Uma equipa de 29 peritos de todos os continentes, liderada por Maria João Feio, do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) de Coimbra, concluiu que a qualidade ecológica dos rios no mundo é fraca.
O estudo, que abrangeu 88 países, revela “fraca qualidade ecológica dos rios em todo o mundo e a sua elevada perda de biodiversidade”, afirma a Universidade de Coimbra (UC), numa nota hoje divulgada.
“Cerca de metade dos troços ou rios analisados encontra-se abaixo do nível aceitável na Europa e nos Estados Unidos, um terço na Austrália e um quarto na Coreia do Sul”, sublinha a UC.
Uma das consequências da fraca qualidade ecológica dos rios “é uma perda muito elevada de biodiversidade. Por exemplo, na Nova Zelândia 70% das espécies de peixes de água doce estão em perigo, enquanto no Japão 40% estão ameaçadas”, assinala Maria João Feio.
“Noutros países, a monitorização físico-química mostra um grau de poluição muito elevado que põe em risco a saúde humana”, acrescenta a investigadora do MARE da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC (FCTUC), no artigo científico publicado na revista Water, intitulado “The Biological Assessment and Rehabilitation of the World’s Rivers: An Overview”.
Os cientistas avaliaram também o estado de implementação da biomonitorização dos rios, ou seja, a avaliação dos rios com base nas comunidades aquáticas — peixes, invertebrados bentónicos, algas ou outras plantas, por exemplo — e as medidas que estão a ser tomadas para os recuperar.
“Na maioria dos países do mundo, a monitorização biológica dos rios de forma regular não está a ser feita”, concluíram.
“Numa grande parte dos países existe, no máximo, uma análise físico-química da água, o que é insuficiente para traduzir a degradação destes sistemas resultantes das ações humanas (tais como a articialização das margens, corte de vegetação, presença de espécies não nativas e espécies invasoras, açudes e barragens que alteram a circulação da água, sedimentos e espécies ao longo das bacias hidrográficas)”, expõe Maria João Feio.
Em relação à implementação de medidas de reabilitação dos rios, o panorama também não é animador.
“Apesar de existirem bons exemplos, tanto na Europa (principalmente no norte) como nos Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul”, os autores do estudo concluíram que “a este nível muito pouco tem sido feito a nível global”.
“Se recuperados, os rios podem fornecer serviços muito importantes às pessoas, desde o fornecimento de água e alimento, e contribuir para a melhoria da qualidade do ar, do solo, a mitigação de extremos climáticos e ainda proporcionar zonas de lazer essenciais ao bem-estar humano”, comenta, citada pela UC, a investigadora da FCTUC.
No que respeita aos rios portugueses, Maria João Feio diz que se segue o padrão europeu, “com cerca de metade das massas de água analisadas em bom estado ecológico. E temos situações muito críticas ao nível dos grandes rios que estão muito alterados por barragens”, sublinha.
“Em todo o país, existem ainda casos de poluição pontual e difusa e também fortes alterações na vegetação ribeirinha, que é essencial tanto para o funcionamento do ecossistema aquático como para melhorar a qualidade do ar e do solo e filtrar as águas de escorrência que vão ter aos rios”, adverte.
Tendo em vista a melhoria da qualidade dos rios, a equipa internacional de peritos produziu ainda um conjunto de recomendações, destacando-se, por exemplo, “a necessidade de definição de objetivos ecológicos realistas e claros para os planos de reabilitação/restauro; a obrigatoriedade de fazer planos de reabilitação/restauro ecológico com base em dados recolhidos, ‘a priori’, em programas de monitorização e fazer o acompanhamento desses planos também com monitorização ecológica”.
Os especialistas defendem ainda a necessidade da criação de equipas interdisciplinares na elaboração dos referidos planos — cientistas conhecedores dos ecossistemas, engenheiros e ainda cientistas sociais –, de modo a “permitir envolver todos os tipos de utilizadores da água (população, indústria, decisores) num objetivo comum”.
É ainda essencial, sustentam, “existir financiamento adequado e que a recuperação dos rios seja colocada nas prioridades políticas nacionais e internacionais”.
JEF // SSS