É certo que as famílias portuguesas vão ficar mais pobres. Resta saber quão mais pobres. A taxa de inflação não dá tréguas e os seus efeitos devem fazer-se sentir, pelo menos, até ao final de 2023. Contas feitas, os portugueses preparam-se para perder o equivalente ao 14º mês em dois anos. Para quem ganha menos, a perda de um salário chega já em 2022. Portugal vive um ambiente confuso, em que as quebras de poder de compra convivem com crescimento económico. Uma bomba prestes a explodir ou um período difícil mas transitório?
Em junho, a inflação atingiu os 8,7%, um valor que não se registava desde o final de 1992. Neste mesmo mês, o FMI reviu as suas projeções anuais para a economia portuguesa, antecipando agora uma inflação de 6,1% este ano – a mais alta em quase três décadas – e 3,5% em 2023. A subida de preços é particularmente penalizadora para as famílias, ao afetar bens essenciais: custos com a habitação, que incluem as faturas de gás e eletricidade, alimentação e transportes. Um perfil que torna difícil ajustar os padrões de consumo e que penaliza, sobretudo, os portugueses com menos rendimentos. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), estas três categorias pesam, em média, 60% no total de gastos mensais das famílias. Entre os mais pobres, cujo rendimento líquido do agregado não vai além de 700 euros mensais, o peso sobe para 66%. Recorde-se que o impacto da inflação será tanto maior quanto mais alto for o peso destas despesas no orçamento. É a chamada “inflação pessoal”. Ora, na alimentação, a inflação homóloga de junho atingiu já os 13,2%; na habitação, 13,5%; e nos transportes segue em 14,3%.