Quando um dia um jovem jornalista perguntou ao antigo primeiro-ministro britânico o que poderia ter feito o governo mudar a sua política, Harold McMillan (1894-1986) terá respondido: “Os acontecimentos, meu rapaz, os acontecimentos”.
Os acontecimentos também parecem ter feito descarrilar muita da estratégia de campanha dos Republicanos e dos Democratas, nas eleições intercalares dos Estados Unidos da América (EUA) em que os eleitores serão chamados para escolher congressistas, senadores e governadores em 36 Estados.
O tiroteio que fez 11 vítimas mortais numa sinagoga em Pittsburgh, cartas com dispositivos explosivos enviados para figuras do Partido Democrata, uma caravana de refugiados vindos da América Central ou o romper de um tratado nuclear que tinha ajudado a por fim à Guerra Fria foram acontecimentos que contaminaram a campanha eleitoral e relegaram para segundo plano as ideias de alguns candidatos.
Contudo, a reforma do sistema Obamacare, os cortes fiscais, as medidas protecionistas na área comercial, ou as questões de imigração são temas que estiveram presentes na campanha e mostraram as posições radicalmente diferentes que separam o Partido Republicanos e o Partido Democrata.
Estas eleições são particularmente importantes porque podem permitir uma alteração radical de forças entre os dois partidos no Capitólio.
Neste momento, os Republicanos controlam o Congresso e o Senado, com uma margem confortável na câmara baixa (235 congressistas contra 193 congressistas Democratas) e com uma margem curta a câmara alta (51 contra 47 senadores Democratas e dois independentes).
Mas as sondagens indicam que o Partido Democrata deverá recuperar o controlo do Congresso, bem como ganhar entre seis e dez governos estaduais, apesar de não conseguir eliminar o controlo Republicano do Senado.
A maioria no Congresso permitirá aos Democratas procurar dificultar a vida política de Donald Trump, podendo, por exemplo, iniciar um processo de ‘impeachment’, por suspeitas de conluio com uma alegada interferência russas nas eleições presidenciais e obstrução à justiça, ou obstaculizar a agenda legislativa Republicana, em particular na área fiscal.
Ainda assim, se os Republicanos mantiverem a maioria no Senado (como indicam as sondagens), a influência Democrata será sempre limitada e circunscrita a um mais aceso debate político.
Mas os assessores de Donald Trump mostram-se sobretudo preocupados com os sinais de desgaste da popularidade do presidente e com a perda de uma parte importante da sua base de apoio, essencial para acalentar as ambições de uma reeleição, dentro de dois anos.
E esses sinais são resultado de vários índices, como aqueles que revelam uma alteração no perfil do eleitor, como a disposição de um maior número de jovens para ir votar (duplicando a percentagem de 20%, em 2014, para 40%, este ano, dos eleitores entre os 18 e os 29 anos com intenção de fazer uma escolha), ou a expectativa de cerca de oito milhões de eleitores hispânicos acorrerem às urnas (mais 15% do que nas eleições intercalares de 2014).
A alteração no perfil do eleitor pode também corresponder a modificações no perfil dos representantes, nas eleições de terça-feira, com candidatos que podem fazer história em vários círculos, por serem os primeiros negros, ou as primeiras mulheres, ou os primeiros políticos assumidamente homossexuais a exercerem cargos em determinados lugares.
Algumas corridas eleitorais – na Florida, na Califórnia, no Wisconsin ou no Texas, entre outras — revestem-se de especial interesse político, pelo significado que lhes é atribuído relativamente à perceção que os americanos têm da Presidência de Donald Trump, mas também pela abordagem que o eleitorado faz de alguns dos temas centrais da vida nos EUA.
com Lusa