atrasa a recuperação, isto é, a resposta das células do sistema imunitário é mais demorada. No entanto, é importante notar que este estudo simula lesões musculares graves, como uma distensão ou uma rutura, e não apenas dor e fadiga. Para além disso, o estudo foi realizado apenas em ratos, apesar de os nossos músculos partilharem uma composição semelhante ao destes roedores. No futuro, os cientistas planeiam estudar quais as consequências deste tratamento em lesões menos graves e, claro, observar o seu impacto nos seres humanos.
Podemos ainda ver outros estudos que já tinham provado que o tratamento com gelo não é aconselhado. Destes, destaca-ser um artigo de 2011, que analisou se a utilização de gelo era eficaz no tratamento de lesões nos gémeos. Este concluiu que as pessoas que usaram gelo, sentiram tantas dores, apesar de aparecerem mais tarde, como as pessoas que não usaram, e que sentiam as dores no momento. Um ensaio que lhe seguiu, um ano depois, em 2012, determinou que os atletas que “congelavam” os músculos, isto é, tomavam banhos de gelo, demoravam mais tempo a recuperar a força muscular do que quem não o fazia. Por fim, um outro estudo a ressaltar, de 2015, chegou à conclusão que os homens que aplicavam regularmente compressas de gelo depois de um treino desenvolviam menos força, crescimento e resistência muscular, do que os que não o faziam.