A história do que António Costa andou para chegar à presidência do Conselho Europeu

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A história do que António Costa andou para chegar à presidência do Conselho Europeu

Todos os domingos, entre 1 de janeiro e 30 de junho de 2021, António Costa e Ursula von der Leyen falavam ao telefone. O telefonema era uma forma de Costa se articular com a presidente da Comissão Europeia durante os seis meses em que coube a Portugal assumir a presidência da União Europeia, mas foi durante essas conversas que os dois estreitaram laços que duram até hoje. “A relação com Ursula von der Leyen é muito boa”, garante à VISÃO quem acompanhou de perto António Costa nas andanças europeias. A proximidade com uma política da CDU (o partido democrata-cristão alemão) pode parecer inusitada, mas não é de agora que António Costa faz pontes com políticos da direita alemã. A relação com Angela Merkel era tão boa que Costa foi convidado para um jantar de despedida na residência oficial da chanceler alemã quando Merkel deixou o poder. “Era uma relação muito especial”, nota a mesma fonte, explicando que essa cumplicidade se teceu nas reuniões do Conselho Europeu, nas quais a Alemanha se senta do lado esquerdo de Portugal.

Bloco central Ursula von der Leyen e Pedro Sánchez com Emmanuel Macron e António Costa

Curiosamente, a aura de ter sido um primeiro-ministro que se vangloriava de ter “virado a página da austeridade” ajudou Costa a ganhar prestígio na Europa. Porquê? Porque o fez sempre cumprindo as regras do jogo, reduzindo o défice e a dívida e apresentando brilharetes orçamentais. “Toda a gente ficou muito impressionada”, conta quem esteve no núcleo duro governamental de Costa e via a forma como os seus homólogos europeus o tratavam. Pedro Sánchez, o presidente do governo espanhol, é um dos indefetíveis de António Costa. “Sempre que falo com António Costa, aprendo”, chegou a dizer Sánchez quando a 7 de janeiro de 2016 visitou a sede do PS, no Largo do Rato, numa altura em que assumia o fascínio pela recém-criada Geringonça. Mas se a aliança entre dois socialistas ibéricos parece óbvia, a extrema-direita de Le Pen serviu de pretexto para o apoio de Costa ao liberal Emmanuel Macron, tornando pública uma aproximação que já era notória para quem via o português e o francês a interagir em Bruxelas. Costa anunciou o apoio a Macron na segunda volta das eleições de 2022 e o francês não poupou nas palavras para agradecer. “Quero agradecer ao meu amigo Costa, que foi formidável. O António foi adorável, e fiquei muito emocionado”, disse, citado pela Lusa.

O trabalho oculto de Costa em Bruxelas

Cerca de um mês e meio depois dessas declarações emocionadas de Macron, um dos mais ouvidos podcasts de política do Reino Unido, The Rest Is Politics (conduzido pelo conservador Rory Stewart e pelo trabalhista Alastair Campbell), dedicava um episódio ao “carisma” de António Costa, com um Campbell muito impressionado com os dotes negociais do socialista e a apresentar Portugal como o ninho de líderes mundiais que forjou Durão Barroso e António Guterres.

Para quem estava nos bastidores europeus, as capacidades negociais de António Costa eram há muito evidentes, e não apenas por ter conseguido o (então improvável) apoio parlamentar de PCP e BE ao seu governo PS. Em fevereiro de 2016, o Conselho Europeu fez uma maratona negocial de 30 horas seguidas para desenhar um pacote cujo objetivo era dar ao então primeiro-ministro britânico David Cameron argumentos suficientes para lutar pelo “não” no referendo ao Brexit. “Costa teve um papel decisivo na questão da mobilidade que ficou nesse pacote”, assegura quem assistiu às negociações, explicando que a forma como o então primeiro-ministro português domina a legislação europeia se revelou crucial para definir um pacote no qual “muita coisa estava no limite da legalidade dos tratados”.

Não são favas contadas

O primeiro-ministro polaco trouxe para cima da mesa a Operação Influencer

Donald Tusk, o primeiro-ministro polaco, foi quem trouxe para cima da mesa do jantar informal de Bruxelas, na passada segunda-feira, a Operação Influencer. A situação judicial de António Costa coloca dúvidas a alguns dos membros do Conselho, mas a questão serve mais para aumentar a parada das negociações do que para outra coisa. O próprio Tusk (cujo partido faz parte, como a AD, da família PPE, vencedora das recentes eleições europeias) reconhece a Costa “competências para exercer o cargo”. Mas há temas europeus que alguns dos líderes conservadores invocaram para expressar as suas dúvidas sobre o candidato português: a alegada pouca firmeza no tema da imigração e as suas posições sobre a Ucrânia e a respetiva integração na UE. Não era expectável que, de uma reunião informal, saíssem já os nomes para ocuparem os mais altos cargos. A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, e o seu homólogo húngaro, Viktor Orbán, apresentam uma fatura: querem que o seu grupo de direita radical venha a ocupar alguns cargos nas vice-presidências. O jogo entre liberais, socialistas e democratas conservadores vai acontecer, mas a direita mais hard também pode influenciar decisões. Luís Montenegro sintetizou que o nome de Costa está bem encaminhado – mas ficou claro que não serão favas contadas. — F.L.

Quando foi preciso desenhar uma resposta à pandemia de Covid-19, António Costa voltou a ser uma peça central no xadrez europeu que levou à aprovação do Next Generation EU, o mecanismo da famosa “bazuca” de fundos do PRR. Um dos problemas era a necessidade de aprovar esse instrumento em 24 dos 27 parlamentos nacionais da União Europeia. Só isso poderia fazer com que tivessem sido necessários dois anos para pôr o pacote em ação. “António Costa conseguiu fazê-lo em cinco meses, porque falou com todos os nossos camaradas [socialistas]. Ele tinha um quadro com as datas de votação nos 24 e ia fazendo as conversas à volta disso”, conta uma antiga governante com responsabilidades na Europa. Costa sabia que os Países Baixos, a Hungria e a Finlândia eram os mais difíceis de convencer e conhecia bem os parlamentos nos quais os socialistas eram oposição e votariam sempre contra propostas que viessem dos governos. “Houve situações em que um ficou doente para não votar, outras em que um deputado saía da sala… Ele orquestrou isso”, assevera a mesma fonte.

Mas um dos países que deram mais trabalho a Costa foi a Hungria. Era preciso convencer Viktor Orbán a não bloquear a regra que condicionava a atribuição de fundos europeus à observação de princípios de Estado de direito. António Costa fez uma escala em Budapeste, em maio de 2023, para ver a final da Liga Europa de futebol, no estádio Puskás Aréna, ao lado de Orbán. O desvio feito no Falcon da Força Aérea que levava o primeiro-ministro até Chisinau (na Moldávia) para participar na Cimeira da Comunidade Política Europeia valeu-lhe em Portugal um caso com repercussões políticas e mediáticas. Mas várias fontes ouvidas pela VISÃO asseguram que o encontro com Orbán foi estratégico e fundamental para que a Hungria desse o sim que desbloqueou o PRR. “Conseguiu que a Hungria não vetasse o Orçamento Europeu”, diz uma fonte. “A viagem teve esse fito e teve esse efeito”, corrobora outra, explicando que Costa se afirmou como “um fazedor de pontes” na Europa nos últimos anos. “Sempre que havia um problema, mesmo que não fosse diretamente connosco, ele nunca falhava.”

As aulas de inglês

Para Ana Gomes, este empenho em encontrar soluções na Europa não é alheio às ambições que, acredita a socialista, António Costa começou a alimentar nos últimos anos. “Ando há três anos a dizer que ele não quer outra coisa. Determinou a governação para conseguir o lugar de presidente do Conselho Europeu”, afirma a ex-eurodeputada, que acha que “os brilharetes orçamentais”, conseguidos à custa de não ter, por exemplo, reposto o tempo de serviço dos professores, já foram feitos a pensar em causar esta boa impressão em Bruxelas. “Deixou que problemas graves se acumulassem e levassem a este resultado que o PS teve nas legislativas, porque estava a trabalhar para este objetivo. Serviu uma visão de Portugal de contas certas sem rasgo económico porque lhe dava os pergaminhos de que precisava”, acusa sem, contudo, duvidar de que, neste momento, é o melhor candidato à presidência do Conselho Europeu. “É mais sagaz do que Durão Barroso. E é inteligente e criativo. Bate-se pelas ideias. Não há ninguém melhor neste momento para aquele lugar.” Mais: Ana Gomes diz que António Costa “é reconhecido pelos pares”, que “Von der Leyen o prefere a Mario Draghi” e que Costa “tem em Macron um grande apoiante”.

Infância e juventude Com o pai, Orlando Costa, num congresso da JS e entre jovens camaradas

A verdade é que nos últimos três anos foi notória a inclinação de António Costa pelos assuntos europeus. Um sintoma disso foi o facto de ter começado a ter aulas para melhorar o inglês, uma vez que já dominava bastante bem o francês. E em 2022, na orgânica do governo de maioria absoluta que haveria de cair em novembro de 2023, Costa puxou os Assuntos Europeus para a sua tutela direta. “A visão dele sobre a Europa sempre foi a mesma”, diz-nos o antigo secretário de Estado adjunto de António Costa, António Mendonça Mendes, explicando que Costa nunca teve os Assuntos Europeus no Ministério dos Negócios Estrangeiros por entender que o que se passa na Europa não é política externa. “Essa visão esteve bastante clara desde o início.”

Cabeça fria, mesmo na queda

Quando, na manhã de 7 de novembro de 2023, a polícia entrou em São Bento para fazer buscas ao seu gabinete, António Costa não demorou muito a perceber que a sua demissão era inevitável. “Manteve sempre uma calma e um discernimento constantes. Não teve nenhuma hesitação sobre o que devia fazer”, conta António Mendonça Mendes. Entre a hora a que os agentes iniciaram as buscas e o anúncio da demissão, passaram-se cinco horas. Dois dias depois, o primeiro-ministro chamava os jornalistas para uma declaração ao País. Para muitos este parecia o fim político de António Costa, mas o próprio nunca se deu por vencido. Para os que o rodeavam, era claro que a certeza de que não tinha praticado “qualquer ato ilícito ou censurável” (como afirmou no momento em que se demitiu) lhe dava uma serenidade para continuar a trabalhar como se nada fosse até ao último dia. “Continuámos a trabalhar sempre. Nunca nos ocorreu adiar qualquer decisão. Sempre num registo de grande serenidade”, afirma Mendonça Mendes.

Longa experiência em cargos variados

Na fita do tempo do percurso político de António Costa, temos um menu sortido de funções: deputado nacional e europeu, três pastas ministeriais, experiência autárquica e chefia do governo

1989
Eleições autárquicas: diretor de campanha de Jorge Sampaio, em Lisboa

1991
Eleito deputado pela primeira vez

1995/97
Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (governo de António Guterres)

1997/99
Ministro dos Assuntos Parlamentares (governo Guterres)

1999/02
Ministro da Justiça (governo Guterres)

2004/05
Deputado europeu. Vice-presidente do Parlamento Europeu. Vota favoravelmente a nomeação de Durão Barroso como presidente da Comissão Europeia

2005/07
Ministro de Estado e da Administração Interna (governo de José Sócrates)

2007/15
Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

2014/24
Secretário-geral do PS

2015/24
Primeiro-ministro

Nesse momento, António Costa demonstrou a fibra de que é feito: manteve a cabeça fria e continuou a trabalhar para os seus objetivos. Tanto que, apesar de toda a convulsão política que se vivia, falou com Luís Montenegro, ainda antes das eleições, para assegurar que, caso avançasse com uma candidatura ao Conselho Europeu teria o apoio de um governo liderado pela AD. Montenegro fez-lhe saber que sim e passou a informação a Bruxelas, como o próprio revelou publicamente na noite das europeias. “Se o dr. António Costa for candidato a esse lugar, a AD e o Governo de Portugal não só apoiarão como farão tudo para que essa candidatura possa ter sucesso. Todos os meus colegas do PPE já sabem disto, mesmo antes de António Costa ser ex-primeiro-ministro”, anunciou Montenegro.

Momentos antes, no estúdio da CMTV, António Costa deixava claro que “nunca aceitaria ser candidato” a presidente do Conselho Europeu “sem o apoio do Governo do País”. Costa estreava-se nos ecrãs como comentador político da Medialivre, mas já andava pelo País há semanas em gravações para o programa que terá no novo canal de notícias do grupo, o News Now, e que deverá ter vida curta se o destino o levar a suceder a Charles Michel.

O “puto” que preferia os bastidores

António Costa pode estar prestes a chegar à ribalta internacional, depois de uma carreira política que começou aos 14 anos, quando, dois anos depois do 25 de Abril de 1974, começou a aparecer naquela que foi a primeira sede do PS, em São Pedro de Alcântara, em Lisboa. Alberto Arons de Carvalho já era dirigente da JS e lembra-se bem de ver o filho da jornalista Maria Antónia Palla e do poeta e publicitário comunista Orlando da Costa aparecer na sede socialista. “Ele vivia no Bairro Alto, com a mãe, mesmo por trás da sede.” Arons resolveu integrá-lo nas atividades partidárias, mesmo sendo dos mais novos que por lá andavam. “Havia muita atividade de colar cartazes e distribuir propaganda.” Costa dava nas vistas, mesmo que, como descreve outro camarada dessa época, fosse ainda “um puto” no meio de universitários. “Era uma pessoa muito determinada e capacitada”, elogia Arons de Carvalho.

Eurodeputado Foi vice-presidente do Parlamento Europeu e votou em Durão Barroso para presidente da Comissão (aqui, nessa sessão) Foto Bruno Rascao

Na JS, António Costa nunca foi líder nem nunca aspirou a isso, mas foi dirigente do secretariado nacional. “Tinha uma forma de fazer política em que se punha nos bastidores”, conta quem foi seu contemporâneo. Em 1981, no Congresso da JS, Margarida Marques foi a votos contra Luís Patrão, Costa “era o mentor” da candidatura de Patrão e sofreu a sua primeira derrota política. Feminista declarada, a mãe, Maria Antónia Palla, enviou um telegrama a felicitar Margarida por ser a primeira mulher à frente da JS. Babush, como era conhecido na família (graças às origens goesas do pai), não gostou e fez à mãe uma cena de ciúmes.

Derrotas, uma porta arrombada e um Ferrari

As derrotas são amargas, mas ajudam a moldar uma personalidade. E António Costa teve várias. Uma delas, mal digerida, na Associação de Estudantes da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Em 2015 uma das testemunhas da história, Laplaine Guimarães, contava ao semanário Sol a “tourada” que foi arrancar António Costa da sala da Associação de Estudantes depois de uma lista conjunta da JSD e da JC ter ganhado à que era encabeçada por Costa. O jovem socialista (que tinha chegado ao poder numa aliança com a JCP, para depois descartar os comunistas) estava trancado numa sala, que foi preciso arrombar com uma mesa de matraquilhos.

Muito mais sereno estava António Costa quando, nas autárquicas de 1993, saiu derrotado da corrida à Câmara Municipal de Loures depois de ter começado a noite eleitoral com as sondagens a darem-lhe a vitória sobre a CDU. “Primeiro, fechou-se bastante. Mas depois disse-nos que era o princípio e que era para continuar”, conta à VISÃO Ana Simões, na altura a número dois da lista.

As origens goesas

Descendente de brâmanes católicos, António Costa tem sangue azul…

António Costa é filho de gente célebre: o seu pai, Orlando Costa, goês, já falecido, foi um aclamado escritor. E a sua mãe, Maria Antónia Palla, foi uma das primeiras mulheres jornalistas portuguesas. António é meio-irmão (o mesmo pai, mães diferentes) do também jornalista Ricardo Costa, diretor-geral de informação do grupo Impresa e conhecido do público, sobretudo, através da SIC. Nos parâmetros de Goa, o ex-primeiro-ministro tem sangue azul, já que descende dos brâmanes católicos goeses, a casta mais elevada daquele estado indiano (embora o sistema de castas tenha sido legalmente abolido, mantém-se, porém, nas tradições locais). É descendente direto de Marada Poi, brâmane Gaud Saraswat do século XVI. Orlando Costa, o pai, poderia ter estudado em Bombaim ou, como muitos da sua condição, em Londres, mas veio para Lisboa atraído pela literatura e por Fernando Pessoa. Nascido em Portugal, António Costa foi pela primeira vez a Goa, com o pai como cicerone, quando completou 18 anos. Casado com Fernanda Tadeu, professora, António Costa tem dois filhos, um dos quais – Pedro Costa, com experiência autárquica – se notabiliza como um promissor quadro do PS. — F.L.

António Costa não tinha grandes ligações a Loures, a não ser o facto de os sogros viverem em Odivelas (que na época fazia parte do mesmo concelho), mas o seu nome apareceu como uma aposta do então secretário-geral do PS, António Guterres. “Guterres decidiu fazer um grande investimento na Área Metropolitana de Lisboa onde o PS não tinha grande força”, lembra Edite Estrela, explicando que nessas autárquicas foram candidatos na Grande Lisboa vários dirigentes e figuras mais conhecidas. A própria Edite Estrela em Sintra, Armando Vara na Amadora e José Luís Judas em Cascais. António Costa já estava como deputado municipal em Lisboa há 11 anos e foi cabeça de lista por Loures.

“Foi uma campanha fabulosa. Era uma pessoa com muitas ideias e energia e quis fazer uma lista com pessoas do concelho. A mim, conheceu-me num debate. Não havia ninguém muito ligado ao aparelho do PS”, relata Ana Simões. Uma ideia de António Costa que fez furor nacional foi a de pôr um burro e um Ferrari a fazer uma corrida pela Calçada de Carriche para denunciar o problema dos acessos a Loures. O Ferrari era do embaixador Alfredo Duarte Costa. E o burro ganhou. “Teve imenso impacto”, diz Edite Estrela, que se lembra de, na noite eleitoral, ainda ter dado a Costa os parabéns pela vitória antes de o final da contagem ter revelado um desfecho diferente. “Foi um balde de água fria.”

Passado o choque inicial, António Costa decidiu assumir a vereação e montar um verdadeiro “executivo-sombra” na Câmara Municipal de Loures. Ainda lá esteve dois anos até ir para secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares em 1995, ano em que começou a preparar a primeira campanha presidencial de Jorge Sampaio, em cujo escritório de advocacia tinha começado a trabalhar com Vera Jardim e Magalhães e Silva, depois de acabar o curso. Foi, aliás, António Costa quem indicou a Magalhães e Silva os nomes de três dos seus melhores amigos, Diogo Lacerda Machado, Pedro Siza Vieira e Eduardo Cabrita, para irem trabalhar para Macau. Costa ficou sempre por Lisboa.

Uma morte que levou a uma reviravolta

A carreira política estava lançada. De secretário de Estado passou a ministro dos Assuntos Parlamentares e, em 1999, assumiu a pasta da Justiça, até à queda do governo de Guterres em 2002, ano em que passou a ser líder da bancada parlamentar do PS. Esteve dois anos à frente do grupo parlamentar socialista antes de Ferro Rodrigues o escolher como número dois de uma lista ao Parlamento Europeu encabeçada por António Sousa Franco. Costa já conhecia os corredores de Bruxelas como ministro e aceitou o desafio. Mas a campanha eleitoral revelar-se-ia muito mais dura do que alguém poderia ter antecipado.

Numa ação na lota de Matosinhos, os ânimos exaltaram-se à passagem da caravana socialista, com desacatos entre apoiantes de Narciso Miranda e Manuel Seabra, ambos do PS e candidatos à Câmara Municipal de Matosinhos. Foi preciso uma escolta para tirar Sousa Franco do local, que não conseguiu estar mais do que 15 minutos no mercado. À saída, o candidato sofreu um ataque cardíaco. Poucas horas depois, estava morto. “Ficámos bloqueados, em estado de choque. Foi muito difícil”, lembra Edite Estrela, que também fazia parte da lista às europeias.

Dinastia europeia Com Macron, von der Leyen e Roberta Metsola, presidente do PE (que pode, ou não, continuar)

Com a morte de Sousa Franco, António Costa passou a cabeça de lista. E o resultado não poderia ter sido melhor: o PS elegeu 12 eurodeputados. “Costa era já um bom conhecedor do projeto europeu e estava muito à vontade em todos os temas”, nota Edite Estrela, explicando que o bom resultado dos socialistas e as boas capacidades negociais de António Costa lhe valeram o lugar de vice-presidente do Parlamento Europeu. “Foi ótimo no lugar. Sabe delegar e coordenar”, comenta Ana Gomes, que também foi eleita nessa lista. “Ele era muito batido no estilo de negociação que se faz lá para a distribuição de lugares”, recorda Ana Gomes, que acredita que essa foi uma competência aprendida na escola da política. “Isto não se aprende senão na vida partidária. Tinha toda uma vastíssima escola desde os 14 anos.” Costa foi tão bom a negociar que a delegação socialista conseguiu todos os lugares que pretendia. “A equipa era praticamente toda nova e as pessoas ficaram nas comissões que queriam.”

A experiência como eurodeputado durou pouco, esteve em Bruxelas entre junho de 2004 e março de 2005, porque entretanto José Sócrates chegou ao governo e chamou-o para ser ministro de Estado e da Administração Interna. Costa teve pena de sair do Parlamento Europeu, mas era impossível dizer que não a Sócrates.

Apesar de tudo, a ida para o governo não o afastou das questões europeias. “Como ministro, esteve muito ligado à Europa. Nunca mais ficou completamente afastado”, frisa Edite Estrela. Em 2007, Portugal teve a presidência da União Europeia e isso fez com que Costa estreitasse ainda mais os laços com a Europa.

A conquista de Lisboa

Ora, foi em 2007 que o acaso voltou a trocar as voltas à vida de António Costa. A 9 de maio desse ano, o executivo da Câmara Municipal de Lisboa cai depois de meses de polémicas e casos relacionados com o urbanismo durante o mandato de Carmona Rodrigues, um independente eleito pelo PSD. Lisboa foi para eleições intercalares e Costa foi o candidato do PS àquela que é a maior câmara municipal do País e que, muitas vezes, é descrita como sendo maior e mais complexa de gerir do que muitos ministérios.

António Costa ganhou a câmara a Fernando Negrão (do PSD), mas a candidatura de um movimento de cidadãos encabeçado pela socialista Helena Roseta ajudou a baralhar as contas e o PS ficou sem maioria para governar. Foi aí que entraram novamente em jogo as capacidades negociais de Costa, que em pouco tempo conseguiu até puxar para o seu executivo o vereador José Sá Fernandes, que tinha sido eleito pelas listas do BE, mas que acabaria por entrar em rutura com a direção bloquista.

O dia em que Costa cresceu

No governo de Guterres, ganhou um braço de ferro ao primeiro-ministro

No final do ano 2000, rebentava uma inesperada crise política no seio do segundo governo de António Guterres. O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Ricardo Sá Fernandes, membro influente do Ministério das Finanças, liderado por Pina Moura, criticava publicamente a Justiça portuguesa depois de mais um arquivamento do Caso Camarate, sem a conclusão de que o desastre que vitimou Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa se tinha tratado de um atentado. Sem propriamente separar as funções, o membro do governo era, também, advogado das vítimas e até publicara um livro com a tese do atentado (mais tarde confirmada). Mas o ministro da Justiça, António Costa, não gostou de ouvir um seu colega de governo criticar, em termos tão azedos, a área que tutelava. Mais do que uma questão de facto – atentado ou acidente –, era um problema institucional. Vai daí, concluiu que o executivo era demasiado pequeno para caberem os dois – ele próprio e o secretário de Estado – e apresentou a demissão a António Guterres: ou saía ele ou Sá Fernandes. Guterres insistiu numa conciliação, mas Costa fez finca-pé e o sacrificado foi mesmo Ricardo Sá Fernandes. Nesse dia, António Costa provou que a política, para ele, não era brincadeira nenhuma: mostrara os dentes, assumira um braço de ferro e vencera. Esse foi um momento político definidor. Quer no partido, quer no País, a imagem de António Costa começava a estabelecer-se como a de um potencial líder, com espessura política – e não apenas como a de um ajudante. De lá para cá, foi sempre a crescer. — F.L.

Com o vereador do Urbanismo Manuel Salgado como seu braço direito e mão de ferro a gerir os serviços, António Costa conseguiu serenar as polémicas que tanta mossa tinham causado a Pedro Santana Lopes e a Carmona Rodrigues quando estiveram nos Paços do Concelho. Mesmo com várias notícias levantando dúvidas sobre a gestão de Salgado, Costa resistiu sempre. Mais: nas autárquicas de 2009 conseguiu uma maioria absoluta inédita.

António Costa foi feliz como autarca, tanto que mais tarde, como primeiro-ministro, evocava muitas vezes esse período. Mesmo assim, havia algumas frustrações. “Ser presidente da câmara é como ser dona de casa, o trabalho nunca está feito”, comentava às vezes em privado. Costa tinha outras ambições e capital político suficiente para sonhar com a liderança do PS.

Eram os tempos da Troika, mas o PS parecia não ser capaz de capitalizar o desgaste do governo de Passos e Portas. António José Seguro anunciava em 2011 uma “abstenção violenta” na votação do Orçamento do Estado e as hostes socialistas impacientavam-se com um líder que negociava descidas de IRC com a direita e parecia distante da contestação crescente que se fazia nas ruas ao governo.

A falsa partida que irritou Pedro Nuno

Os “jovens turcos” do PS, Pedro Nuno Santos, Duarte Cordeiro, Pedro Delgado Alves e João Galamba, desesperavam. Conhecedor do aparelho socialista, Pedro Nuno Santos dispõe-se a abrir terreno a uma candidatura de Costa contra Seguro. Pedro Nuno aquece os motores, mas António Costa trava a fundo. O presidente da Câmara Municipal de Lisboa não quis avançar em 2013, para grande frustração de Pedro Nuno Santos que tinha pressa de apear Seguro e vontade de fazer o partido guinar à esquerda.

Foi preciso esperar um ano para, dois dias depois de uma vitória do PS “por poucochinho” (como disse Costa na altura), António Costa decidir que estava na hora de entrar na corrida para o Largo do Rato. Teve apoios de peso, como o de Mário Soares, que chegou a ir à Câmara Municipal de Lisboa dar-lhe esse apoio, mas sobretudo conseguiu que a opinião pública o visse como a figura mais capaz de deitar abaixo Pedro Passos Coelho.

Campanha em Loures– Antonio Costa e Jorge Sampaio 1989, Antonio Guterres

“A apreciação generalizada era a de que Seguro estava mais frágil, pela proximidade ao Passos”, analisa o socialista Vítor Ramalho, explicando que isso ajudou a que, naquelas que foram as primeiras (e até agora únicas) primárias do PS abertas a não militantes, António Costa tivesse uma vantagem natural. Ramalho acredita que Costa foi mais hábil a ler o descontentamento gerado por Passos. Um sinal disso foi a presença de António Costa nas duas Aulas Magnas, organizadas por Soares, que foram uma reunião das esquerdas e nas quais Seguro nunca quis estar presente. “Costa teve a intuição da importância das Aulas Magnas, cujo propósito por parte de Soares era ser contra as políticas de Passos”, diz Vítor Ramalho.

A campanha das legislativas de 2015 não correu bem a António Costa, que parecia perder gás na estrada. Em cima da ideia de ter salvado o País da bancarrota, Passos Coelho conseguiu uma magra vitória que, ainda assim, serviu para fazer a festa no Hotel Sana, em Lisboa, na noite das eleições. Mas a euforia durou pouco. Na noite eleitoral, Jerónimo de Sousa tinha deixado claro que “o PS só não é governo se não quiser” e Catarina Martins tinha, no final de um debate, ainda em campanha, apresentado a António Costa o caderno de encargos necessário para o BE viabilizar a governação socialista.

O nascimento da Geringonça

No dia 10 de novembro às 17h16, o curto governo minoritário de Passos caiu com estrondo, depois de aprovada a moção de rejeição apresentada pelo PS. “Não é bem um governo, é uma geringonça”, diria nesse debate Paulo Portas, ajudando a firmar uma designação que se colaria para sempre a essa solução governativa de um governo PS apoiado no Parlamento por PCP e BE.

A forma como negociou sempre com os seus “primos” (como chamava aos parceiros à esquerda) ajudou a vincar a ideia de que é um exímio negociador. Marcelo Rebelo de Sousa, que durante o início do mandato presidencial teve com Costa uma “cooperação estratégica” exemplar, chamou-lhe “otimista irritante”. Mas quem o conhece de perto sabe que é “um sedutor” que quando se exaspera pode ser “mais feroz do que Sócrates” e que não gosta de ouvir críticas.

Ana Gomes diz mesmo que Costa “lida muito mal com quem é crítico, sobretudo se são mulheres”, dando o exemplo da forma como “foi muitas vezes acintoso com Catarina Martins e Assunção Cristas” nos debates no Parlamento. Agora, pode ter uma mulher a fazer-lhe frente: Giorgia Meloni, a primeira-ministra italiana que, com a extrema-direita a sair reforçada das europeias, tem dado sinais de que os top jobs de Bruxelas não podem continuar a ser divididos sem ter os Conservadores e Reformistas em conta. Para já, a primeira reunião sobre o tema deu em impasse. Nos dias 27 e 28 joga-se o próximo capítulo da vida de António Costa. Será ele o próximo presidente do Conselho Europeu?

Outros portugueses na alta-roda

Um presidente da Assembleia Geral da ONU, um presidente da Comissão Europeia e um secretário-geral das Nações Unidas

Mário Soares chegou a ser presidente da Internacional Socialista, no tempo em que a IS era uma organização realmente influente na Europa. Mas o primeiro grande cargo internacional ocupado por um português foi o de presidente da Assembleia Geral da ONU, na 50.ª Sessão, no biénio 1995/96. Diogo Freitas do Amaral, antigo ministro, antigo presidente do CDS e ex-candidato presidencial, desempenhou com distinção a função. Em novembro de 2004, o então primeiro-ministro Durão Barroso, líder do PSD, foi o ungido para presidir a Comissão Europeia, cargo que ocupou até outubro de 2014. Em 2007, Jorge Sampaio, ex-PR, foi designado alto-representante da ONU para a Aliança das Civilizações. Em 2010, Vítor Constâncio seria empossado como vice-presidente do BCE, para a área da supervisão. Ex-ministro das Finanças, e ex-líder do PS, Constâncio tinha tido um desempenho polémico como governador do Banco de Portugal. Também em 2010, João Cravinho ocupou um lugar na administração do BERD (Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento) em Londres. Depois de ter liderado o ACNUR, agência da ONU para os refugiados, António Guterres foi o português que chegou mais alto na hierarquia – pelo menos, simbólica – dos cargos internacionais, sendo escolhido para desempenhar a função de secretário-geral da ONU, a 1 de janeiro de 2017, tendo sido reconduzido para um segundo mandato, que ainda decorre. Mário Centeno, então ministro das Finanças, chegou a presidente do Eurogrupo, em 2018. No mesmo ano, António Vitorino iniciou o seu mandato na liderança da Organização Internacional para as Migrações. — F.L.

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