“Assumi funções em 2019, esse processo foi uma questão que não foi colocada. […] Quando é feita a negociação [com David Neeleman] não existe essa clarividência”, respondeu Pedro Nuno Santos ao deputado do PCP Bruno Dias, na comissão de inquérito à TAP.
O deputado do PCP tinha perguntado se o ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação sabia dos chamados fundos Airbus no momento em que foi negociada a saída de David Neeleman da companhia aérea, em 2020, quando o Estado pagou ao ex-empresário 55 milhões de euros e recuperou o controlo estratégico da empresa.
“Quando tomou conhecimento desta situação de David Neeleman ter comprado a TAP com dinheiro que a TAP ia pagar?”, questionou Bruno Dias.
O negócio entre David Neeleman e a Airbus permitiu a capitalização da companhia pela Atlantic Gateway (consórcio de Neeleman com Humberto Pedrosa que ganhou a privatização feita pelo Governo PSD/CDS-PP), no valor de 226,75 milhões de euros.
O antigo secretário de Estado Sérgio Monteiro disse, no parlamento, ter ficado com a convicção de que se tratou de um desconto comercial, devido à dimensão da encomenda.
Adicionalmente, uma auditoria pedida pela TAP concluiu, no ano passado, haver indícios de que a companhia possa estar a pagar mais do que as concorrentes pelos aviões Airbus, tendo o Governo decidido enviá-la para o Ministério Público, que abriu um inquérito.
“Agora que tenho mais conhecimento do processo, não deixa de me suscitar alguma inquietação. […] Se essa é a explicação, o desconto comercial é da TAP, não é dado ao patrão ou ao acionista”, defendeu hoje Pedro Nuno Santos.
O ex-ministro sublinhou que a auditoria não deve ser desvalorizada, mas também não pode afirmar que a operação com a Airbus tenha sido ilegal.
Na semana passada, na sua audição na comissão de inquérito, o antigo ministro da Economia António Pires de Lima desvalorizou a auditoria, que chamou de “papel” que expressa uma opinião.
“Não é um papel como ouvi aqui. Qual papel?”, aludiu Pedro Nuno Santos, sublinhando que a auditoria foi pedida pela TAP a sociedades de advogados.
Relativamente aos 55 milhões de euros pagos a Neeleman, o ex-governante reiterou que se tratou de uma negociação “com um empresário que não estava obrigado a ceder nada”, para evitar litigância.
Pedro Nuno Santos foi também questionado sobre as declarações do advogado e antigo administrador da TAP Diogo Lacerda Machado, que defendeu, na comissão de inquérito, que as condições excecionais criadas pela pandemia de covid-19 anulavam o acordo parassocial assinado entre o Estado e a Atlantic Gateway, não havendo, por isso, lugar àquele pagamento.
“O que sei é que a sociedade de advogados contratada pela Parpública tinha um entendimento diferente e é partir desse entendimento que se faz essa negociação. Mesmo que o Estado fosse invocar um evento excecional que permitisse, no limite, não pagar nada, essa interpretação do Estado teria de ser disputada judicialmente. […] Não havia tempo”, contrapôs o ex-ministro.
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