Há 20 horas, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, publicava, na sua conta no Twitter, uma imagem da fachada do Parlamento Europeu, em Bruxelas, Bélgica, com as cores da bandeira ucraniana projetadas. “Nestas horas negras […], este é um símbolo da nossa solidariedade, amizade”, legendava, garantindo que, “mais do que nunca, a União Europeia está com o povo ucraniano”. Mas, à medida que as horas passam desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, na madrugada desta quinta-feira, não é este tipo de solidariedade que alguns políticos europeus desejariam ver por parte do executivo comunitário. Da esquerda à direita, em Portugal, Ana Gomes, Miguel Poiares Maduro, Rui Tavares são alguns exemplos de nomes que se declararam envergonhados com as medidas de apoio da Comissão Europeia, baseadas em sanções “simbólicas” e em disponibilidade para receber refugiados.
“Acordo e cubro-me de vergonha pela União Europeia. Von der Leyen e outros “líderes” europeus nem para engraxar os sapatos de Churchill serviam”, atirava a primeira pedra, em Portugal, a diplomata e ex-candidata presidencial Ana Gomes, que já ontem tinha defendido, em declarações à VISÃO, que Putin não vai parar na Ucrânia. “Não há que ter ilusões. E os líderes europeus que não nos enganem… Esta guerra não é só sobre a Ucrânia. Esta guerra é também sobre a Europa. É pela Europa! Este é o momento. Não podemos ser cobardes”, defendeu a antiga eurodeputada socialista, criticando a “inação” dos líderes europeus, perante a ofensiva militar russa, que já cobre grande parte do território ucraniano, toma conta de pontos estratégicos, como a central nuclear de Chernobyl, e ronda a capital, Kiev.
Apesar da investida das tropas separatistas ter sido condenada pela generalidade da comunidade internacional; ter motivado reuniões de urgência quer da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), quer das instituições europeias e terem sido aprovadas sanções em massa contra a Rússia, estas medidas não desincentivaram Putin. Já hoje, Josep Borrell, alto representante da UE para os Negócios Estrangeiros, confirmou, citado pelo The Guardian, que a Comissão Europeia se prepara para congelar os bens de Putin e do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, se os 27 votarem em conjunto. Todavia, até Borrell admite que esta medida pode ser apenas simbólica. O que, por outro lado, dá uma certa confiança ao representante da UE de que será aprovada. Mais difícil tem sido avançar com sanções pesadas, como a expulsão da Rússia do sistema global de comunicações bancárias e financeiras SWIFT, que abalaria com efeito imediato a economia russa. Mas esta medida divide os países do ocidente. Se países como o Reino Unido ou a República Checa a têm defendido no imediato, outros com vias comerciais em jogo como a Alemanha, mantém-se contra e relembram que o bloqueio à Rússia poderia fazer apenas com que esta transferisse os seus sistemas de pagamento para países que não impusessem estas sanções, como a China, que tem o seu próprio SWIFT.
O antigo presidente do Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk, juntou-se ao coro dos que pedem mais às instituições europeias, acusando-as de tomar “sanções fingidas” e vaticinando que “os governos europeus que bloqueiem as decisões (como a Alemanha, a Hungria, a Itália) cairão em desgraça”. Em linha, com o defendido pelo Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que criticou a NATO (de que faz parte) e a UE pela ausência de uma “ação determinada” – “Tudo o que fazem é dar conselhos e avisos à Ucrânia”.
Sem quórum no Parlamento Europeu, dificilmente as sanções contra a Rússia endurecerão e as atuais não preocupam o suficiente o governo de Putin, como dizia, em entrevista, o embaixador russo na Suécia: “nós não queremos saber das sanções deles [da UE]. Não são positivas, mas também não são tão más quanto o ocidente as quer fazer parecer”.
De regresso a Portugal. O porta-voz do Livre, Rui Tavares, lança o mesmo repto que Ana Gomes ou Donald Tusk: “Se alguma coisa tem de mudar já nas próximas horas e dias, é isto: a vontade política para finalmente confiscar estes bens e interromper estes fluxos financeiros será o teste do algodão”.
E o especialista em direito europeu e antigo ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional do PSD Miguel Poiares Maduro compara a resposta “ridícula” da UE à ação de Putin – “Putin apostou que estava mais comprometido com o custo da guerra do que os europeus com o custo das sanções económicas. Infelizmente, isto provou ser verídico”, lamenta Poiares Maduro. Secundado pela eurodeputada social democrata Lídia Pereira, que se declarou também “envergonhada” com as posição do Parlamento que integra.
Ucrânia lamenta resposta “lenta”
“Como é que vocês se vão defender, se são tão lentos a ajudar a Ucrânia?”.
A pergunta é do presidente ucrâniano, Volodymyr Zelensky, e foi feita, esta sexta-feira, durante uma comunicação para jornalistas internacionais, onde Zelensky se condoeu pela ajuda “lenta” dos europeus.
“Cancelar vistos para russos? Desconexão do SWIFT? Isolamento total da Rússia? Chamada de embaixadores? Embargo de petróleo? Hoje, tudo deve ser feito, porque se trata de uma ameaça para todos nós, para toda a Europa”, alertou o chefe do governo, pedindo ajuda militar a todos quantos tenham competências de combate.