Na sua intervenção no hemiciclo de Estrasburgo, no quadro dos debates sobre o Futuro da Europa com chefes de Estado e de Governo, o primeiro-ministro defendeu que cada Estado-membro deve ter a liberdade de fazer as suas escolhas e deu o exemplo de Portugal, que fez opções “diferentes”, mas cumprindo as regras comuns.
“Partilhar uma casa comum, partilhar os mesmos valores, não significa prescindir da nossa identidade nem renunciar à liberdade de cada um fazer as suas escolhas (…). Significa, pelo contrário, acordar entre todos um conjunto de regras comuns de convivência e dar a cada um a liberdade de poder seguir o seu próprio caminho de acordo com essas regras comuns e para benefício de todos”, disse, no seu discurso sobre o futuro da União Europeia.
Apontando que “as regras não servem para uniformizar as políticas”, mas sim “para que os compromissos comuns possam ser alcançados através das diferentes políticas que os eleitorados escolham, democrática e soberanamente”, António Costa explicou então que o seu Governo optou por um trajeto diferente, alternativo à austeridade.
“Em Portugal, definimos uma alternativa à política de austeridade, centrada em mais crescimento económico, mais e melhor emprego e maior igualdade. A reposição de rendimentos devolveu confiança aos agentes económicos, permitindo o maior crescimento económico desde o início do século, um crescimento sustentado no investimento privado, nas exportações e no emprego”, apontou.
“É verdade que fizemos diferente, mas cumprimos as regras e temos aliás hoje finanças públicas mais sólidas do que tínhamos há três anos atrás. Saímos em 2017 do procedimento por défice excessivo, tivemos no ano passado o défice mais baixo da nossa democracia e na passada semana a Comissão Europeia retirou Portugal da lista de países com desequilíbrios macroeconómicos excessivos”, lembrou.
António Costa acrescentou que ainda mais importante “é que a afirmação da soberania democrática devolveu confiança nas instituições democráticas e na União Europeia”, recorrendo a dados de um recente estudo de opinião publicado pela Comissão Europeia (Eurobarómetro) para sublinhar o “claro apoio dos portugueses à UE”.
“Não temos por isso qualquer crise existencial. É na União e com todos os que o queiram, que desejamos construir o nosso futuro”, asseverou.
Orçamento ambicioso e mecanismo de convergência
Para o orçamento da União Europeia pós-2020, Costa defende ambição e uma capacidade orçamental própria que corrija as assimetrias.
O chefe de governo focou parte significativa do seu discurso no sentido de a União Europeia ter a “responsabilidade política de responder aos anseios legítimos dos cidadãos europeus”, o que, argumentou, só será possível com “uma verdadeira União, mais coesa, económica, social e politicamente”.
“Para que isso seja possível, há duas prioridades muito claras: concluir a União Económica e Monetária, o projeto mais ambicioso que já conseguimos pôr em prática, e dotarmos a União dos recursos à medida das suas responsabilidades e dos desafios que temos de enfrentar”, sustentou.
Defendendo que “a convergência é a chave para a união na Europa e só ela poderá garantir a necessária estabilidade da zona euro, assegurando a redução dos riscos e a partilha dos benefícios”, Costa disse que é necessário “aproveitar este momento de crescimento e de otimismo nos mercados para dar um novo impulso à União Económica e Monetária que reforce a convergência e previna novas crises”.
“Qualquer união monetária madura dispõe de uma capacidade orçamental, e é nesse sentido que venho defendendo a criação de uma capacidade orçamental própria da zona euro, articulada com o exercício do semestre europeu” de coordenação de políticas económicas e orçamentais da UE, referiu.
Referindo-se à segunda prioridade, Costa voltou a defender a necessidade de dotar a UE “de um orçamento à medida das suas exigências e das suas ambições”, apontando que Portugal parte para este novo ciclo de negociações sobre o quadro financeiro plurianual (orçamento da UE pós-2020) “com uma posição clara”: é necessário reforçar os recursos próprios da União e é necessário um aumento das contribuições de todos os Estados membros.
“Portugal está disponível para aumentar a sua contribuição e apoia a criação de novos recursos próprios. Só assim podemos honrar o compromisso que assumimos com os cidadãos de garantir maior segurança face às alterações climáticas, às ameaças externas e ao terrorismo, o futuro do nosso modelo social, do emprego, da gestão das migrações, sem sacrificar políticas que são já parte da identidade da União Europeia, como a Política Agrícola Comum (PAC) ou a Política de Coesão”, disse.
“Belo desempenho coletivo”
O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, prestou “homenagem” a Portugal pelo “belo desempenho coletivo” que permitiu ao país ultrapassar a crise e chegar hoje a uma situação económica em que poucos acreditaram há alguns anos.
Intervindo imediatamente a seguir ao primeiro-ministro, António Costa, o presidente do executivo comunitário voltou a dar conta da sua paixão por Portugal, um país “fortemente atingido pela crise”, pelo que fica particularmente feliz por constatar a atual situação económica.
“Portugal saiu no ano passado do Procedimento por Défice Excessivo e, na semana passada, a Comissão concluiu que os desequilíbrios já não são excessivos. Quem teria acreditado há uns anos? Quem teria acreditado?”, disse.
O presidente do executivo comunitário sublinhou que “a verdade é que estes progressos exigiram dos portugueses ao longo destes dolorosos anos esforços consideráveis, que os outros europeus nem sempre valorizam na medida certa”.
“É um belo desempenho coletivo que honra cada português. Quero por isso aqui render homenagem aos portugueses, aos que dirigiram o país durante os anos de crise, levando à correção dos desequilíbrios, e sobretudo ao povo português, sobretudo aos mais modestos dos portugueses, que contribuíram com uma coragem admirável e sucesso para este grande esforço nacional”, afirmou, sendo muito aplaudido pelos parlamentares.
Juncker aproveitou para “sublinhar também que este resultado notável contraria aqueles que criticaram a Comissão por aplicar o pacto de estabilidade com sensatez e flexibilidade”, o que ajudou Portugal a sair da crise da forma que o fez.
O presidente da Comissão advertiu que “a situação melhorou mas evidentemente resta trabalho a fazer”, sobretudo no sentido de “consolidar os resultados obtidos de forma a virar definitivamente a página sobre estes anos sombrios”, e apontou como prioritário melhorar a competitividade.
Tendo sentado a seu lado no hemiciclo o comissário Carlos Moedas, a quem elogiou “a sorte de ser português” e “o trabalho absolutamente notável” que tem feito à frente da pasta da Investigação, Ciência e Inovação, Juncker garantiu que Portugal pode continuar a contar com a Comissão Europeia, da mesma forma que a Europa conta com Portugal.
“Os meses que se seguem são cruciais para o futuro da Europa. Seremos julgados com base nos factos, e não nas palavras, e Portugal sempre demonstrou largamente que respeita o que diz, quaisquer que sejam as dificuldades. O futuro da Europa passa também por Portugal”, afirmou. “Obrigado a todos”, despediu-se, em português.
António Costa é o terceiro líder europeu a participar no ciclo de debates promovido pelo Parlamento Europeu sobre o Futuro da UE, iniciado este ano, depois dos primeiros-ministros da Irlanda, Leo Varadkar, em janeiro, e da Croácia, Andrej Plenkovic, em fevereiro, e antes do Presidente francês, Emmanuel Macron, o “convidado de honra” da sessão plenária de abril.