As crianças nascidas em 2021 poderão vir a enfrentar consequências cataclísmicas provocadas pelo aquecimento global quando tiverem 30 anos, ou mesmo antes, caso a humanidade não adote medidas urgentes para combater as alterações climáticas, alertam peritos da ONU.
“O pior ainda está para vir, e afetará a vida dos nossos filhos e netos, muito mais do que a nossa”, aponta o relatório provisório do Painel Intergovernamental de Especialistas sobre a Evolução do Clima (IPCC, na sigla em inglês), citado pela agência de notícias France-Presse (AFP).
De acordo com o documento, um aquecimento global acima do limiar de 1,5 ºC (graus centígrados), fixado pelo acordo de Paris, teria “impactos irreversíveis para os sistemas humanos e ecológicos”, com os peritos a frisarem que a sobrevivência da humanidade pode estar ameaçada.
“A vida na Terra pode recuperar das grandes alterações climáticas, evoluindo para novas espécies e criando novos ecossistemas. A humanidade não pode”, sublinha o resumo técnico de 137 páginas do relatório, de quatro mil.
Com as temperaturas médias a subirem 1,1 °C desde meados do século XIX, os efeitos no planeta já são graves e tornar-se-ão cada vez mais violentos, ainda que as emissões de dióxido de carbono (CO2) venham a ser reduzidas, alertam os peritos.
Falta de água, fome, incêndios e êxodo em massa são alguns dos perigos destacados pelos peritos da ONU.
Pelo menos 420 milhões de pessoas enfrentarão “ondas de calor extremo” se o aquecimento global atingir mais 2 °C, em vez de mais 1,5 °C, advertem os peritos climáticos do IPCC.
Além disso, mais 80 milhões de pessoas em todo o mundo poderão vir a ser ameaçadas pela fome e 130 milhões poderão cair em pobreza extrema dentro de uma década, acrescentam.
Para alguns animais e espécies vegetais pode ser já demasiado tarde.
“Mesmo a +1,5 °C, as condições de vida mudarão para além da capacidade de adaptação de alguns organismos”, pode ler-se no projeto de relatório, citando os recifes de coral, dos quais dependem quinhentos milhões de pessoas.
O aquecimento global também deverá levar ao agravamento de doenças e epidemias. Até 2050, metade dos habitantes do planeta poderão estar expostos a doenças como a dengue, a febre amarela ou o vírus Zika.
As doenças ligadas aos níveis de ozono na atmosfera, devido às vagas de calor, também vão “aumentar substancialmente”, afirmam.
Os especialistas do IPCC antecipam por isso pressões nos sistemas de saúde semelhantes às causadas pela pandemia do novo coronavírus.
O relatório de avaliação global dos impactos do aquecimento, criado para apoiar decisões políticas, é muito mais alarmante que o antecessor, divulgado em 2018.
O documento deverá ser publicado em fevereiro de 2022, após a aprovação pelos 195 Estados-membros da ONU e depois da conferência climática COP26, marcada para novembro, em Glasgow, na Escócia.
Prevista originalmente para novembro de 2020, a 26.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP26), com líderes de 196 países, empresas e especialistas, foi adiada devido à pandemia.
Ao assinar o Acordo de Paris em 2015, os líderes mundiais comprometeram-se a limitar o aquecimento a +2 °C, comparativamente aos valores na era pré-industrial, se possível a +1,5 °C.
No entanto, de acordo com o projeto de relatório do IPCC, exceder +1,5 °C já poderia levar a consequências progressivamente graves, “por vezes irreversíveis”.
Segundo a Organização Meteorológica Mundial, a probabilidade de o limiar de +1,5 °C ser ultrapassado já em 2025 é de 40%.
Apesar das conclusões alarmantes, o relatório também oferece uma nota de esperança.
De acordo com os peritos da ONU, a humanidade ainda pode garantir um futuro melhor, mas para isso será necessário adotar já hoje medidas drásticas para travar as alterações climáticas.
“Precisamos de uma transformação radical dos processos e comportamentos a todos os níveis. Temos de redefinir o nosso modo de vida e de consumo”, defendem os peritos.
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