António Correia de Campos, antigo ministro da Saúde de António Guterres e, posteriormente, com funções idênticas no primeiro governo de José Sócrates, afirma que um dos problemas do SNS, em Portugal, é o de ser “governado pelo Ministério das Finanças”. No programa semanal de entrevistas da VISÃO, o IRREVOGÁVEL, Correia de Campos acrescenta que esse “é um dos maiores erros da nossa administração” e que “o problema está na cabeça dos ministros das Finanças”, que, “mal entram no ministério, pensam, apenas, na forma de reduzir o défice, que é por isso esperam ser avaliados”. O antigo ministro defende que é necessário acabar com essa cultura e que os ministros das Finanças “têm de delegar” e entregar a gestão da Saúde às pessoas que gerem a Saúde. Fernando Medina não escapa à crítica, nomeadamente depois de ter dito que “o problema da Saúde não é falta de dinheiro”. Correia de Campos interroga-se: “Como interpretar uma declaração dessas? Ele sabe que o dinheiro vai gastar-se todo!” Para Correia de Campos, os ministros das Finanças “devem dar liberdade, para exigir responsabilidade, e não desconfiarem permanentemente do ministério da Saúde”.
Os problemas de fixação de profissionais no SNS (que deixam, por vezes, concursos abertos vazios) deve-se, para Correia de Campos, a três fatores fundamentais: “Primeiro, a demografia errática da população médica que sofreu, por vezes restrições brutais” (nomeadamente, com o numerus clausus de admissão às faculdades). Segundo, “a deterioração salarial na administração pública”. E, terceiro, “o crescimento de um setor privado forte, moderno, bem organizado e competitivo”.
A esse propósito, comenta as acusações de que o PS e o Governo teriam “um preconceito ideológico” contra os setores privado e social: “Eu, que criei as PPPs e sempre reconheci a importância e o papel do setor privado, sou acusado de ter o preconceito contrário… Ora, julgar que o SNS se constrói pondo entre parentesis o setor privado é uma ilusão. Deve haver uma relação saudável – mas que também passa por uma efetiva regulamentação – entre o Estado e o setor privado”. E vai mais longe: “Os próceres que batem com a mão no peito invocando António Arnaut são os mesmos que falharam na regulamentação do setor privado”.
E onde alguns detetam duas linhas, no PS, uma mais estatizante, outra mais liberal, o antigo ministro socialista identifica três linhas: “Por um lado, a visão imobilista, estatizante, que defende um SNS puro e público, que quase proíbe os médicos de trabalharem nos hospitais privados – uma visão lírica… Noutra linha, estão aqueles que preconizam a criação, dentro do SNS, de modelos de gestão empresarial, que responda às necessidades e prossiga uma gestão moderna. Porque hoje, cada hospital é uma grande empresa que movimenta centenas de milhões de euros. Depois, numa terceira linha, há os que preferem deixar tudo como está, que pode ser que a crise passe e tudo se resolva…” Será esta terceira solução aquela que o Governo e a ministra Marta Temido seguem neste momento? “Não diria isso… Neste momento, a fase é, sobretudo, a de tentar tapar buracos…”
Correia de Campos adverte que os próximos meses “não vão ser fáceis”, porque “as causas da crise que vimos nas últimas semanas se mantêm.