Desde há umas semanas que quem vai ao Lagoas Park, na zona de Oeiras, à 5ª feira, encontra por lá um banca de verduras com ar apetecível. E pode regressar a casa com um saco cheio de víveres, sem ter de ir ao supermercado. Se fizer perguntas – ou ler os cartazes que estão mesmo ao lado da banca – vai saber que os produtos hortícolas foram apanhados na véspera, numa exploração que fica a um quilómetro daquela venda. E, apesar do preço ser simpático, encherá o frigorífico e a despensa de valor social.
É que, por trás desses produtos encontra-se a Semear na Terra, uma ideia que deriva da BIPP, uma instituição de solidariedade social que se destina a desenvolver projetos que integrem na sociedade cidadãos com deficiência. Joana Santiago, mãe de um jovem com necessidades especiais, explica que tudo começou em 2014, quando criaram a Academia Semear. Nela dá-se formação certificada nas áreas de comércio, agricultura e indústria a adultos com dificuldades intelectuais, vindas muitas vezes dos centros de empregos, onde estão inscritos apenas para receber o Rendimento Social de Inserção.
Dois anos depois de terem começado as formações, estabeleceram uma parceria com o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária para terem acesso a um terreno de 12 hectares, em troca de manterem verde toda a área da estação agronómica de Oeiras – qualquer coisa como 120 hectares.
O que sai da terra é escoado nas grandes superfícies (Pingo Doce, por exemplo) e agora nesta banca do Lagoas Park, um projeto-piloto que servirá de termómetro de avaliação à forma como a população reage a estes produtos de valor acrescentado. “Com a venda direta aumentamos a receita, claro, mas também comunicamos para que a sociedade valorize e capacite estas pessoas, mudando consciências”, diz Joana Santiago.
Em Portugal, a taxa de desemprego da população com deficiência ronda os 70%. Neste projeto Semear, em três anos, ela já anda nos 55 por cento. Trocando percentagens por números, dos 36 alunos que formaram, 20 estão a trabalhar – na exploração agrícola, mas também em empresas do setor.
Além desta venda direta, a Semear na Terra também compõe sete tipo de cabazes diferentes (de €13,9 a €98,2), com produtos transformados pelos colaboradores (com base nos desperdícios de outros produtores) ou arranjados em fornecedores (como os queijos, vinhos e chocolates). Ao comprar o cabaz mais caro, por exemplo, avisam-nos que estamos “a contribuir para o acompanhamento técnico especializado a um jovem com dificuldade intelectual durante uma semana.” E a presidente da instituição aproveita para lançar um aviso: “Queremos que as pessoas comprem pela qualidade da produção e não por caridade. Mas também é importante que tenham consciência do valor social do que levam para casa.” Lá está, encher o frigorífico e a despensa de algo novo.