Há coisas que não se explicam pela razão. Só mesmo pela emoção. A ilha do Príncipe é uma delas. Quando sobrevoamos o Atlântico, a 400 quilómetros de distância da costa mais esquecida de África e a quase 200 quilómetros de São Tomé, é impossível evitar um arrepio, ao vê-la emergir do oceano: uma silhueta de “mundo perdido”, de picos íngremes, enseadas selvagens e um imenso verde que quase se mistura com o azul do mar.
A emoção prolonga-se depois, já em terra, quando confirmamos, entre a floresta cerrada e a simpatia natural das suas gentes, que estamos num “pequeno mundo” único no nosso planeta. E essa é uma sensação capaz de despertar uma torrente de pensamentos, alimentar grandes sonhos e até transformar pessoas. Só tudo isto pode explicar, de facto, que um milionário sul-africano, depois de lá ter aterrado no seu jato particular, tenha decidido gastar ali uma parte considerável da sua fortuna, sem a preocupação de multiplicar rapidamente o dinheiro investido ou sequer de o recuperar na totalidade. Mas, no fundo, com um objetivo secreto: o de poder provar que a sua emoção está carregada de… razão.
Arriscar no impossível
Mark Shuttleworth tem 40 anos e, diz quem o conhece, é um homem de personalidade forte, com uma capacidade de trabalho inesgotável e uma história de vida marcada pelo desafio de lutar por objetivos que outros consideravam impossíveis. Aos 22 anos, ainda estudante de Economia na Universidade da Cidade do Cabo, mas já um maníaco da informática e dos computadores, tentou a sorte no emergente negócio da internet. Montou uma empresa na garagem da casa dos pais, na ponta sul do continente africano – aparentemente o lugar mais improvável para se ter êxito num setor então confinado a Silicon Valley, na Califórnia. E investiu toda a energia num nicho de mercado, inexplorado: a segurança do comércio eletrónico, os certificados de identidade e a assinatura digital. Em 1999, apenas quatro anos depois, provou que a aposta fora vencida: vendeu a Thawte, a sua empresa (e as suas patentes), ao gigante VeriSign (de Silicon Valley, claro…) e passou a ser considerado, oficialmente, milionário. Contas feitas, após distribuir 150 mil euros de prémio por cada um dos seus 50 funcionários, Mark Shuttleworth passou a deter uma fortuna pessoal superior a 500 milhões de euros. Em dinheiro vivo, resistente aos humores bolsistas.
Com esse dinheiro, aquele a quem chegaram a chamar o “Bill Gates sul-africano” fundou uma empresa de investimento, HBD, vocacionada para a inovação e as start-ups tecnológicas. Depois, criou uma fundação, com o seu nome, destinada a promover a educação, o acesso às tecnologias de informação e o financiamento de projetos de transformação social. E finalmente, lançou-se, com espírito militante e quase guerreiro, no desenvolvimento de um sistema operativo, o Ubuntu, que pretende ser um concorrente direto do Windows, da Microsoft, e do iOS, da Apple (mais um objetivo aparentemente impossível…), mas com uma particularidade relevante: é software livre e grátis (“É preciso mudar o mundo e todas as pessoas têm de ter acesso à tecnologia para o mudar”, acredita). Atualmente, o Ubuntu já é usado por mais de 20 milhões de pessoas, quase todas programadoras e gestoras de data centers. Mas esse número pode crescer rapidamente, ainda este ano, quando forem postos à venda os primeiros tablets e smartphones equipados com o sistema. Uma pequena parte da fortuna de Shuttleworth foi, no entanto, gasta para satisfazer um capricho pessoal, à medida de um fanático admirador da série Star Wars (Guerra das Estrelas). Mark pegou em 20 milhões de euros (vendo bem, não é extravagância alguma: é-se tão rico com 500 milhões como com 480 milhões…) e “comprou” um lugar na nave Soyuz TM-34 que, em 2002 – tinha ele 29 anos – o levou para fora da atmosfera terrestre e a passar nove dias a bordo da Estação Espacial Internacional, onde, a seu pedido, e após quase um ano de treino na Cidade das Estrelas russa, desenvolveu atividades científicas, como os outros astronautas, relacionadas com o vírus HIV e o genoma humano. Foi a emoção dessa experiência como segundo turista espacial da história – e o primeiro “afronauta”, como lhe chamou, numa emocionada chamada telefónica para o espaço, o seu amigo Nelson Mandela – que acabou por lhe dar uma nova razão para a vida… e mais outro objetivo aparentemente impossível.
“No espaço, ele tomou verdadeira consciência de como a Terra é pequena e frágil. Viu o impacto da intervenção humana no planeta, com uma dimensão que não pensava ser possível. A partir desse momento, sentiu que tinha de agir, demonstrar que se pode criar riqueza sem destruir a natureza”, explica Nuno Rodrigues, 36 anos, o jurista de formação que Mark Shuttherworld escolheu para dirigir a HBD-STP, o grupo empresarial a quem confiou a tarefa de concretizar essa sua visão.
Selvagem e intocado
O cenário que Nuno elege para me contar esse episódio não pode ser mais emblemático do projeto que tem entre mãos. Estamos numa pequena lancha a motor, a baloiçar suavemente junto à costa da ilha do Príncipe. E o que vemos à nossa frente, embora de ângulo diferente, é exatamente aquilo que nos despertou a emoção quando o observámos do ar, do avião: a sensação de descoberta de uma ilha perdida, no meio do Atlântico, ainda intocada e selvagem. Bordejamos pequenos cabos e enseadas e aproximamo-nos, uma e outra vez, de praias virgens, com areia branca luminosa e águas azul turquesa. Olhamos para o mar e distinguimos, nitidamente, o fundo. Erguemos os olhos para terra e apenas vemos floresta tropical, impenetrável, a cobrir vales e montanhas por igual – um imenso e denso verde a forrar a geologia vulcânica da ilha, com picos íngremes e desfiladeiros abruptos. O que vemos hoje, com exceção de algumas casas de pescadores, é exatamente o mesmo que viram os navegadores portugueses, quando a “descobriram” há mais de 500 anos (17 de janeiro de 1471): a natureza em estado puro. Uma raridade. Mark Shuttleworth também viu o mesmo, em 2009, ao aterrar com o seu jato particular no Príncipe, na época em que procurava uma ilha selvagem para concretizar o seu sonho. Foi aí que a emoção se aliou à razão: para além da beleza natural, ele apaixonou-se por uma população com características únicas, que embora viva no interior de um paraíso intocado, não tira outro benefício dele que não seja o de garantir facilmente a sua subsistência, graças a uma terra onde tudo cresce e a um mar repleto de vida. Apesar da forte natalidade, a população (quase toda ela descendente de antigos escravos de Angola e Cabo Verde) diminuía todos os anos, com as pessoas a procurarem um futuro melhor em São Tomé ou noutros países. Uma população oprimida por uma dupla insularidade (só há um voo diário entre as duas ilhas da segunda mais pequena nação de África, e num avião com apenas 18 lugares!), com a taxa de desemprego mais alta do país, onde o único hospital não tem uma máquina de raios-X, a gravidez na adolescência é encarada como normal, e o ordenado médio não ultrapassa os 40 euros mensais. “Esta era uma terra sem esperança”, sintetiza, de forma crua e emocionada, Tozé Cassandra, quando o encontro no seu gabinete de presidente do Governo Regional do Príncipe, que ocupa, desde 2007, há dois mandatos consecutivos, sempre com maiorias absolutas.
E foi nesse mesmo gabinete – sempre às escuras, durante parte da tarde, como toda a ilha, por causa do racionamento de eletricidade, que está dependente do diesel que chega (ou não…) de barco para alimentar a sua única central de energia… – que Cassandra conheceu Mark Shuttleworth, quando o sul-africano lhe veio manifestar, em 2009, o interesse em investir no Príncipe, embora com uma condição prévia: queria, primeiro, conhecer os planos do Governo para o território. “Contei-lhe que estávamos a candidatar o Príncipe a reserva da Biosfera, da Unesco, e expliquei-lhe a nossa visão de um desenvolvimento baseado na conservação da natureza, e a sua resposta foi elucidativa: ‘Presidente Cassandra, é este o projeto de que ando à procura'”, recorda, com uma entoação dramática, como quem quer dar um toque de solenidade ao momento em que, na sua opinião, o destino da sua terra começou a mudar (ver entrevista).
“A ideia do Mark não era apenas comprar uma ilha. Isso podia ele fazer em qualquer parte do mundo”, obserav Nuno Rodrigues, procurando sublinhar a originalidade do projeto em curso. Até porque Mark Shuttleworth, já o sabemos, é um homem determinado, tão determinado que até tomou a decisão – irreversível! – de nunca ter filhos. E esse é um facto relevante para esta história: “Como não deixará descendência nem herdeiros, o que ele quer mesmo é deixar aqui um legado. Está disponível para investir milhões só para provar que é possível montar um modelo de desenvolvimento sustentável que, daqui a alguns anos, poderá continuar a funcionar, mesmo que ele desapareça.”
Riscos e desafios
O projeto de Shuttleworth assenta numa ideia essencial e aparentemente simples: transformar o Príncipe num destino turístico de eleição, graças à sua natureza única, capaz de atrair visitantes com dinheiro e, com isso, gerar uma riqueza e desenvolvimento que beneficie toda a população. No seu plano, isso é feito com meia dúzia de empreendimentos turísticos, perfeitamente integrados na biosfera local, e com não mais de 100 quartos no total. E, em simultâneo, trabalhar o ordenamento do território, as possibilidades agrícolas e a requalificação das pessoas, de forma a criar uma “marca Príncipe”, que possa ser reconhecida internacionalmente. Se a ideia é simples, já a sua concretização é de uma complexidade extraordinária, com questões de difícil solução: Como desenvolver sem estragar? Como evitar a ganância e a sede do lucro imediato? Como conseguir concretizar uma ideia, aparentemente utópica, numa ilha sem infraestruturas básicas, onde é preciso importar quase tudo? Todas essas perguntas passaram pela cabeça de Nuno Rodrigues quando foi convidado, em 2011, para liderar a equipa que iria operar essa transformação da ilha. À partida, tendo em conta o perfil de Mark Shuttleworth, nada induzia que fosse ele a pessoa indicada para essa tarefa: a sua única preocupação ambiental tinha sido, na juventude, a vivência surfista (“Não estraguem as ondas!…”), e pouco mais. De resto, limitou-se ao percurso de um estudante normal, com o ensino básico e secundário cumpridos nos Salesianos, em Lisboa, e uma licenciatura em Direito, na Universidade Católica, em que descobriu, no entanto, como podia ser determinado a cumprir objetivos, mesmo aqueles que pareciam impossíveis: “Quando, após dois anos de ‘balda’ completa, percebi que precisava de me concentrar para acabar o curso com uma média de 14 valores, mudei de atitude e consegui aquilo que queria”, recorda. Depois de várias experiências profissionais, que incluem a passagem como consultor na Deloitte e a publicação de um livro sobre Direito Comercial (“que já vi ser citado em acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça”, sublinha), Nuno acaba por ser contratado para a sociedade de advogados Cuatrecasas. É aí que, um dia, em 2010, lhe aparece um cliente a pedir ajuda jurídica para comprar propriedades na ilha mais pequena de uma ex-colónia portuguesa: São Tomé e Príncipe. Inicia-se então a sua relação com a equipa de Mark Shuttleworth, ainda sem saber quem era o sul-africano ou a dimensão da sua fortuna.
“Mais tarde, numa noite de janeiro de 2011, estou em casa ligado ao Facebook, e a Julie Fourie, uma das colaboradoras mais próximas do Mark, entra na rede, começa a falar comigo e sonda-me para liderar o projeto no Príncipe, dando-me conta da sua preocupação pelo facto de as coisas não estarem a avançar com a velocidade que eles desejavam”, conta.
“O desafio era irresistível”, recorda. “Tinha a oportunidade de gerir uma grande empresa, trabalhar com alguém tão genial como o Mark e num projeto inovador a nível mundial. Só um estúpido diria que não.” A sua determinação em cumprir objetivos revela-se rapidamente: a 4 de fevereiro de 2011, assume o cargo de CEO do grupo HBD-STP e, em apenas cinco dias, consegue desbloquear todos os problemas que impediam a assinatura dos contratos no Príncipe, referentes às concessões dos locais desejados por Shuttleworth. “Nessa altura, o Mark deu-me os parabéns e disse-me que tinha posto a fasquia muito alta para os portugueses. Só que agora vinha a parte mais difícil: transformar aquilo que era uma start-up numa empresa que, rapidamente, passaria a ter 400 empregados. Era preciso construir uma estrutura de liderança em tempo recorde.” Objetivo ultrapassado.
Para concretizar o sonho de Shuttleworth, Nuno tem duas instruções básicas: “A primeira é que não pagamos ‘luvas’ e todo o dinheiro que gastamos está documentado ao cêntimo. A segunda é que não admitimos qualquer tipo de descriminação, de raça, sexo ou outra – e já despedimos pessoas por causa disso!”
“O Mark quer provar que se pode trabalhar em África seguindo as melhores regras internacionais, sem ser preciso ameaçar ou corromper”, diz Nuno. E enumera alguns exemplos dessas boas práticas: todos os projetos de construção foram precedidos de estudos de impacto ambiental (“com os critérios mais altos que existem, os do Banco Mundial”); só em imposto de sisa, por terrenos e concessões, já pagaram cerca de um milhão de euros (quatro vezes mais do que o montante transferido pelo Governo central de São Tomé, em 2013, para investimento público no Príncipe!). Os 400 funcionários da HBD (mais de um terço da força de trabalho da ilha) passaram a receber os ordenados por transferência bancária, com subsídios de férias e de Natal, contribuição para a Segurança Social, desconto para impostos, seguros de saúde, bónus anual e ainda dois dias obrigatórios de descanso semanal – o que está já a provocar uma reação por parte dos outros empregadores da ilha. É o mercado a chegar… E apesar do clima de parceria e cooperação, Nuno Rodrigues reconhece que têm existido choques com o Governo, que até já chegaram, numa disputa fiscal, à barra dos tribunais. “Mas isso é a expressão máxima da inexistência de corrupção e, em simultâneo, uma centelha forte de democracia. É assim que as coisas devem funcionar.”
Mudar mentalidades
Chegados a esta altura, a pergunta surge natural: será tudo isto bom de mais para ser verdade? Pode existir mesmo um plano assim, nos dias que correm? Gonçalo Parreira Neves, 47 anos, diretor financeiro do grupo HBD-STP, dá-me a resposta enquanto aguardamos o jantar, com música ao vivo, no restaurante da dona Rosita – uma novidade na noite da pacata cidade de Santo António, só possível agora com a chegada de duas dezenas de expatriados, numa população de 7 500 pessoas. Ele percebe a minha surpresa e desconfiança, até porque há vários anos que está habituado a analisar planos de negócios, a fazer contas a investimentos e a “esticar” margens de lucro. Por isso, a sua resposta é ainda mais desconcertante: “Nunca vi um projeto como este. Só para dar uma ideia, aqui todos os planos de negócios são feitos com um horizonte de 30 anos. Ou seja, ao contrário do que é habitual, aqui não se procuram dividendos rápidos e imediatos, nem taxas de rentabilidade de 20 ou 30 por cento… Aqui, estamos a falar de rentabilidade de 10%, daqui a 10 anos, e só nos hotéis. O investimento no aeroporto, por exemplo, nunca será recuperado. O importante mesmo é que, daqui a três décadas, tudo o que cá estiver seja sustentável e as pessoas que cá ficarem têm que ter capacidade para o gerir.”
Mas para que isso suceda é preciso que muita coisa aconteça, entretanto, no terreno. “É preciso, por exemplo, mudar a mentalidade dos habitantes da ilha”, diz, decidida, Ester Costa Alegre, 32 anos, mestre em Sociologia, uma das pessoas que melhor conhecem a realidade social das gentes do Príncipe, das poucas que entram em todas as casas, tratam as crianças pelo nome e sabem identificar as intricadas relações familiares da população masculina. “Esta é uma sociedade que foi habituada apenas a pedir, onde não existem valores de trabalho nem de ascensão social. São pessoas resignadas ao que têm e ao que lhes dão – como sucede, por exemplo, nas campanhas eleitorais, em que os candidatos distribuem dinheiro, às claras.”
Para contrariar esse estado de coisas, uma das ideias que Ester desenvolve, no seio deste projeto global, é uma escola de artesanato, como forma de levar as pessoas a ganhar orgulho nas suas tradições e ganharem dinheiro quando os turistas chegarem. “A população tem que saber agarrar o futuro.”
A tarefa de Manuel Gomes “Manu”, 35 anos, formado em Engenharia Ambiental e Recursos Naturais, na Universidade de Trás-os-Montes, vai no mesmo sentido: “Transmitir uma ética do trabalho. Em especial do trabalho bem feito, que é uma coisa que não existia na ilha.” Desde há dois anos, ele tem sido responsável por um dos projetos mais bem sucedidos nesta nova era do Príncipe: uma escola de pedreiros, na Roça Paciência, onde ensina duas dezenas de homens a erguer muros, com técnicas tradicionais, e com os necessários cálculos matemáticos para que tudo fique perfeito. Utilizando apenas material existente na ilha: o cimento não existe e a areia é retirada de desperdícios de construções antigas, para proteger as praias.
Manu é um dos portugueses mais populares no Príncipe. Integrou-se de tal maneira na comunidade local que até fala com o sotaque da ilha. Mas a sua missão está a terminar, uma vez que até alguns dos pedreiros que formou já foram contratados pela Mota & Engil para as obras da pista do aeroporto. “Eu estou de passagem, agora eles é que têm de agarrar o futuro”, diz, com visível orgulho, mas também com a emoção de quem reconhece que “deixar esta ilha é como deixar um filho”.
Sair da ilha é, por seu lado, o pior pesadelo da antropóloga Rita Alves, 32 anos. Chegou ao Príncipe há três anos e hoje, apesar do contraste do cabelo louro, da pele clara e dos olhos azuis, ninguém sente que ela seja “de fora”. Dedica os dias ao levantamento das tradições das várias comunidades e à recolha de todo o “ferro velho” das antigas roças, para um futuro museu – o primeiro da ilha.
“Apesar da escravatura e do peso negativo da sanzala, é preciso que as pessoas tenham orgulho no passado, nas suas raízes e nas suas tradições. É isso que também pode ajudar a quebrar o círculo vicioso em que vive”, diz-me, à boleia numa camioneta de caixa aberta, ao anoitecer, com a nossa conversa sempre a ser interrompida: todas as pessoas com que nos cruzamos gritam “Olá Rita” e ela a todos saúda com um aceno de mão. “Se isto não acontecesse ao fim de três anos seria por estar a fazer mal o meu trabalho”, sorri.
Adivinhar o futuro
É esta forma de interagir com as populações que Teresa Pires, 58 anos, diretora operacional da HBD-STP na ilha, mais aprecia e incentiva. Por uma razão simples, como explica: “Nós não podemos impor nada, esta terra não é nossa. Todas as modificações que quisermos introduzir, mesmo para lhes melhorar o nível de vida, têm que ser sempre muito bem explicadas à população, mostrando-lhes soluções alternativas e fazendo-os sentir parte do processo.”
Às vezes, quando olha para o plano geral e a forma de o executar, Nuno Rodrigues diz que se sente um pouco como se estivesse no computador, a jogar ao Sim City. “Mas com uma grande diferença: é que aqui todo o plano foi debatido com as pessoas e em função das características específicas do território”, ressalva.
Como é que tudo isto acabará, obviamente ninguém sabe. Nuno acredita que dentro de dez anos já se verá um Príncipe economicamente sustentável e com pleno emprego. E sente que a ideia que está ali a concretizar-se “pode ser transferida para outros sítios de África”, conforme o desejo já manifestado por especialistas do Banco Mundial. Mas é Mark Perkins, um engenheiro sul-africano, de 33 anos, que trabalha nas obras do aeroporto, que consegue resumir de forma lapidar as esperanças e as dificuldades deste projeto que quer ser um exemplo para o mundo: “Aqui no Príncipe, o impossível torna-se possível, mas o possível, às vezes, é impossível.” A Mark Shuttleworth, como se sabe, não o assustam os projetos impossíveis. Em especial aqueles em que emoção se confunde com razão. Assim isso seja possível.