Até à próxima quarta-feira, o deputado do Chega nos Açores espera que todas as partes envolvidas na negociação de um novo acordo para a viabilização do orçamento regional vejam a luz. “Comigo não há zonas cinzentas. Sou um homem de fé, muito crente em Deus. A palavra que tive do meu líder foi: que Deus nos elimine a todos. Estamos aqui para derrubar muros”.
Com estas palavras, José Pacheco desanuviou sexta-feira, 19, em conferência de Imprensa, a crise política que se adivinhava nos Açores. Revoltado com a alegada menorização do seu partido por parte de Rui Rio, o líder do Chega, André Ventura, manifestara vontade em “rasgar” o acordo de viabilização da atual maioria governativa regional (PSD/CDS/PPM), celebrado em novembro de 2020. Os cenários de queda do governo regional e de eleições antecipadas estão ainda em cima da mesa, mas agora parece haver outro caminho para andar. “O diálogo está a decorrer finalmente. Estamos a fazer uma caminhada que considero positiva”, anunciou José Pacheco, satisfeito com a atitude “muito dialogante” de José Manuel Boleiro, chefe do governo. “Estamos mais confortáveis com as garantias que nos foram dadas, embora haja arestas a limar”.
Na prática, porém, o acordo inicial será mesmo rasgado. Mas para ser “reformulado”. “Não pode ser um acordozinho, tem de ser um acordo”, explicou. O deputado regional já garantiu disponibilidade de José Manuel Bolieiro para acolher novas propostas do Chega, entre elas um incentivo à natalidade de 1500 euros por cada bebé, com possibilidade de majoração nas zonas mais pobres. Ao mesmo tempo, a coligação de direita estará disposta a acolher uma proposta de apoios e equipamentos “há muito reclamados” por quatro corporações de bombeiros. Quanto às matérias que já estavam incluídas no acordo anterior, há também sinais positivos: segundo José Pacheco, serão definidas ações de fiscalização e metas concretas para reduzir aquilo que o Chega chama a “subsidiodependência” das famílias em relação ao RSI e o partido terá também “um papel ativo na orgânica e no funcionamento do gabinete anticorrupção”. O governo terá ainda prometido ao deputado – cujo voto é essencial para a viabilização das contas públicas nos Açores – medidas concretas para a redução da dívida. “O Chega deve estabilidade, diálogo e concertação à nossa autonomia. Isso não nos impede de sermos críticos, custe o que custar”, avisou José Pacheco.
Crise? Qual crise?
Confrontado com o facto de André Ventura ter dramatizado a crise política nos Açores ao ponto de anunciar que o acordo regional estava em vias de ruir, José Pacheco passou o tempo a tirar gás às fervuras dos últimos dias. “André Ventura mandou uma mensagem a nível nacional”, admitiu, mas virou o ónus do eventual “chumbo” do orçamento para o líder do PSD. “Se o acordo é insignificante, vamos melhorar o acordo. Ninguém foi perguntar ao doutor Rui Rio porque é que passou um atestado de estupidez ao governo dos Açores”. José Pacheco garante, por seu lado, não existir qualquer desacordo com Ventura. “A autonomia do Chega nos Açores nunca esteve em causa”, garantiu.
A estratégia é, pois, mostrar o Chega como “um partido confiável” em todo o território nacional. E se o exemplo açoriano reforçar a mensagem, tanto melhor. “A direita não pode voltar as costas aos seus parceiros naturais. Seria um suicídio”, afirmou, em defesa de entendimentos e pontes. “Faço-o em nome da estabilidade e da autonomia e com acordo do meu líder. Esta é a última oportunidade, mas as oportunidades não podem ser dadas de olhos fechados. O Chega não passa cheques em branco”, avisou, recorrendo ao passado. “Os Açores deram bons exemplos de começar revoluções, mudanças”, ilustrou. “Já me conhecem, não tenho filtros. Se tiver de pôr este governo ao chão, ponho. Se tiver de o salvar, salvo! Tenho o partido comigo. Nunca tive faltas de lealdade e o André Ventura não quer dar ordens aos Açores”.
Recusando chantagens – “isso é o que os políticos de cadeira fazem” – José Pacheco dispensa igualmente a tutela do Ministro da República neste processo negocial tendo em vista novo acordo de viabilização do governo da região. “Porque é que tenho de mostrar o acordo ao Ministro da República?! Não somos uma região autónoma? Não admito que o representante da República meta o bedelho no acordo. Mandamos-lhe um mail”.
De referir, por último, que o Chega elegeu dois deputados nos Açores, mas Carlos Furtado, antigo líder do partido na região, desfiliou-se do partido e passou a deputado independente após divergências insanáveis com André Ventura. “Estamos todos a comer tremoços e a beber cerveja, tranquilos, porque já sabemos como esta crise fabricada vai acabar”, ironizou.