“A inocência da história (de que terá tido uma queda acidental) contrastava com a gravidade e com os sinais evidentes de agressão. Tinha hemorragias várias e estava em coma”, disse Maria Deolinda Barata, pediatra e directora da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital D. Estefânia, durante uma sessão do julgamento da ama da criança, que decorre no tribunal de Torres Vedras.
“Estas agressões (que também causaram a perda da visão direita) foram responsáveis pelas sequelas que apresentava (e apresenta). Resultaram deste episódio e de antigos”, sublinhou a médica quando questionada pelos juízes que estão a julgar a ama da criança.
A médica estava de serviço no dia 9 de Março de 2002 quando a unidade de cuidados intensivos do D. Estefânia recebeu a criança transferida do Centro Hospitalar de Torres Vedras.
A ama da criança é acusada dos crimes de maus-tratos, ofensa à integridade física qualificada e abandono, praticados sobre o bebé.
Segundo o depoimento da médica, além das lesões que a levaram naquele dia ao hospital, a criança tinha sinais de ter sido “abanada” e “lesões mais antigas como uma fractura antiga da tíbia esquerda”.
A pediatra lembrou ainda que durante o período de internamento (17 dias nos cuidados intensivos e três meses no hospital), a criança começou a ter convulsões e teve dificuldades respiratórias, tendo por isso de estar ventilada durante uma semana.
Com este quadro, concluiu a pediatra, “ia ficar inexoravelmente marcada com sequelas para a vida. Sequelas neurológicas bastante graves, motoras, cognitivas e sensoriais. Um atraso global significativo”.
A médica disse ainda que a criança nasceu numa família desorganizada, fruto de uma gravidez não desejada, tendo sido entregue à avó materna e depois, quando esta adoeceu, ficou a cargo de uma ama.
De acordo com a acusação do Ministério Público, em Março de 2002, a arguida, agora com 40 anos de idade, reagiu ao choro e à recusa do bebé em comer, dando-lhe “bofetadas de forma violenta”.
A ama tê-lo-á ainda “abanado” e atirado para o chão “de forma violenta”, fazendo com que batesse com a cabeça no chão.
Na sessão desta terça-feira do julgamento decorreram também as alegações finais tendo a procuradora do Ministério Público afirmado que não tem dúvidas de que “as lesões ocorreram durante o tempo em que a criança esteve a cargo da ama”.
A procuradora disse ainda que o menor “nunca irá ter uma vida por inteiro”, pedindo “uma punição exemplar”.
Já o advogado de defesa da ama argumentou que “ninguém assistiu aos maus-tratos”, referindo que a criança tinha um historial de “negligência e de abandono” familiar.
O Ministério Público, em representação do menor, pede uma indemnização de 370 mil euros por danos patrimoniais e 70 mil euros por danos não patrimoniais.
Os hospitais de D. Estefânia e de Torres Vedras pedem uma indemnização de 3.300 euros e 1.374,64 euros, respectivamente.
A leitura do acórdão está prevista para dia 17 de Abril às 14:00.