Num ‘briefing’ perante o Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU), o diretor-geral adjunto da Organização para Alimentação e Agricultura (FAO), Maurizio Martina, indicou que algumas áreas do Sudão, particularmente no oeste e centro do Darfur, estão suscetíveis a cair numa situação de insegurança alimentar “catastrófica” à medida que a época de escassez – período entre colheitas que vai de maio a agosto – se aproxima.
De acordo com Martina, o conflito está a impulsionar a crise de fome no país, restringindo a produção agrícola, danificando importantes infraestruturas e meios de subsistência, perturbando os fluxos comerciais, causando graves aumentos de preços, restringindo o acesso humanitário e provocando deslocações em grande escala.
A economia do Sudão é altamente dependente do setor agrícola, com cerca de 65% da sua população envolvida na agricultura, de acordo com a FAO.
Contudo, devido ao conflito, a produção nacional de cereais caiu quase pela metade desde o ano passado e a oferta de alimentos de origem animal, como o leite, caiu drasticamente, contribuindo para níveis crescentes de subnutrição, destacou a diretora de Operações e Advocacia do Escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), Edem Wosornu.
As áreas com conflitos ativos registam as populações com maior insegurança alimentar.
Quase nove em cada dez pessoas que enfrentam insegurança alimentar de emergência no Sudão estão em focos de conflito na região de Darfur e Kordofan, assim como nos estados de Cartum e Al Jazirah.
Com mais de oito milhões de pessoas deslocadas, o Sudão vive a maior crise de deslocados do mundo, segundo as Nações Unidas.
Com esta combinação de fatores, Edem Wosornu e o diretor de Operações do Programa Alimentar Mundial (PAM), Carl Skau, alertaram que o Sudão está a caminho de se tornar a pior crise de fome do mundo, com 18 milhões de pessoas — mais de um terço da população do país — a enfrentar insegurança alimentar aguda, num momento em que o conflito fez subir os preços dos produtos alimentares básicos em “impressionantes 83%” em comparação com o período pré-crise.
“O Sudão é um dos piores desastres humanitários da memória recente”, declarou Wosornu, acrescentando: “estamos a falhar com o povo sudanês”.
“A subnutrição está a atingir níveis alarmantes e já está a ceifar a vida de crianças. Uma avaliação recente revelou que uma criança morre a cada duas horas no campo de Zamzam, em El Fasher, no norte de Darfur”, lamentou ainda, frisando que, nos próximos meses, cerca de 222 mil crianças poderão morrer de subnutrição na região.
Face a esta situação, a representante do OCHA recomendou medidas urgentes a serem adotadas para enfrentar a crescente crise de insegurança alimentar, como o respeito pelo direito humanitário internacional pelas partes em conflito, o aumento do financiamento para a operação humanitária, e um cessar-fogo imediato.
O Sudão tem lutado com as devastadoras consequências políticas, de segurança e humanitárias dos combates que eclodiram em 15 de abril em Cartum e arredores, na sequência de divergências entre o exército e as Forças de Apoio Rápido (RSF) sobre a integração deste grupo paramilitar nas forças armadas, o que fez descarrilar o processo de transição que se seguiu ao derrube do antigo Presidente, Omar Hassan al-Bashir, após 30 anos no poder.
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