Os sindicatos já tinham avançado o cenário (“Dificilmente haverá aulas no 3º período”, vaticinou Mário Nogueira, líder da Fenprof); o Governo assumiu-o esta terça-feira no Parlamento (“Muito provavelmente, as escolas vão permanecer fechadas”, assumiu António Costa). Os diretores, sem querem fazer previsões, também já tinham dado indicação de que “não viria mal ao mundo se até os exames fossem adiados para setembro” (Filinto Lima, Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas.) Já os pais têm mais resistência a que se desista antes de entrar em campo (“O importante era tentar levar o ano letivo até ao fim o melhor possível. Pelo menos tentámos”, insiste Jorge Ascensão, da Confap).
A pergunta que se põe, no cenário de um pico da epidemia previsto para o início do 3º período, é se faz sentido mudar a forma de ensinar e avaliar de um momento para o outro – ou seria melhor acabar por ora e retomar depois do verão. E quem a fez há já alguns dias foi Alberto Veronesi, do blogue VozProf.
“O segundo período, se quisermos ser honestos connosco e com os alunos, terminou na sexta-feira 13, o terceiro período é quase certo será eliminado do calendário e o ano letivo, se tudo correr bem, terá o seu início em setembro! Não vamos colocar os alunos em frente ao computador 8 horas por dia! Não!”, lê-se naquela publicação. E Veronesi chama ainda a atenção para outra questão: “Não é TPC que os alunos precisam, não é de trabalhos imensos, é de serenidade! Todos nós precisamos serenidade. Não estamos numa situação normal de e-learning, de tele-escola ou seja lá o que for!” E não, não é o único a pensar assim e que esta pode ser uma oportunidade de ensinar outras coisas.
Alexandre Henriques, blogue ComRegras
“Estamos em águas nunca antes navegadas. Parece-me pacífico que não haverá aulas presenciais. Será que é possível seguir este caminho, quando é claro que não será possível chegar a todos, da mesma forma? Não vejo que faça sentido avançar com matéria nova, eventualmente talvez se pudesse apostar numa consolidação da matéria dada. Mas com tantas discrepâncias – falta de interação, alunos sem computadores, além de possíveis situações de familiares desempregados ou doentes – não será nunca benéfico prosseguir como se estivéssemos numa situação normal.”
Jorge Rio Cardoso, autor da série Bora lá ser bom aluno!
“Tem sido um exagero de TPC. Faz lembrar o Titanic: o barco a afundar e a banda continuava a tocar. O faz sentido agora é treinar questões de outra ordem. Das emoções, por exemplo, as soft skills, tão elogiadas pelas teorias mais recentes da educação e tão desvalorizadas por cá. Lembra-me o momento escolar no pós-25 de abril, em que não havia aulas e as pessoas diziam que era tudo uma grande balda. Mas foram tempos em que muitos desenvolveram grandes competências, do trabalho em equipa a falar em público.
Julgo que, a haver matéria dada, terá de ter a ver com a realidade – da importância do isolamento em que vivemos à forma como se previne a doença. Se quisermos isto pode ser uma espécie de laboratório a céu aberto, porque a tecnologia continua a mostrar-nos o mundo. Não podemos pensar que uns vão sempre passar e outros não, o insucesso tem de começar a ser visto como uma questão de todos. Porque o que não consegue emprego pode sempre cair na marginalidade e isso, mais cedo ou mais tarde, vira-se contra todos nós. É cada vez mais importante trabalhar essas questões na escola do que saber os reis de Portugal, cujos nomes estão à distância de um clique.”
Emília Brederode Santos, presidente do Conselho Nacional de Educação
“Estamos de facto a viver uma situação não preparada, não testada, mas por ora vejo isto como uma oportunidade. Seja o que for que aí venha, penso que os mais novos têm toda a vantagem em ter a vida organizada – e a escola, mesmo virtual – pode dar uma grande ajuda. Temos também de compreender que os próprios professores estão a aprender como fazer e julgo que bem. Será, claro, preciso afinar detalhes: pensar por exemplo se estamos a chegar às crianças que têm menos apoio dos pais e estão mais sozinhas neste processo. Mas será sempre possível falar-lhes de responsabilidade individual, de cidadania, da importância da empatia.
Nas ciências, pode-se sempre aproveitar para falar da evolução das doenças – e de como as vacinas e os hábitos de higiene nos livraram de situações mais difíceis. Tudo isto também pode ser visto numa perspetiva histórica. No meu entender, será de grande valor tirar aprendizagens deste momento único que estamos a viver – nenhum de nós tem memória de algo parecido, a última grande pandemia com um efeito parecido a este tem cem anos. Até no Português, há certamente oportunidades de o fazer. Lembro, por exemplo, a coleção Uma Aventura. Num dos livros em que se temia que houvesse uma peste qualquer, acabou por se descobrir que lavando as mãos com água e vinagre se ficava protegido. Foi aí que aprendi.”