Os primeiros tempos em Jacarta foram exigentes. Ana Gomes passava os dias em contactos com as autoridades indonésias e com a resistência timorense. À noite, durante horas a fio, a embaixadora produzia os reports para Lisboa, em que descrevia o ambiente político que se vivia entre Timor-Leste e a Indonésia, relatava as conversas que tinha mantido com as diferentes fontes, tentava antecipar soluções para concretizar o processo de independência timorense, ao mesmo tempo que geria a diferença horária entre Lisboa e a capital indonésia nos contactos telefónicos com o governo português. “Durante semanas, dormiu três ou quatro horas por noite”, recorda um antigo colega diplomata. “Queixava-se de que a missão era esgotante, sim, mas tinha um drive louco por aquela questão, percebia o que estava em jogo, o papel que podia ter, e assumiu o cargo com garra.” Não houve outra causa como Timor naquelas duas décadas de carreira diplomática.
Passaram mais de 20 anos. Hoje, com a diplomacia arrumada e depois de uma longa passagem pelo Parlamento Europeu, o nome de Ana Gomes ganha peso para uma candidatura à Presidência da República. Depois de recusar em absoluto essa hipótese, recuou. Está a “refletir”, mas, num aspeto, pouco mudou: está sempre ligada à ficha. É comum vê-la publicar tweets até depois das duas da manhã e perceber que, a partir das sete, os seus mais de 80 mil seguidores já estão a ser bombardeados com notícias de jornais, interpelações diretas aos principais governantes europeus, recomendações – até comentários de outros utilizadores que lhe dirigem críticas diretas são partilhados pela ex-eurodeputada. “Trabalhadora”, “incansável”, uma ativista política que não abdica de lutar pelas suas causas. Alguém “sem medo”, “bem preparada”, “inteligente”. Estas opiniões cristalizaram-se, são unânimes entre amigos de longa data, antigos colegas e até adversários políticos. Menos consensuais são as armas que ela escolhe para travar os seus combates.
“É uma pessoa indiscutivelmente combativa, com uma abordagem temática quase obsessivamente ligada à corrupção, mas com um defeito”, ressalva o eurodeputado do CDS, Nuno Melo. “Afirma certezas absolutas que podem enlamear a honra de pessoas a quem ela não deu a possibilidade de contraditório”, resume o antigo adversário no Parlamento Europeu, com quem Ana Gomes travou debates intensos. E, ainda que lhe aprecie o “impulso” justiceiro, Nuno Melo considera que, “muitas vezes”, Ana Gomes “foi para lá do que devia ir”.
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