Marcelo Rebelo de Sousa reagiu, esta quinta-feira, à notícia do Público que dá conta de que o Governo foi apanhado de surpresa com a declaração do Presidente da República ao país. De acordo com o jornal, o Chefe de Estado já tinha sido informado pelo Executivo sobre a saída da ministra da Administração Interna do cargo assim como o timing definido para que ocorresse – depois do Conselho de Ministros do passado sábado. Terá sido por este motivo que o Governo terá ficado “chocado” com as palavras de Marcelo no seu discurso, em que apelava a mudanças rápidas e onde, de forma subtil, exigiu a demissão de Constança Urbano de Sousa. O Presidente da República reagiu à notícia ao início da tarde: “Não interessa quem ficou mais chocado, chocado ficou o país”, disse.
Há quem acredite que este episódio é mais um reflexo de que as relações entre Belém e São Bento já estiveram melhores. Em declarações à VISÃO, o politólogo André Freire considera que a “aparente lua-de-mel que existia” entre o Primeiro-Ministro e o Presidente da República “pode ter terminado.” O primeiro sinal terá sido a declaração do Chefe de Estado na semana passada, em que Marcelo Rebelo de Sousa “mostrou que tinha autonomia” e onde expressou “uma visão própria” do que tinha acontecido. O “Governo reagiu em consonância e tomou as medidas que entendeu tomar”. Algo que pode ter contibuído para “a normalização da relação com o Presidente”, mas que pode não ser suficiente para restabelecer a estabilidade que antes existia.
Na Assembleia da República, e ao contrário do que se podia esperar numa situação como esta, André Freire explica que o Executivo “até saiu reforçado com o chumbo da moção de censura” do CDS. A nível parlamentar “existe um apoio” a este Governo, que saiu renovado depois da votação da moção. No entanto, a também politóloga Marina Costa Lobo avisa que a viragem para um novo ciclo não se deve tanto à dinâmica do Parlamento mas sim às relações entre o Presidente da República e o Governo: “trata-se de um Executivo minoritário, cujo apoio até pode ter saído reforçado, mas não deixa de ser minoritário, o que o torna mais frágil.”
Até agora tudo parecia estar a correr bem ao Governo – desde os indicadores económicos aos resultados eleitorais. Mas, explica Marina Costa Lobo, “foi criada uma falsa sensação de segurança” que deu “alguma arrogância de poder” a António Costa, o que tornou a reação do Governo, não só a esta tragédia como à de Pedrógão Grande, “muito lenta.” O que Marcelo Rebelo de Sousa tentou com o seu discurso foi “colocar-se ao lado dos portugueses” e recentrar a discussão. A politóloga não crê que o Presidente se tenha posto do lado inverso ao do Executivo, mas – “e esta é a grande novidade”, explica – “mostrou que o apoio ao Executivo não vai ser constante”, trata-se de “um apoio condicional.”
Segundo Marina Costa Lobo há, no entanto, algo que pode beneficiar politicamente o Governo: o PSD está a passar por um processo “de convulsão interna.” Este fator pode ajudar a neutralizar este primeiro distanciamento entre Belém e São Bento. E isso vai depender do acolhimento que o próximo líder dos sociais-democratas vai ter “junto do eleitorado português.”