Há vários dias que não se sabe nada de Shen Wei, o sem abrigo de 52 anos que, de repente, se tornou famoso devido às palavras filosóficas que proferia nas ruas de Pudong, em Xangai. O chinês citava filósofos como Aristóteles, Confúcio e Dante, de forma tão eloquente como inspiradora, e não tardou a captar a atenção de quem passava por ele.
Várias pessoas começaram a filmar as suas performances em direto, partilhando vídeos seus de alguns segundos em várias redes sociais, incluindo na Douyin, uma plataforma de vídeos curtos, que foram vistos por milhões de utilizadores.
Shen Wei, com cabelos e barba grandes e despenteados e roupa rota, rapidamente se tornou um símbolo da crítica a um país onde se preconiza e enaltece a juventude, a aparência e a riqueza.
Em três meses, Shen Wei já era conhecido por “Master Shen” na China, mas confessou não estar feliz com toda a fama que tinha conseguido em tão pouco tempo. “A internet não me trouxe nada mais do que problemas”, contou Shen a jornais chineses no fim de março.
Isto porque, num dos vídeos partilhados nas redes sociais, a localização do chinês foi partilhada e várias pessoas inundaram a rua onde se encontrava para ouvirem as suas declamações. E não foram apenas curiosos que queriam filmá-lo a partir do melhor plano, como também vários profissionais de marketing que lhe propuseram recompensas altíssimas em troca de algum tipo de apoio comercial.
Assim que acordava e saía do seu abrigo, conta o chinês, tinha dezenas de pessoas à sua espera para o fotografar e filmar, esperando mais uma citação memorável. Durante vários dias, Shen Wei foi líder de pesquisa em várias plataformas de vídeos curtos como o Weibo (o Twitter chinês), assim como no motor de busca chinês Baidu. Além disso, vários jornais e canais de televisão também começaram a procurá-lo.
O sem abrigo rapidamente percebeu que estava a ser usado. Uma mulher que fingiu ser a sua namorada arrecadou quase meio milhão de seguidores no TikTok, quatro dias depois de ter criado uma conta. Também um rapaz desempregado que afirmava ser filho de Shen foi convidado para falar em vários canais de transmissão de vídeos em direto.
Mas o fenómeno não fica por aqui: houve até quem vendesse um pedaço de papel com palavras escritas pelo chinês por 13 mil dólares num leilão online. “Eu sei que as pessoas me estão a tratar como um macaco”, desabafou. “Ninguém veio ver-me sem intenções, mas sim por dinheiro.”
De acordo com o Chengdu Economic Daily, Shen Wei foi criado em Xangai e cresceu no seio de uma família relativamente abastada. Foi para a universidade e ainda trabalhou em auditoria num escritório na cidade.
Em 1993, foi obrigado a reformar-se precocemente devido ao seus “comportamentos anormais” que incluíam a reutilização de papéis que tinham sido colocados no caixote do lixo, contou o sem abrigo à revista Meiri Renwu. Depois disso, foi hospitalizado duas vezes e, em 1995, decidiu começar a viver na rua.
“Estava destinado a ser um colecionador de lixo”, contou Shen. “Eu admiro Gandhi e quero viver uma vida ascética como ele.”
A quantidade de pessoas que se deslocaram até à rua onde passou a viver começou a ser tanta que a polícia isolou a área à volta do local, colocando mesmo cercas de madeira.
No início deste mês, o seu abrigo ficou vazio e os fãs tinham uma mensagem à sua espera. “Shen está exausto, tanto emocional como fisicamente, e estará ausente por um tempo. Obrigado”. A última vez que foi visto, estava com o cabelo cortado e tinha tomado banho. De fato preto, foi escoltado até um carro e preto e disse a um fã que ia procurar refúgio.