Mereceu uma grande apresentação pública do Governo, criou depois diversas críticas – até por determinadas regras que aí viriam, como o arrendamento coercivo, foi aprovado apenas pelo PS (com a abstenção do PAN e do Livre) e agora conhece um travão em Belém. O pacote Mais Habitação foi vetado pelo Presidente da República, esta segunda-feira, que, tendo em conta a falta de conjugação das diversas normas da legislação criadas pelo Executivo e a falta de um apoio político alargado, considera o documento “um exemplo de como um mau arranque de resposta a uma carência que o tempo tornou dramática, crucial e muito urgente pode marcá-la negativamente”.
Somente a a lei que autoriza “o Governo a simplificar, significativamente, os procedimentos urbanísticos e de ordenamento do território” foi promulgada. Mas Belém quer que haja a garantia, entre outras medidas, que com essa legislação a qualidade de construção não sai a perder e o ordenamento do território não é prejudicado.
Na declaração enviada ao presidente da Assembleia da República, onde agora terá de ser reavaliada a legislação assim que voltarem os trabalhos parlamentares, Marcelo admite (veja aqui) que a “maioria absoluta parlamentar pode repetir, em escassas semanas, a aprovação acabada de votar”. Mas, talvez, fosse uma oportunidade para haver um “acordo de regime, que, por não ter existido até aqui, pode dificultar a aplicação do Mais Habitação num futuro.
“Tudo somado, nem no arrendamento forçado, nem no alojamento local, nem no envolvimento do Estado, nem no seu apoio às cooperativas, nem nos meios concretos e prazos de atuação, nem na total ausência de acordo de regime ou de mínimo consenso partidário, o presente diploma é suficientemente credível quanto à sua execução a curto prazo, e, por isso, mobilizador para o desafio a enfrentar por todos os seus imprescindíveis protagonistas – públicos, privados, sociais, e, sobretudo, portugueses em geral”, considera Belém.
Marcelo começa por assinalar que a “emergência da crise habitacional” levou, há seis meses, o Governo a acenar com este pacote, que acabou por criar dúvidas e objeções quanto a somente “dois temas centrais – o arrendamento forçado e o alojamento local”.
Por um lado, a apresentação deste decreto, muito centrado nessas duas medidas, “apagou outras propostas e medidas e tornou muito difícil um desejável acordo de regime sobre Habitação, fora e dentro da Assembleia da República”. Depois, “deu uma razão – justa ou injusta – para perplexidade e compasso de espera de algum investimento privado, sem o qual qualquer solução global é insuficiente”; além disso, “radicalizou posições no Parlamento, deixando a maioria absoluta quase isolada”.
Dito isto, este diploma vetado, “apesar das correções no arrendamento forçado e no alojamento local”, “dificilmente permite recuperar alguma confiança perdida por parte do investimento privado, sendo certo que o investimento público e social, nele previsto, é contido e lento”.
Marcelo lamenta ainda que, ao longo destes meses, não se tenham resolvido outros problemas, como o “sufoco de muitas famílias em face do peso dos aumentos nos juros e, em inúmeras situações, nas rendas”.
“Em termos simples, não é fácil de ver de onde virá a prometida oferta de casa para habitação com eficácia e rapidez”, conclui o chefe de Estado, que lamenta que esta legislação seja “um exemplo de como um mau arranque de resposta a uma carência que o tempo tornou dramática, crucial e muito urgente pode marcá-la negativamente”.
Quanto ao que Belém deu luz verde, tratam-se dos “procedimentos urbanísticos e de ordenamento do território”, com um aviso sobre “a necessidade de compatibilização entre a simplificação urbanística e outros valores a preservar, como é a segurança e qualidade das edificações, a responsabilização dos intervenientes no processo de construção e o importante papel da Administração Local em matéria de habitação e de ordenamento do território”.
“O Presidente da República espera, ainda, que o Governo, se possível, aproveite o ensejo para ponderar a reunião num único diploma de toda a legislação dispersa (imensa e, em alguns casos, contraditória), eliminando contradições e normas obsoletas e melhorando a acessibilidade da legislação do setor, num passo fundamental para a desejável simplificação urbanística. Assim, prefigurando algo que aponte para um Código da Edificação”. explica.
O pacote Mais Habitação foi aprovado em Conselho de Ministros, a 16 de fevereiro, tendo sido apresentado publicamente pelo primeiro-ministro, ministra da Habitação e ministro das Finanças. O arrendamento coercivo foi uma das medidas que começou logo por criar grande polémica.
A 19 de julho, este diploma, agora vetado, foi aprovado no Parlamento apenas pelo PS, com duas abstenções – as dos deputados PAN e Livre. Todos os outros partidos – PSD, Chega, IL, PCP e BE – votaram contra.