Em declarações à imprensa após uma reunião de ministros das Finanças da União Europeia (Conselho Ecofin), Fernando Medina adiantou que a resposta da UE à Lei de Redução da Inflação adotada pelos norte-americanos mereceu hoje uma discussão intensa entre os 27, tendo a posição de Portugal sido “muito clara”, ao defender que uma alteração ao regime de ajudas estatais deve forçosamente ser acompanhada de decisões ao nível do seu financiamento.
“A dificuldade e a preocupação que nós temos com o tema dos auxílios de Estado e com a alteração simples dos critérios dos auxílios de Estado é porque se essas alterações forem feitas só nessas áreas, corre-se obviamente o risco, que é real — mais do que um risco será uma certeza — de desequilibrarmos no fundo o que é o funcionamento do mercado interno da UE, isto é, prejudicarmos os países que são mais pequenos e que têm menos capacidade orçamental”, começou por dizer.
O ministro sublinhou que, nesse caso, “só os países mais ricos terão capacidade financeira, só por si, para poder apoiar mais determinado tipo de indústrias e determinado tipo de atividades”, replicando-se o sucedido com os subsídios excecionais autorizados na Europa desde o início da pandemia da covid-19, quando as duas maiores economias, Alemanha e França, representaram praticamente 80% das ajudas estatais concedidas.
“E, por essa razão, sublinhamos que, neste desenho de resposta ao programa norte-americano, a discussão das mudanças de patamares nas ajudas de Estado tem de vir par a par com o financiamento. Isto é, nós não podemos só dizer ‘bom, agora podemos dar mais apoios à industria e à economia’, sem ter o que é um pacote de financiamento e verbas de financiamento que permitam estado de igualdade dentro do espaço europeu”, disse.
“Senão — prosseguiu Fernando Medina — nós, para resolvermos um problema de desequilíbrio na relação com os norte-americanos, criamos um problema ainda mais sério, que é um problema de desequilíbrio maior no espaço da UE”, salientou.
O ministro adiantou que, na sua intervenção na reunião, expressou de forma “muito clara” a posição de Portugal, no sentido de que “os dois temas têm de andar a par”.
“Vamos discutir, sim, alterações aos auxílios de Estado, estamos disponíveis para isso. Mas é preciso discutir também as condições de financiamento desses auxílios”, reforçou.
Questionado sobre a eventual criação de um fundo soberano europeu, Medina escusou-se a pronunciar-se relativamente a “uma ideia sobre a qual temos ainda pouco detalhes”, mas considerando evidente que a resposta da UE aos Estados Unidos a nível de financiamento da transição verde “não pode ficar só nos orçamentos nacionais”.
“Agora, tem de ser feita através de mecanismos que assegurem essa igualdade de tratamento dentro do espaço europeu”, insistiu, apontando, a título de exemplo, que um instrumento comunitário ao qual não possam aceder as pequenas e médias empresas (PME) ou não contemple a “valorização de tecnologias ou indústrias em desenvolvimentos em determinados países”, pode “acabar por se dirigir fundamentalmente aos países do centro, mais industrializados, e não assegurar as condições de igualdade” no mercado interno.
“A ideia é boa, o conceito é bom, vai na direção certa. Agora, precisamos de trabalhar nos seus detalhes, conhecê-los, e participar na definição dos seus detalhes”, disse, reiterando que a UE não pode perder a ‘corrida’ para os Estados Unidos, “mas os países mais pequenos [da UE] não podem perder para os países maiores, numa competição interna que não faria nenhum sentido abrir ou acentuar mais neste momento”.
Hoje mesmo, discursando no Fórum Económico de Davos, na Suíça, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou que Bruxelas vai propor uma adaptação temporária das regras das ajudas de Estado e avançar com um fundo soberano europeu para manter a atratividade da indústria europeia.
Discursando na 53.ª reunião anual do Fórum Económico Mundial, em Davos, na Suíça, Ursula von der Leyen dedicou grande parte da sua intervenção à “transição verde” rumo a uma economia neutra em carbono, fazendo um balanço dos esforços que as grandes economias mundiais estão a fazer a nível de investimento em tecnologias limpas, e assumiu a preocupação na Europa com o plano de subvenções norte-americano, no montante de 369 mil milhões de dólares.
“Vamos propor a adaptação temporária das nossas regras em matéria de auxílios estatais, para acelerar e simplificar as coisas. Os cálculos serão mais fáceis. Os procedimentos serão mais simples. As aprovações serão mais rápidas. Por exemplo, ofereceremos modelos simples de benefícios fiscais, assim como apoios direcionados para instalações de produção dentro de cadeias de valor de tecnologias limpas, para contrariar os riscos de deslocalização ligados a subsídios concedidos fora da União”, adiantou.
A presidente da Comissão prosseguiu afirmando-se consciente de que “as ajudas estatais serão apenas uma solução limitada, que apenas alguns Estados-membros poderão utilizar”, pois nem todos os países dispõem da mesma margem orçamental para ajudar as suas empresas, uma questão que tem suscitado preocupação entre muitos países da UE, que receiam uma distorção cada vez maior dentro do mercado único, face ao poderio económico de Alemanha e França.
“Se quisermos evitar um efeito de fragmentação do mercado único e apoiar a transição para tecnologias limpas em toda a União, precisamos também de aumentar o financiamento da UE. A médio prazo, estabeleceremos um fundo soberano europeu, como parte da revisão intercalar do nosso orçamento [plurianual] no final deste ano”, revelou então.
Segundo Von der Leyen, “esta é uma solução estrutural que irá aumentar os recursos disponíveis para a investigação, inovação e projetos industriais estratégicos que são essenciais para alcançar o objetivo de emissões zero”.
“Mas como isto levará tempo, procuraremos uma solução transitória para fornecer apoio rápido e direcionado, onde for mais necessário. Para este fim, estamos atualmente a trabalhar arduamente numa avaliação das necessidades”, disse.
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