O Ministério Público (MP) acredita que Diogo Lacerda Machado “exerceu influência em benefício da Start Campus”, não só junto do governo de António Costa – através, pelo menos, de Vítor Escária e de João Galamba –, mas também de outras “pessoas e entidades”. Os arguidos garantem que tinham o PCP controlado.
Exemplo disso foi o procedimento para a revisão do Plano de Urbanização da Zona Industrial e Logística de Sines (PUZILS), com vista à instalação de centros de dados – como pretendia a Start Campus -, iniciado pela Câmara de Sines em 2021, mas que se foi arrastando, para desespero do gestor da empresa, Afonso Salema.
As pressões duraram dois anos. E arrastaram-se até à aprovação, pela autarquia, das alterações no PUZILS que a Start Campus pretendia, o que aconteceu, apenas, no passado dia 25 de outubro, duas semanas antes da “Operação Influencer” ser tornada pública.
Numa conversa telefónica intercetada pela investigação, realizada no passado dia 15 de setembro, entre Afonso Salema e Miguel Gama, vice-presidente da AICEP, o gestor da Start Campus lamentou-se por continuar a “não conseguir alinhar absolutamente nada com a Câmara” de Sines, recebendo como resposta, de Miguel Gama, que “o problema da Câmara (…) [é que] tem uma arquiteta [Maria de Fátima Matos] que é uma pessoa muito complicada”. Afonso Salema perguntou, de seguida, de que partido era a referida arquiteta militante ou simpatizante, para tentar “fazer pressão”. A resposta foi PCP.
“Temos o apoio do PCP também, o PCP gosta muito de nós [Start Campus]. Então se calhar vou pedir. O Diogo [Lacerda Machado] já me ofereceu várias vezes ter uma conversa no Comité Central [do PCP]”, revelou Afonso Salema, ao seu interlocutor.
Nos dias seguintes, as pressões mantiveram-se (e intensificaram-se). A vereadora Filipa Faria passou a ser o alvo do desagrado dos protagonistas.
Afonso Salema garantia estar “a elevar o assunto” do PUZILS “ao primeiro-ministro”. “Agora vai ao primeiro-ministro, não estou aqui a brincar às escolinhas” disse o gestor da Start Campus
No dia 26 de setembro, Afonso Salema contactou o também arguido Rui Oliveira Neves (e administrador da Start Campus) para lhe manifestar a vontade de “voltar a contactar” o então chefe de gabinete, Vítor Escária, para que este “pressionasse” Nuno Mascarenhas, presidente da Câmara de Sines. “O [Nuno] Mascarenhas está a fugir com o ‘rabo à seringa’, está sempre a atrasar”, disse, acrescentando: “Vou pedir ao Escária se pode dar o toque”.
No dia 2 de outubro, Afonso Salema telefonou a Diogo Lacerda Machado, pedindo-lhe para “falar com o [Vítor] Escária para que este desse um apertão ao [Nuno] Mascarenhas”. Nos dias seguintes, Salema insistiu com Lacerda Machado para que este fizesse “pressão” junto de Escária para que o problema fosse resolvido. Em conversas com terceiros, o homem-forte da Start Campus garantia que já estava “a elevar o assunto” do PUZILS ia “ao primeiro-ministro”. “Agora vai ao primeiro-ministro, não estou aqui a brincar às escolinhas”, chegou a dizer.
No dia 25 de outubro 2023, foi incluída, na ordem de trabalhos da reunião da Câmara de Sines, o ponto para a aprovação do início do procedimento e aprovação das normas provisórias a incidir no PUZILS, como pretendiam os agora arguidos.
Recorde-se que Afonso Salema e Diogo Lacerda Machado foram detidos na terça-feira de manhã, tal como o chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, e ainda Nuno Mascarenhas e Rui Oliveira Neves, numa investigação que visou os casos dos negócios do lítio, do hidrogénio e do centro de dados em Sines, batizada como “Operação Influencer”. Nesse mesmo dia, foram ainda constituídos arguidos o ministro João Galamba e Nuno Lacasta, presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Conhecido como “o melhor amigo” de António Costa, Lacerda Machado é suspeito de ter usado a proximidade com o primeiro-ministro para desbloquear decisões importantes que beneficiariam a Start Campus. Durante a investigação, o nome do primeiro-ministro foi mencionado por alguns suspeitos, colocando assim Costa na mira do MP, que passou a ser alvo de um inquérito do Supremo Tribunal de Justiça (órgão competente), para apurar se o primeiro-ministro demissionário está ou não envolvido neste alegado negócio.