“Em relação às verbas insuficientes, quem tem razão é Rui Moreira. Nós queremos mais descentralização, queremos isto, mas queremos mais. Queremos que a descentralização seja acompanhada de um envelope financeiro que permita pagar as despesas. Isso não está a acontecer e tem de ser revisto. As contas não estão a ser bem feitas”, afirma Manuel Pizarro, também presidente da Federação Distrital do PS no Porto, em mais uma edição do programa de entrevistas políticas da VISÃO.
“Se estamos de acordo que a descentralização é uma coisa boa, que vai permitir servir as pessoas com mais proximidade e qualidade, temos de resolver a aritmética. E a aritmética é: queremos o dinheiro que essa descentralização custa. Deste ponto de vista, Rui Moreira tem razão”, explicou Pizarro.
Onde Rui Moreira não tem razão é na atitude, “em achar que isto se resolve com a câmara do Porto a sair da ANMP”. Na sua opinião, “o Porto não vai ficar melhor, a câmara do Porto não vai ficar melhor, a ANMP não vai ficar melhor e o processo de descentralização não vai correr melhor”. Ou seja, todos perdem. “O Porto é muito mais que o Porto, é olhado por muitos municípios do país e do norte como alguém que deve ajudar a estabelecer uma relação com o Estado central. Precisamos muito de Rui Moreira para ajudar que o processo de descentralização corra bem, mais em diálogo do que em conflito com a Associação de Municípios e com o governo.”
Manuel Pizarro confessa que nunca achou que a “descentralização fosse ser uma casa fácil”, pois não é “por determinação divina, que Portugal é um dos países mais centralistas da Europa”, e que “construiu ao longo de décadas uma administração pública ferozmente centralista”. Quando questionado se o país tem metido a regionalização na gaveta, é taxativo: “Não se meteu a regionalização na gaveta. Acho que há quem a tenha metido num cofre forte, fechado e depois se tenha esquecido da senha de abertura e deitado fora a chave.”
Tudo isto vem a propósito da forma como Rui Moreira ameaça sair da ANMP caso esta não consiga mais verbas para assumir a transferência de poderes nas escolas. Mas este será só o início de um processo. Também na saúde podem surgir vários problemas, uma vez que só 23 das 211 câmaras aceitaram um acordo para assumir certas competências na saúde. Porquê? “Há uma lei geral, mas tem de se estabelecer um acordo entre o município e a administração regional de saúde. Mas não estando estabelecido o envelope financeiro, os municípios optaram, e bem, por não assinar o acordo, enquanto não estiver tudo estabelecido”.
O eurodeputado defende que “deviam ser os municípios a definir os horários dos centros de saúde e mesmo que isso venha a aumentar a fatura pode e deve ser repartido entre os municípios e o Estado central”. E recorda que se o Estado central recebe “mais de 90% dos impostos pagos pelos portugueses”, não “se pode inibir de financiar”.
“Não há nenhum país da Europa da nossa dimensão que não tenha regiões administrativas. Porque será?”
A falar diretamente de Estrasburgo, o eurodeputado confessa as suas dificuldades em explicar aos seus congéneres a inexistência, em Portugal, de regiões administrativas. “É que na Europa não há país que não tenha regiões. Países da nossa dimensão, como a Holanda ou Bélgica, nem lhes passa pela cabeça que não há nenhum nível de governação entre o Município e o Estado central. Porque daí resulta um desequilíbrio no todo nacional…”
Acreditando que “a descentralização vai melhorar o funcionamento dos serviços públicos” e estando provado que “onde houve regionalização se andou mais rapidamente”, o ex-autarca vai deitando por terra os argumentos contra a regionalização. Como o de que aumenta a despesa pública – “em todos os indicadores as autarquias são melhores gestores do que o Estado central” – ; o de que vai gerar a multiplicação da classe politica – “mas é apenas a substituição dos cargos já existentes das estruturas desconcentradas do Estado central – , e a “mais tonta de todas”, a de que vai pôr em perigo a unidade nacional – “veja-se o caso dos Açores e da Madeira”.
O facto de não haver “uma estrutura política que permita que cada região se desenvolva de forma harmoniosa e que faça uma captação de recursos de acordo com o que deve ser o equilíbrio do país” é a causa apontada para que o norte não tenha o mesmo nível de convergência europeia que Lisboa e Vale do Tejo. “Um país com equilíbrio regional é um país melhor para se desenvolver no seu conjunto, Isto não é um tema de uns portugueses contra os outros. É o de uns portugueses todos a puxar pelo seu país.”
Referendo… outra vez
Defensor da realização de um novo referendo – outro tema que tem ido fraturante – o eurodeputado recorda como “houve um comando constitucional para se fazerem as regiões administrativas, que esteve vivo entre 1976 e 1998”. Mas lamenta muito que “os responsáveis políticos da época, do meu partido e do psd, tenham acordado uma revisão da constituição, que submeteu a regionalização à realização de um referendo vinculativo”.
“A minha indignação não é o facto de ter vencido o não no referendo de 98, mas o facto de não ter sido vinculativo”, avança, pois como democrata que, aceita a decisão dos que participam, mas n aceita que sejam os que não participam a decidir por ele. “Vai ser cada vez mais difícil conseguir um resultado vinculativo e isso foi feito intencionalmente por quem é adversário do processo de regionalização”, acusa,
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