Durante anos, João Rendeiro e outros ex-administradores do Banco Privado Português (BPP) conseguiram que fossem processados pelo banco prémios anuais, prémios de mandato e prémios de antiguidade, sem que esses complementos remuneratórios constassem dos recibos de vencimento emitidos por aquela instituição bancária e sem que, consequentemente, fossem declarados à Autoridade Tributária. Mas este não foi o único feito: sem o conhecimento ou a decisão da comissão de vencimentos do banco, os então administradores João Rendeiro, Salvador Fezas Vital e Paulo Guichard Alves conseguiram que o BPP financiasse despesas pessoais como carros de luxo, viagens e festas de aniversário sem qualquer conexão com a instituição bancária.
A procuradora do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa que acusou este ano cinco administradores do BPP de crimes de fraude fiscal, abuso de confiança e branqueamento de capitais, concluiu que aquele banco privado suportou a compra de um Aston Martin, e de pneus e de um vidro para aquele carro de alta cilindrada; financiou a compra de um BMW X5 e de um deflator de vento para um Jaguar; pagou Expedições à Líbia e outra viatura usada para o efeito, viagens ao Peru e Atacama, aparelhos de ginástica e outras coisas bizarras, num processo de fuga ao fisco que envolvia o BPP Cayman, uma série de sociedades offshore e contas bancárias movimentadas com recurso a pseudónimos como ‘Corvo’ e ‘Coruja’.
“Assim, com o acordo, conhecimento e vontade dos arguidos, foram processados pelos serviços competentes do BPP rendimentos de periodicidade anual e outros rendimentos de natureza extraordinária, cuja atribuição era ocultada da administração tributária e sobre os quais não eram pagas, pelos arguidos beneficiários, quaisquer quantias a título de tributação”, diz o despacho de acusação a que a VISÃO teve acesso.
Além de ter sido usada para “o pagamento de despesas pessoais”, essa manobra foi usada, por exemplo, com o complemento anual ‘forex’, correspondente a 8% do rendimento anual líquido de cada um; com o prémio anual, correspondente a 1,5% do rendimento anual líquido; com o prémio dos dez anos da constituição do BPP, atribuído em 2007, correspondente a três rendimentos líquidos anuais e um prémio de mandato do conselho de administração do BPP, atribuído em 2008, e correspondente a quatro vencimentos líquidos anuais e com “outras remunerações entregues aos arguidos”.
À ordem deste processo João Rendeiro e familiares têm 11 contas arrestadas, à semelhança de quatro imóveis, 68 mil euros em dinheiro vivo e obras de arte. O Ministério Público pede que seja condenado a pagar quase 5,2 milhões de euros acrescidos de juros de mora até ao pagamento integral.