Sentado num banco, com os braços apoiados no balcão e as mãos a taparem-lhe a cara, Manuel Ferreira é a expressão do desalento dos comerciantes da Praça do Chile, em Lisboa.
Depois de 19 meses de obras da estação de metro de Arroios – alargamento do cais para poderem circular seis carruagens – não sabe quantos mais ainda vai ter de esperar para conseguir vender os frangos assados que saíam como pãezinhos quentes para os clientes que vinham do metro.
A estação, encerrada desde o verão de 2017, deveria estar pronta em março, mas problemas financeiros da empresa Opway levaram a que o Metropolitano de Lisboa tomasse posse administrativa da obra, em janeiro. O próximo passo é lançar novo concurso público e recomeçar – apenas 20% da empreitada foi feita, segundo foi dito numa reunião de câmara aos lojistas. A nova data, aponta-se, é final de 2020 ou início de 2021.
A loja de frangos assados está ali há mais de 40 anos fruto do empenho de Idália Ferreira, a mulher de Manuel, e da sócia. “As vendas caíram mais de 50%”, diz. Naquele recanto da Praça, o acesso ao metro é o “pão” dos lojistas. Eram 4. Agora são três, mas um é recente.
Uma perfumaria com 20 anos de existência não resistiu à falta de fregueses e agora está lá uma barbearia. “A minha prima ainda aguentou até outubro ou novembro na esperança de que a estação reabrisse agora em março, quando soube que as obras estavam paradas teve de fechar a perfumaria”, conta Fernando Correia, dono do Ribeirão Preto, um snack-bar na mesma rua com variadíssimos tipos de sandes na montra – desde os torresmos, ao leitão ou à omelete.
Se as roupas para criança também foram para outras paragens e o que se vê são as grades fechadas da antiga Blue-Kids, o Ribeirão Preto, mesmo ao lado, continua a laborar. Fernando Correia diz que teve uma “quebra” nas vendas, “o cliente de passagem que entra para comer um pastel de bacalhau ou uma sandes” já não passa aqui.
O que o “assusta é o que ainda está para vir” porque não sabe durante quanto tempo ainda vai ter tapumes à sua porta. A incerteza deixa-o apreensivo. “O que é que isto vai ser quando o metro abrir?” Fernando teme que o que sucedeu no Areeiro – o alargamento da estação começou em 2008 e as saídas do átrio norte da estação ainda estão por concluir – se passe em Arroios. “Aquilo ficou sem vida”, resume.
Nenhum dos comerciantes diz estar contra as obras. Estão, sim, contra os tapumes que lhes puseram em frente às lojas e que não deixam ver que estão abertas. “Estamos emparedados”, nota Manuel Ferreira. “As pessoas passam de carro e pensam que aqui já não há nada, está tudo fechado.”
Mesmo os painéis de lona postos em frente à estrada com o nome dos estabelecimentos parecem ser parcos. “Pensam que são lojas que vão abrir lá em baixo, no metro”, diz o comerciante.
Do outro lado da Praça do Chile, a zona poente onde também está fechada uma saída do metro e os tapumes metálicos “acolhem” o estaleiro das obras, o cenário é idêntico.
A tabacaria Órbita pôs um papel manuscrito na porta que diz “Encerrado para férias”. Mas estas férias começaram em junho e ainda não acabaram. Os outros lojistas dizem que já não voltam, fecharam.
Mesmo as clientes habituais, “com 15 anos de compras aqui”, lhe telefonam depois de passarem de carro por ali porque pensam que já encerrou a loja. “Nunca estive contra as obras, mas não houve cuidado nenhum com os lojistas. A localização é o sucesso de uma empresa”, acredita.
Nesta altura, os empresários da zona querem saber o que vai acontecer. Ou seja, quanto tempo vai demorar o concurso público para a nova empreitada.
Margarida Martins, presidente da Junta de Freguesia de Arroios, deu conta disso mesmo na quarta-feira manhã, durante uma volta pela zona para saber as preocupações de todos. “Vou pedir uma reunião com carácter urgente à administração do Metropolitano de Lisboa que conte com a presença do vereador [da mobilidade] Miguel Gaspar e dos comerciantes”, diz. A intenção é saber como vai ser daqui para a frente. “São comerciantes há muitos anos e é com desagrado que os vemos partir.”
José Cardoso está firme atrás do balcão da Parreirinha do Chile. Há “meio século” a vender bifanas e sandes diversas só lamenta que “os nossos governantes tenham entregue a obra a uma empresa falida”, conta, desenvolto enquanto serve uma carcaça com uma omelete e salsichas. Aqui os “clientes são fiéis” conta um deles depois de terminar a sua sandes acompanhada por um refrigerante.
As frigideiras acesas postas na montra lateral dão conta disso mesmo. Se tivessem menos clientela não estariam, talvez, tão cheias de carne de porco. “Felizmente está a correr bem”, resume, lacónico, não sei antes olhar para a montra depois do toque no vidro de mais um cliente habitual que aponta o dedo para as febras e levanta dois dedos. Saem duas bifanas.