O caso dos cabeleireiros na Alemanha tomou tais proporções que, há pouco mais de um mês, a Federação Alemã de Futebol recebeu mesmo um protesto um pouco inusitado. Foi quando a Associação Alemã de Cabeleireiros questionou a entidade depois de os jogadores da liga nacional terem entrado em campo com novos cortes de cabelo, apesar do encerramento decretado para todas as atividades não essenciais, desde meados de dezembro. Nessa carta aberta, a associação pedia mesmo que aquele órgão desportivo demonstrasse a sua “solidariedade em tempos como este” e que “desse o exemplo”.
“Nos últimos dias, percebemos, com grande espanto, que a grande maioria dos jogadores profissionais entrou em campo com novos cortes de cabelo”, escreveu a associação representante do setor, citada pela Deutsche Welle – argumentando ainda que os estilos de cabelo vistos em campo, “com cortes laterais e milimétricos”, só poderiam ter sido feitos por” um cabeleireiro profissional” e com “equipamento adequado”. O que queria dizer que havia quem estivesse a furar o confinamento decretado para atender as demandas dos jogadores – enquanto outros estavam perto da falência. Daí, fazia ainda notar a associação, o enorme descontentamento com os profissionais de futebol por estarem a contribuír para que muitos profissionais fossem chamados a casas particulares para trabalhar, violando as regras instituídas.
Mas não só, como se sublinha ainda na The Economist: afinal, era também do conhecimento comum que havia quem viajasse até ao vizinho Luxemburgo – onde não havia esta proibição – para cortar o cabelo. Assim, desde o início da semana que há toda uma nova agitação no País: além das creches e do pré-escolar, os cabeleireiros também estão de novo de porta aberta.
São qualquer coisa como 80 mil salões que estão agora autorizados a abrir, decisão que, ainda assim, conheceu alguma contestação de outros setores, o que levou o primeiro-ministro da Baviera, Markus Söder, a dar o assunto por terminado depois de argumentar que esta reabertura também tem “algo a ver com a dignidade”.
Relevância social
Foi ainda antes do Natal que a Alemanha decretou o confinamento generalizado, no qual incluiu os cabeleireiros. Durante estes mais de dois meses, alguns ainda voltaram aos tutoriais online da primeira vaga, na primavera passada, mas muitos outros optaram por soluções mais radicais – como atravessar a fronteira ou receber apoio em casa.
Frauke, uma das cabeleireiras que entrou na clandestinidade, acabou por reconhecer à The Economis que há algum tempo que visitava discretamente vários dos seus clientes. “A fadiga da pandemia instalou-se, é o que é”, justificou – assumindo que, há um ano, quase toda a freguesia habitual cancelara qualquer intervenção sua e agora havia uns bons 80 por cento que estavam dispostos a pagar uma multa para manter um corte de cabelo decente.
“Até os velhos homens brancos que governam o país se cansaram de parecer desalinhados”, ironizou Frauke – e isto já depois de Angela Merkel, a chanceler do país, ter reconhecido que procurava “conviver pacificamente” com a sua cabeleira “cada vez mais cinzenta”, embora esperasse “ansiosamente” que os cabeleireiros abrissem de novo. Jörg Müller da Associação Central do Comércio Alemão de Cabeleireiro, remataria o assunto: “É que a nossa profissão tem relevância social”.