Entre os visados da mais recente investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, o mesmo que revelou os Luanda Leaks e os Panama Papers, constam três políticos portugueses. Nuno Morais Sarmento, atual vice-presidente do PSD, Vitalino Canas, ex-porta-voz do PS e Manuel Pinho, ex-ministro da Economia e da Inovação no governo PS, liderado por José Sócrates, integram a complexa teia de informações sobre companhias offshore ligadas a um total de 35 líderes mundiais (atuais e passados) e mais de 330 figuras ligadas à política em 91 países e territórios, e mais de 130 bilionários da lista da Forbes.
Advogado e antigo ministro da Presidência nos governos de Durão Barroso (2002-2004) e Santana Lopes (2004-2005), o atual vice-presidente do PSD – e o único dos três visados em exercício de um cargo político – Nuno Morais Sarmento, 60 anos, terá sido o beneficiário da Magalia International Limited, companhia offshore registada nas Ilhas Virgens Britânicas através da qual comprou uma escola de mergulho (Diversity Scuba), e um hotel rústico com 13 quartos, Tofo Mar, ambos em Moçambique, na praia do Tofo, em Inhambane. Há 15 anos, como explica ao jornal Expresso, Morais Sarmento recorreu a um empréstimo hipotecário sobre a sua casa de residência em Lisboa e, em conjunto com alguns amigos, fez um investimento, adquirindo posições em empresas moçambicanas: 49% da Tofomania Limitada (hotel) e 98% da Maningue Limitada (escola de mergulho). “Nunca a sociedade Magalia International Limited auferiu quaisquer rendimentos com origem em Moçambique, nem muito menos a mesma distribuiu a meu favor quaisquer fundos. Seja a título de dividendos, ou do reembolso do capital investido”, justificou ao semanário.
Atualmente, tanto o hotel, como a escola de mergulho pertencem na totalidade ao advogado lisboeta, mas nos Pandora Papers, a companhia offshore Magalia continuava ativa em 2018 (embora tenha deixado de ser acionista do hotel em 2014) e o político era ainda o seu beneficiário efetivo.
Outro advogado, Vitalino Canas, 62 anos, deputado do Partido Socialista, entre 2002 e 2019, secretário de Estado nos governos de António Guterres e porta-voz do PS durante a liderança de José Sócrates, vê o seu nome associado à investigação jornalística mundial porque foi-lhe passada uma procuração para atuar em nome de uma companhia também registada nas Ilhas Virgens Britânicas. A Secucom International Holding Limited passou uma procuração em nome do político português e de um cidadão russo, dando-lhes plenos poderes para, em nome da empresa, abrirem e operarem contas bancárias em dólares, ou qualquer outra moeda, em instituições financeira de todo o mundo, bem como assinar documentos e formulários também em nome da empresa, incluindo para contratar uma linha [telefónica] à Companhia de Telecomunicações de Macau [CTM] e serviços dos Correios de Macau. Sobre a procuração, Vitalino Canas disse ao Expresso que “o mais próximo que encontramos é uma procuração em língua estrangeira, deficientemente traduzida, não minutada por nós e que não encontramos registo de ter sido utilizada (ao que me recordo por a termos considerado tecnicamente incorreta, porventura inválida, e por nunca ter sido necessário)”.
Também antigo governante português, Manuel Pinho, 66 anos, consta dos Pandora Papers como beneficiário de três companhias offshore, Tartaruga Foundation, Blackwade Holdings Limited e Mandalay Asset Management Corp – trio de empresas que integram os Pandora Papers e, por cá, já são do conhecimento público, por estarem envolvidas num inquérito-crime ainda em curso sobre a EDP. Há três anos, a análise, por parte de procuradores do Ministério Público a documentos do processo de Regime Excecional de Regularização Tributária a que Manuel Pinho aderiu em 2012, permitiu confirmar que tanto o economista como a sua mulher, Alexandra Fonseca Pinho, eram os beneficiários da Tartaruga Foundation (a companhia offshore tinha €1,6 milhões depositados no final de 2010 numa conta do Banque Privée Espírito Santo, na Suíça) e da Mandalay (o casal tinha mais €1,1 milhões depositados numa conta do Deutsche Bank). Depois de a Tartaruga e a Blackwade terem sido incorporadas nas Ilhas Virgens Britânicas pela Alcogal, no verão de 2010, a Tartaruga Foundation passou a ser acionista da Blackwade, e esta por sua vez abriu conta no Banque Privée Espírito Santo para logo de seguida comprar um apartamento no Platinum Condominium, a 100 metros da Times Square, em Nova Iorque, por 1,2 milhões de dólares. Em declarações ao Expresso, Manuel Pinho explica: “Não tenho nenhum rendimento por declarar às autoridades fiscais seja de onde for”, reafirmando uma posição de “transparência total”.