“O plano deve ser afinado e expurgado de medidas irrealistas ou manifestamente nocivas”, afirma Rui Moreira na participação do município do Porto na consulta pública do programa Mais Habitação, que decorre até ao dia 13.
No documento, a que a Lusa teve hoje acesso, Rui Moreira defende que “boa parte” das medidas propostas é “irrealizável” e ficará “muito aquém dos resultados pretendidos”.
“Maior do que o risco de o pacote ser pouco consequente é o de as suas medidas mais estatizantes e centralistas terem efeitos gravosos para o problema da habitação em Portugal”, refere, dando o exemplo da proibição de novas licenças de Alojamento Local (AL), do arrendamento coercivo e do limite à atualização das rendas.
Considerando que “são de saudar” medidas como o apoio às rendas e crédito, ou o reforço dos incentivos fiscais para o arrendamento acessível, Rui Moreira diz, no entanto, que o Estado “está a ser demasiado voluntarista ao predispor-se a ser senhorio, fiador, credor, intermediário, cobrador e construtor”.
“Conhecidas que são as ineficiências administrativas e as carências financeiras do Estado, não é de crer que este tenha capacidade de tocar tantos instrumentos ao mesmo tempo”, afirma, criticando ainda o facto de as autarquias não terem sido auscultadas sobre o programa.
“Parece-nos igualmente insólito que, aos dias de hoje, os municípios tenham conhecimento do plano através tão só de um genérico ‘powerpoint’ e de declarações avulsas de responsáveis políticos à comunicação social”, refere, defendendo que no período de consulta pública se impunha que a informação sobre o plano “fosse já detalhada, sólida e estruturada”, e que tal “não acontece”.
Ainda assim, no documento são elencadas várias considerações e sugestões, fruto da audição, a 23 de fevereiro, do Conselho Municipal de Turismo e Economia.
Entre as considerações, Rui Moreira diz ser preciso aumentar oferta de casas “em todos os segmentos”, defendendo que a solução para a escassez e custo da habitação “não pode passar por moderar a procura”.
“Isso seria hipotecar a capacidade de atração das cidades e o crescimento económico promovido pelas atividades de elevado valor acrescentado, sem que o problema da falta de habitação a preços acessíveis fosse resolvido ou sequer mitigado. Era, perdoe-se a expressão, deitar fora o menino com a água do banho”, refere.
Em relação à habitação pública, Rui Moreira considera que o Estado tem de diversificar os investimentos sem “pruridos ideológicos” de alinhar estratégias com os privados, apostar de “forma intensiva” no arrendamento acessível e “generalizar” o direito de preferência, instrumento que defende que seja usado com “mais frequência” para garantir “transparência do mercado”, mas também aumentar o ‘stock’ de casas e acudir a inquilinos em situação de fragilidade.
O autarca defende ainda que a melhor forma de “reduzir os fogos vagos com propósitos especulativos” passa, não por colocar casas no mercado pela “usurpação do uso de propriedade privada”, mas pelo agravamento fiscal, aumentando o IMT e o IMI, imposto que, diz, poderia ser aplicado sobre os terrenos, penalizando os baldios das cidades.
Entre as várias sugestões, o autarca propõe que os municípios exerçam competências de intermediação entre os proprietários dos imóveis e os inquilinos, e que desenvolvam iniciativas de apoio à construção no modelo ‘build to rent’.
Quanto ao AL, Moreira considera “drástica e intempestiva” a proibição de novas licenças, defendendo que as residências universitárias poderiam ser um “ótimo meio para reduzir a pressão” sobre a habitação, uma vez que nos meses de verão estes imóveis poderiam “reforçar a oferta turística”.
O autarca diz também ser necessário rever o funcionamento dos vistos ‘gold’, defendendo que, “em vez da sua pura e simples eliminação, seria mais útil orientar a aprovação dos vistos ‘gold’ para investimentos que promovessem um número mínimo de alojamentos destinados a arrendamento acessível”.
O programa Mais Habitação foi aprovado em Conselho de Ministros e encontra-se em discussão pública até ao dia 13. As propostas voltarão a Conselho de Ministros para aprovação final, em 16 de março, e depois algumas medidas ainda terão de passar pela Assembleia da República.
SPC // JAP