Já lhe chamaram “partido-fantasma”, mas o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCT/MRPP), a formação política fundada pelo “histórico” Arnaldo Matos (falecido em 2019), volta a marcar presença nos boletins de voto de nove círculos eleitorais.
O partido é liderado por Cidália Guerreiro, mas, desta vez, o rosto visível é o de João Valente Pinto, antigo candidato autárquico – em Viana do Castelo, Maia, Porto, Guimarães e Aveiro –, escolhido pelo comité central, para cumprir a “missão” como cabeça de lista por Lisboa, e que incluiu a presença no debate na RTP1 que reuniu os partidos sem assento na Assembleia da República.
Em entrevista à VISÃO, João Valente Pinto dispara contra o capitalismo, que, diz, “evoluiu para uma situação de crise permanente”. “A única via possível é o comunismo”, defende. O PCTP/MRPP mantém-se fiel às suas convicções; apesar dos sinais contrários, o partido (ainda) confia o futuro.
O PCTP/MRPP tem passado por tempos atribulados, vazios na liderança… Houve o falecimento do fundador Arnaldo Matos, houve líderes afastados (casos de António Garcia Pereira e Luís Júdice). Estas divergências não prejudicam o partido?
As decisões são coletivas sobre o que se pode e deve fazer. Pode haver divergências e discussão, por vezes à unidade, outras vezes não. É mesmo assim, e cada um segue o seu caminho. Importa destacar, isso sim, é que o PCTP/MRPP mantém-se na luta permanente pela instauração de uma sociedade comunista. Isso permanece, não há diferenças.
Mas o mundo mudou…
Claro. Hoje, há uma diferença: o capitalismo evoluiu para uma situação de crise permanente. Não tem soluções para nada, a única solução é a guerra. Não tem, neste momento, outra solução para apresentar…
Falava das profundas alterações sociais e políticas verificadas em Portugal e no mundo. Como é que o PCTP/MRPP procura afirmar-se como a melhor escolha nestas legislativas?
O ambiente geral é este: 50% dos eleitores não votam. E não votam porquê? Porque as possíveis escolhas que lhes são apresentadas estão entre a direita e a esquerda institucionais, o PS e o PSD. É o que a comunicação social apresenta às populações. Está tudo feito para que isso aconteça, não é? E, é claro, que 50% da população acha que seja qual for a escolha, os problemas vão manter-se, e por isso não votam ou fazem-no com os pés. O que fazem os jovens é emigrar… As condições aqui são de tal maneira terríveis que as pessoas vão embora.
Mas têm uma estratégia para a campanha?
A estratégia é apresentar o nosso ponto vista para a sociedade. Achamos que uma sociedade como esta, baseada na competição, serviu até certo ponto, mas já atingiu o seu limite. O capitalismo está esgotado, não serve para nada. Tem unicamente problemas para tudo, problemas que recaem sobre a população, em particular sobre a classe operária, que produz mais-valias. A única solução que eles têm é esmagar mais, e é isso que tem acontecido até hoje, e de uma forma cada vez mais agravada. Pode haver conversas mais macias, mas a verdade é que o resultado é sempre o mesmo. Aliás, PS e PSD têm governado, mas quem manda verdadeiramente é a União Europeia… e nem sei se é União Europeia… A guerra veio demonstrar que nem sequer existe qualquer autonomia da União Europeia, mas uma submissão completa aos interesses dos ramos do imperialismo e do grande capital.

As posições do PCTP/MRPP são conhecidas, mas é impossível ignorar que, entre 2015 e 2022, o partido passou dos 60 mil para os 11 mil votos. É preocupante?
Isso não nos preocupa,, porque sabemos que metade da população não vota. Os operários não votam, 90% não votam, porque acham que isso não resolve os seus problemas.
Mas como pode o partido dar a conhecer as suas ideias se, pelo que parece, cada vez menos pessoas escolhe este caminho? Não ficam pessimistas com os últimos resultados eleitorais?
Nós também não acreditamos em eleições… Neste tipo eleições. O que acontece é que num sistema como este, os partidos até podem apresentar programas que, aparentemente, vão solucionar alguma coisa, mas, na realidade, não vão. E as pessoasnunca votam no seu interesse, votam em programas que não vão ser realizados. Todos os programas e orçamentos têm de passar e ser aprovados por Bruxelas… Quem é que manda aqui? Para que é que há eleições aqui? Há alguma alguma razão para isso? Aparentemente não é para resolver o problema, é para manter a submissão. É para dizer “vocês votaram, agora vocês são responsáveis”. Estão, na prática, a responsabilizar o povo pelos problemas que eles próprios causam…
Se tem esta posição, porque vai o PCTP/MRPP a eleições?
Essa é uma questão que pusemos ainda nestas eleições. Ponderamos a hipótese de nem sequer ir, mas achámos que, por enquanto, ainda existe desta forma uma possibilidade de fazer chegar a nossa mensagem a parte da população, embora de forma muito reduzida.
Destaca o que diz ser a “falta de independência” do país face ao estrangeiro. É esta a principal bandeira do partido nesta campanha?
Essa é uma questão importante e está ligada à questão da guerra e da participação portuguesa na guerra, a submissão completa à linha capitalista, mas o principal é [lutar] contra o capitalismo, dizer que esta não é a solução, que o quadro presente não funciona nem resolve o problema dos trabalhadores. O capitalismo não tem solução para nada, a única via possível é o comunismo.
Estamos numa democracia liberal ocidental. O comunismo não está fora de moda?
O que o PCTP/MRPP sente que os jovens de 20 anos querem o comunismo, é isso que ambicionam. E, se os desafiarmos, muitos estão dispostos a esse combate… é o que me diz a minha experiência. E não é um fenómeno só em Portugal, mas em praticamente todo o mundo… Acho que o futuro não é nada disto que estamos a viver, mas uma sociedade de cooperação entre os jovens, uma sociedade comunista.
Já foi candidato autárquico pelo PCTP/MRPP a vários municípios [Viana do Castelo, Maia, Porto, Guimarães e Aveiro]. Porque é que nestas legislativas surge como cabeça de lista por Lisboa?
Somos um partido comunista e quando o comité central decide que é determinada pessoa, então, essa pessoa cumpre a tarefa. É simples, é uma missão.
O que seria um bom resultado para o PCTP/MRPP nas eleições de 10 de março?
O bom resultado será termos alargado a nossa organização de uma forma consequente. O objetivo concreto é esse e isso não se conta em votos eleitorais, mas em força da organização e naquilo que, a partir desse momento, ela será capaz de fazer.