Os 17 protocolos de cuidados integrados (reabilitação psicossocial) previstos no Plano de Saúde Mental não respondem às necessidades das cerca de 4600 pessoas institucionalizadas. Quem o afirma é Filipa Palha, 40 anos e presidente da ENCONTRAR+SE (Associação de Apoio às Pessoas com Perturbação Mental Grave).
A psicóloga clínica e docente da universidade Católica, no Porto, teme que Portugal incorra nos erros cometidos noutros países, onde se encerraram unidades psiquiátricas sem uma retaguarda à altura.
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O cenário, desolador, foi apresentado no Dia da Saúde Mental, na Fundação Serralves, durante o lançamento da tradução portuguesa da obra Loucura – A busca de um pai no insano sistema de saúde (Encontrar+se, 337 pág., €16,80), pelo jornalista americano Pete Earley, cujo filho tem perturbação bipolar. O autor demonstrou como ainda se está longe de ver garantidos os direitos das pessoas com doença mental, ao arrepio dos princípios aprovados há nove anos pelas Nações Unidas.
Filipa Palha, em discurso direto à VISÃO
O que é tão grave ou arriscado nesta reforma (residências e apoio domiciliário)?
Estamos a falar de locais para treino de autonomia (6 a 8 lugares), de saúde mental (7 lugares), de apoio moderado (12 a 16 lugares) e de apoio máximo (18 a 32 lugares). Por um lado, a recolocação de pessoas – para quem o hospital psiquiátrico sempre foi a sua casa e família – nestas estruturas, sem os técnicos necessários, pode ser cruel e desestruturante. Por outro, corre-se o risco de ver aumentado o número de pessoas sem assistência.
Porque não se pode levar as medidas anunciadas a sério?
O relatório da Comissão de Re-estruturação dos Serviços dos Serviços de Saúde Mental, previa, em 2008, um orçamento nacional para esta área, adiantando que sem ele seria difícil promover mudanças no atual sistema. Segundo o documento, apenas uma pequena parte das pessoas com estes problemas tem acesso a serviços públicos especializados, que não asseguram o essencial (sobretudo na reabilitação e reintegração); admite-se ainda que os recursos humanos (psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais, etc) são escassos e aqui não se prenuncia nada de bom, com o debate sobre os cortes orçamentais para o próximo ano.
Como seria a desinstitucionalização ideal, neste panorama (politico e económico)?
A rede hospitalar que temos pode ser reabilitada e não, simplesmente, encerrada. Há instituições de solidariedade social orientadas para a reabilitação, às quais se deveria dar recursos em vez de retirá-los. O critério de recolocação das pessoas internadas deve atender a uma análise caso a caso.
À beira da loucura – Alguns factos
* Fim do internamento de utentes com perturbações mentais até 2016.
* Redução da comparticipação de medicamentos (a partir deste mês).
* Prevalência de 6,3% de doenças psiquiátricas graves (!).
* Um terço das perturbações mentais graves não teve qualquer tratamento (!)
(!) Estudo Epidemiológico Nacional, apresentado em Março 2010 (dados preliminares).