O novo bastonário dos médicos assume-se “desiludido” com as últimas mudanças na Saúde. Para Carlos Cortes, a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) “já devia ter iniciado o processo de restruturação do SNS, envolvendo todos os profissionais do setor”.
Em entrevista ao Irrevogável, o patologista clínico diz ter “a maior consideração pessoal e profissional por Fernando Araújo [diretor do SNS] e pelo ministro da Saúde, Manuel Pizarro”, mas não deixa de criticar a falta de estratégia dos dois responsáveis. “Estamos a perder demasiado tempo e a querer exclusivamente dar uma resposta aos problemas imediatos. Gostaria que, em simultâneo, houvesse uma reflexão profunda em vez de uma urgencialização do sistema de saúde”.
Estamos a concentrar toda a resposta no serviço de urgência. Ora, não há nenhum país no mundo que aguente esta pressão sob este serviço
Carlos Cortes
O bastonário também não vê com bons olhos a proposta de urgências rotativas durante a noite na pediatria, nem consegue concordar com o argumento do ministro, quando Manuel Pizarro acena com os 86% das urgências diurnas face aos 14% que acontecem depois das 22h. “Não nos podemos focar nos períodos de maior afluência e não dar uma resposta nos de menor, porque pode haver um ou dois casos extremos em que isto coloque em risco a vida das pessoas”, defende o ex-presidente da secção do Centro da Ordem dos Médicos, mostrando-se “cético” em relação à “importação” das soluções aplicadas na região Norte para Lisboa e Vale do Tejo.
“Há uma dificuldade de recursos humanos, mas tem de haver uma solução diferente para se poder dar uma resposta permanente”, continua o especialista, que insta o Governo a rever as condições de trabalho dos médicos, as remunerações e o tempo para estes se dedicarem à investigação.
Tem havido uma grande dificuldade em explicar este modelo [de urgências rotativas] aos doentes, mas isso tem a ver com a falta de clareza do próprio sistema
Carlos cortes
Outra preocupação que promete marcar o mandato do recém-eleito bastonário é a formação dos jovens médicos. “O país não precisa de mais diplomados em medicina, precisa é de médicos especialistas. O foco tem de ser colocado nos hospitais e nos centros de saúde para formarem com qualidade mais médicos especialistas nas áreas em que são necessários”, nota, explicando que “hoje temos dois mil a três mil médicos formados em medicina e sem especialidade”, que acabam por se tornar prestadores de serviços ou emigrar.
Ou seja, para o novo representante dos cerca de 60 mil médicos que exercem em Portugal “a aposta tem de ser feita não em novas escolas médicas, mas na capacitação do SNS para formar mais médicos especialistas com qualidade”.
Para ouvir em Podcast: