Apesar de o PS e o Livre “partilharem várias causas”, ao ponto de já terem corrido coligados em Lisboa – entre elas, nas últimas autárquicas -, António Costa deixou claro, este domingo, na RTP1, que o PS não quer estar a fazer contas de somar na noite de 30 de janeiro, tal como aconteceu em 2015 e 2019.
Para o secretário-geral socialista, que fez questão de salientar a diferença entre o PS e a “família política” de Marcelo Rebelo de Sousa, só há dois caminhos: virar a página e “prosseguir [com o PS], com uma maioria de progresso, ou uma pagina retrocesso, com o regresso da austeridade”, com um Rui Rio avesso a aumentos de salários. “Um Governo de Rui Rio será um Governo que nem o Salário Mínimo aumenta, quanto mais um salário médio”, argumentou, respondendo ao repto lançado por Rui Tavares – “o voto num Livre não nos livra da Direita”.
No arranque de mais de 15 dias de debates televisivos, Rui Tavares ainda tentou sensibilizar Costa que “um partido a governar sozinho não conseguira” aplicar um pacote de reformas progressistas de esquerda que o País precisará. “Podemos muito melhor do que discutir Bloco Central ou maioria absoluta ou uma uma Gerigonça que não se escangalhou sozinha”, disse, desafiando o líder do PS para “fazer um pacto para uma maioria”. Porém, dada a nega por Costa, o fundador do Livre passou ao contra-ataque e disse que Costa foi o principal autor do fim da Gerigonça, ao não criar condições para novos acordos com o PCP e BE, em outubro de 2019.
Veja as frases que marcaram o debate:
Pacto PS /Livre
ANTÓNIO COSTA
“O Livre é um partido com várias causas que partilhamos. Mas, verdadeiramente nestas eleições, do dia 30, a escolha que temos de fazer é se a página que viramos é para prosseguir com uma maioria de progresso, ou uma pagina de retrocesso, com o regresso da austeridade”.
RUI TAVARES
“O Livre é da família dos Verdes que em toda a Europa ajuda a política a funcionar. Nós somos da política do bota-acima e não do bota-baixo”.
Contexto: Costa fez questão de se distanciar de um discurso que foi bandeira do Livre nas legislativas de 2019 e com que agora Rui Tavares volta a acenar: de que o PS deve apresentar-se aos eleitores com vontade de replicar uma nova Gerigonça ou solução à esquerda, que inclua o Livre – como as coligações por Lisboa.
Maiorias
RUI TAVARES
“Um partido a governar sozinho não conseguirá dar respostas que o País precisa, como sair de uma política de salários baixos e deixarmos de ser a cauda da Europa para passar a ser a cabeça da Europa”.
“Desafio para António Costa: podemos muito melhor, do que discutir o Bloco Central ou a maioria absoluta ou uma gerigonça que não se escangalhou sozinha – foi escangalhada há dois anos. Disse-lhe [a António Costa] que sem um acordo politico eleitoral provavelmente não passaria muito depois da presidência portuguesa da União Europeia. Podemos fazer um pacto por uma maioria social, progressista e ecológica”.
“Um dos perigos destes apelos à maioria absoluta é de nos podermos confrontar daqui a poucos meses com um centrão, com ou sem António Costa”.
“O boletim não tem asteriscos nem letra miudinha. É preciso perceber para que serve cada voto e que mensagem é que envia”.
ANTÓNIO COSTA
“O País precisa de estabilidade. […] A forma mais segura de ter estabilidade é os portugueses darem-nos uma maioria. Uma maioria não significa governar sozinho, como fui na Câmara de Lisboa – não fui nem mais nem menos dialogante se tive maioria ou não tive maioria”.
“Agora, digo aos portugueses: a única forma de termos uma maioria estável em Portugal, uma maioria progressista, que não dependa nem dos liberais (IL), nem da extrema-direita (Chega) é com uma maioria do PS”.
“Uma formula segura de termos estabilidade é termos uma maioria, todas as outras soluções revelam-se precárias”.
“Se o PS perder as eleições eu saio de secretário-geral do PS, porque ao fim de seis anos de primeiro-ministro se os portugueses derem um voto de desconfiança na minha continuidade eu tirei de tirar daí a devida consequência”,
Contexto: Costa evitou pronunciar a palavra “absoluta”, mas insistiu na necessidade de uma maioria, para não ter que repetir “soluções precárias” como no passado. Rui Tavares, perante a reação do secretário-geral do PS, deixou o aviso de que os socialistas, se ganharem, não conseguirão gerir o País sozinhos.
Salário Mínimo
RUI TAVARES
“Numa conversa que tivemos [em 2019], eu disse [a António Costa] que se era para aumentar o Salário Mínimo convinha fazê-lo de imediato, no início da legislatura, quando a inflação era baixa. Agora deve estar arrependido. Nesta discussão [do orçamento de 2022] teve de dizer não ao PCP, porque a inflação é alta”.
“Precisamos de um pacto para o rendimento, para o trabalho e proteção social, que nos recoloque numa rota de aproximação ao Salário Mínimo espanhol”.
ANTÓNIO COSTA
“O que não podemos ter é um Governo do dr. Rui Rio; porque se acha que o aumento do Salário Mínimo foi pouco, ele [Rio] achou que era um excesso. Com o dr. Rui Rio nem sequer este aumento teria existido”.
Contexto: O Livre propõe no seu programa eleitoral um Salário Mínimo em mil euros no final da legislatura, em 2026, de modo a diminuir o fosso com Espanha, que já atingiu esse valor. Porém, António Costa voltou a lembrar que o exequível era o compromisso que assumiu há meses, de chegar a 2025 com 850 euros de valor referência.
Bloco Central
RUI TAVARES
“Aquele que é muito claro que nunca apoiará um Governo de Rui Rio, e estará na oposição, é o Livre, não é o PS”.
ANTÓNIO COSTA
“Rui Tavares, entre nós os dois quem é a alternativa para que Rui Rio e o PSD não seja Governo é mesmo o PS. Um voto no Livre não nos livra da direita. O que nos livra da direita é o voto no PS, que assegura ua governação responsável, segura, de avanço e progresso”.
Contexto: Tendo ficado claro que Costa dispensa o compromisso que o Livre pretende que seja assumido antes da legislativas, de que o PS pudesse deixar claro que corre por uma solução de esquerda e não por uma maioria, Tavares repescou a sombra do Bloco Central.