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À hora marcada para o início da manifestação, eram pouco mais de 300 as pessoas espalhadas pela praça de Praça de São Francisco, em pleno centro de Faro. Dispersos e distraídos pela banda sonora do momento (Deolinda e Homens da Luta), gente de todas as idades justificava, em conversas de circunstância, as razões da sua presença: “Tem de se fazer alguma coisa”, “isto não pode continuar assim” ou “já batemos no fundo”, eram algumas da frases mais ouvidas. Os membros da organização, anunciavam, optimistas, que esperavam “cerca de mil pessoas, mas certamente não esperariam o que aconteceu a seguir. Em poucos minutos, a imensa praça com vista para a Ria Formosa tornou-se pequena demais – seis mil pessoas, segundo os números da polícia, que fizeram desta manifestação a maior de sempre alguma vez realizada no Algarve. “É normal que haja esta adesão, pois estamos num distrito com quase 15 por cento de desemprego. O objectivo deste movimento é ser transversal, porque a precariedade é transversal a toda a sociedade”, diz à VISÃO Ruben Dias, 24 anos, estudante de economia na Universidade do Algarve e um dos dinamizadores do protesto em Faro.
Num palco improvisado, com os microfones à disposição de quem quisesse falar, sucediam-se os oradores: estudantes, arquitectos, desempregados, professores ou reformados, pais, filhos, avós e netos, numa amostra quase transversal da sociedade, feita de gente vinda de todo o Algarve. As declarações eram entremeadas com canções de protesto, entoadas por artistas locais – canta-se Venham Mais Cinco, de Zeca Afonso, com a multidão a irromper em aplausos quando se ouve a frase “não há lugar para os filhos da mãe”. António Miguéns, 39 anos, professor contratado, em Tavira, faltou à manifestação do seu sindicato, em Lisboa, para estar presente: “Vim constatar in loco esta movimentação de pessoas apartidárias. A política do século XXI vai ser cada vez mais feita por estes movimentos de cidadania, que não se revêem nos partidos”.
Começa finalmente a marcha. A fila de pessoas, empunhando cartazes, bandeiras nacionais e diversas tarjas caminha em direcção ao centro da cidade, onde mais gente se lhe haveria de juntar. “Mudança, mudança” ou o eterno “o povo unido jamais será vencido” são algumas das palavras de ordem. “Vim cá fazer número, para demonstrar que ninguém está satisfeito”, afirma à VISÃO o fotógrafo Jorge Corte-Real, 54 anos. Lídia de Almeida e Ana Silva, 57 e 35 anos, mãe e filha, ambas professoras, fazem questão de sublinhar que não têm partido: “Apenas queremos reivindicar o direito a uma vida melhor. Neste momento, por mais que se trabalhe, o dinheiro não chega para ter uma vida digna. Já basta de pagar para trabalhar”. A conversa é interrompida pela passagem de um comboio, que apita, em apoio aos manifestantes.
Duas horas depois, a massa de gente regressa ao ponto de partida e ligam-se de novo os microfones. “Uivemos, disse o cão”, lê-se num cartaz ao longe, a lembrar o repto de José Saramago, no seu Ensaio Sobre Lucidez. Sucedem-se as queixas e as reclamações, até que chega a vez de “um jovem de 19 anos, de Quarteira”, como se apresenta. Magro, franja desalinhada sobre os olhos, calças de gangas justas e botas ténis, olha para a multidão e resume, numa simples frase, tudo o que ali se passou: “O que é que eu quero da vida? Que me deixem ser feliz…”