À primeira vista, parecem uma espécie de astronautas da saúde. Touca, máscara, luvas, bata, galochas, nada pode falhar para evitar o contágio da cólera. São sobretudo locais, a quem foi dada formação específica, que trabalham no Centro de Tratamento de Cólera da responsabilidade da Médicos Sem Fonteiras (MSF), instalado no bairro de Macurungo, no subúrbio da cidade da Beira.
Esta unidade especializada foi inicialmente pensada para receber cerca de uma centena de pacientes, mas logo nas primeiras 12 horas de atividade foram internadas 58 pessoas. Curiosamente, foi a Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) a enviar os primeiros casos suspeitos de cólera para este centro, instalado a escassos metros do Posto Médico Avançado gerido pela equipa da CVP.
Habitualmente, estão concentradas várias pessoas à porta desta unidade. Muitas são familiares dos pacientes internados. Uma delas é Ana António, 39 anos. A filha, Tuxa Xavier, de 29 anos, veio direta de Nhamatanda, a 110 quilómetros de Macurungo, porque tinha diarreia e vómitos. Ana António está do lado de fora a tentar espreitar para dentro das tendas de internamento. Anima-se quando consegue ver a filha sentada. “Estou muito preocupada, mas consigo perceber que já está melhor. Ela teve bebé há dois meses e tem outro filho com 12 anos”, diz, parecendo justificar a angústia.
Uma sondagem rápida permite perceber que muitos daqueles que estão aglomerados à porta do centro não estão em busca de notícias dos familiares. Estão, sim, à procura de trabalho. A MSF contrata habitualmente locais para muitas das tarefas de organização do centro e estão ali várias dezenas em busca de uma oportunidade.
A cólera transmite-se através de fezes contaminadas que podem, por exemplo, infetar a água consumida pela população devido à falta de saneamento básico, agravada pela destruição provocada pelo ciclone Idai. Também os alimentos contaminados podem ser uma fonte de contágio.
Um dos cuidados especiais nos centros de tratamento é o isolamento dos dejetos dos pacientes em bidões com lixívia.
O coordenador de emergência da MSF responsável pelo centro de Macurungo, o italiano Pierluigi Testa, está especialmente preocupado com a eficácia da triagem. “É fundamental fazer uma boa avaliação para garantir um diagnóstico rigoroso, evitando expor desnecessariamente à doença pessoas não contaminadas”.
O tratamento da cólera é igual ao de outras diarreias agudas, implica uma forte hidratação e, por vezes, o recurso a antibióticos. Todos os casos de diarreia têm estado a ser tratados como casos de cólera. Uma das franjas da população que levanta mais preocupação é a dos portadores de HIV, já que a imunodepressão dificulta a recuperação.
A Organização Mundial da Saúde fez chegar 900 mil vacinas contra a cólera ao centro do país, que começaram a ser administradas na quarta-feira. Atualmente, existem 11 centros de tratamento de cólera na região afetada pela tempestade.
Na quinta-feira, dia 4, registaram-se 353 novos casos de cólera. No total, foram diagnosticadas 2094 pessoas com a doença que, até agora, causou duas mortes.
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