A três meses das eleições, é tempo de sublinhar distâncias e começar a puxar pelo(s) eleitorado(s). Em entrevista à VISÃO, publicada na edição que esta quinta-feira estará nas bancas, António Costa aposta na contenção e não pede mais que “o melhor resultado possível” nas legislativas – até porque, como ficou claro há quatro anos, não vai impor “condições para governar”. Mas avisa os parceiros à esquerda: “O PS também tem de fazer pela vida.”
Costa vinha com a mensagem preparada. “Todos os dias ouvimos o BE e o PCP dizerem que tudo o que aconteceu de bom foi graças a eles – e apesar do PS! E que tudo o que aconteceu de mau foi por culpa do PS. Mas, quando o PS reage, lá estão os socialistas a serem ingratos e a ambicionar a maioria absoluta, para se libertarem dos seus parceiros. Ora, chegámos a uma fase do calendário político em que, inevitavelmente, cada um puxará a brasa à sua sardinha… E o PS também tem de fazer pela vida.”
Está dado o aviso, mas isso não implica o fim das relações a quatro (afinal, o partido Os Verdes também esteve no barco nos últimos quatro anos). Hoje, há uma “confiança reforçada” entre os vários partidos e, se um acordo de Bloco Central só seria possível em “situações excecionais” que não se antevêm no horizonte, à esquerda, uma reedição do atual modelo só não acontecerá, do lado do PS, se algum dos parceiros colocar uma “linha vermelha” relativamente a “alguma matéria que já sabe, de antemão, ser impossível de aceitar pelos outros”.
Recados aos parceiros, mas que se estendem aos setores que mais têm feito pressão sobre o executivo (como os enfermeiros e os professores).. É certo que o “diabo” não voltou, mas “não podemos ter a ilusão de que passámos do inferno ao paraíso”, sublinha o primeiro-ministro.
Uma das maiores críticas que tem sido feita ao Governo foca-se na falta de investimento público e na degradação dos serviços públicos. A essas críticas, o primeiro-ministro responde com a inversão do discurso. “O melhor teste ao sucesso desta legislatura é o seguinte: muitos daqueles que, no seu início, consideravam irresponsável o que pretendíamos fazer – e que corríamos o risco de invocar o diabo – são os mesmos que, agora, nos acusam de não termos ido suficientemente longe.”
António Costa recebeu a VISÃO uma semana depois de ter voltado de Bruxelas, onde participou numa maratona negocial para alcançar um acordo para os lugares de topo na Comissão Europeia nos próximos anos. A solução encontrada – com a alemã Ursula von der Leyen na Comissão, David-Maria Sassoli no Parlamento Europeu (dois anos e meio depois, é substituído por Manfred Weber), Charles Michel no Conselho Europeu e Christine Lagarde no Banco Central Europeu – não era a solução desejada pelo líder socialista.
Aliás, no final do encontro de 2 de julho, Costa deixou isso claro. Mas também confirmou que o seu nome foi um dos que estiveram em cima da mesa – primeiro, para chefiar o Conselho Europeu e, num segundo momento, para presidir à Comissão Europeia. A hipótese foi afastada de imediato. “Não tenciono desertar de Portugal. Estou muito empenhado em continuar a fazer aquilo que tenho vindo a fazer, como aliás está provado”, concretizou na semana passada.”
A resposta aos jornalistas foi entendida como uma crítica implícita a Durão Barroso, o antigo-primeiro-ministro que, a meio da legislatura, trocou Lisboa por Bruxelas e pela presidência da Comissão Europeia. Costa rejeita essa leitura. “Falei de mim e só de mim. Assumi um compromisso com o País, no horizonte de uma década. Não pensei em ninguém,, muito menos no dr. Durão Barroso, cuja decisão então compreendi e até apoiei”, explica à VISÃO.