A greve dos estivadores do Porto de Lisboa, que se arrasta desde 20 de abril, provocou até ao dia de hoje um prejuízo de 6,6 milhões de euros, segundo os cálculos da Associação dos Operadores do Porto de Lisboa. Cada um dos 22 dias de paragem representa uma perda de receita de 300 mil euros, valor no qual os empregadores baseiam o pedido indemnizatório que entregaram no tribunal. Entretanto, o Sindicato dos Estivadores dos Estivadores do Centro e Sul de Portugal entregou ontem à noite um novo pré-aviso que prolonga a paralisação até 16 de junho.
O que separa estivadores e operadores portuários é, de novo, a renegociação do contrato coletivo de trabalho. Para o sindicato, está em causa a manutenção do emprego dos cerca de 350 estivadores dos portos de Lisboa, Setúbal e Figueira da Foz e dos 127 temporários que formam a AETPL, uma “pool” que fornece mão de obra ocasional para o trabalho portuário. No pré-aviso de greve, os operadores portuários são acusados de promoverem a concorrência desleal ao recrutarem, fora da “pool”, trabalhadores temporários ”desnecessários ao setor”, pondo em causa a “estabilidade” e a “segurança no emprego”. É por isso que desde finais de abril recusam fazer horas extraordinárias e trabalhar aos fins de semana e feriados. O Governo tem estado o medear o conflito, através do Ministério do Mar, mas sem sucesso.
As paralisações do Porto de Lisboa não são uma novidade. Segundo a AGEPOR, que representa os agentes de navegação, nos últimos dez anos foram apresentados mais de cem pré-avisos de greve pelo Sindicato dos Estivadores, que domina o terceiro maior porto do País ancorado numa das maiores taxas de sindicalização do País. Em 2012, a greve prolongou-se durante seis meses, causou um prejuízo de 1,2 mil milhões de euros e meteu cenas de pancada frente à Assembleia da República, quando os deputados discutiam o novo regime do trabalho portuário. Grandes operadores mundiais, como a Maersk, suspenderam temporariamente a atividade na capital portuguesa, e as exportações ressentiram-se do protesto.
Corporativos e bem pagos
As reivindicações não mudaram muito desde 2012. Os estivadores continuam a ser acusados pelas empresas do setor de acumularem horas extraordinárias, de darem prioridade aos mais velhos (e mais bem pagos) no trabalho suplementar, de controlarem a distribuição do trabalho na “pool” e as entradas de novos trabalhadores nos portos, privilegiando filhos e amigos. Além disso, o porto de Lisboa tem a segunda melhor tabela salarial do País (a seguir a Sines), o que, somado às horas extra, às diuturnidades e aos subsídios pode facilmente duplicar o vencimento base. O salário médio de um estivador no topo da carreira ultrapassa facilmente os 4 mil euros brutos, embora o de um temporário, que ganha à hora ou ao turno, pode não exceder os €800.
Desta vez, o principal ponto de discórdia parece ser a Porlis, uma nova “pool” de trabalho temporário criada pelas empresas portuárias que a Mota-Engil vendeu recentemente ao grupo turco Yildim. Essa nova empresa é acusada de praticar salários mais baixos (de cerca de €500), para diminuir os custos da operação portuária, contribuindo para o “desequilibrio da estrutura de custos da AETPL, a “bolsa” de eventuais mais antiga que, em outubro, dispensou cerca de 50 trabalhadores, segundo explicou à VISÃO o presidente do sindicato, António Mariano. O objetivo do sindicato é agora o de conseguir a reintegração dessas pessoas, assim como a regularização dos salários que estão a ser pagos com atraso desde dezembro do ano passado.
Em janeiro, após um primeiro protesto, os estivadores chegaram a aprovar um acordo de paz social com os operadores que previa uma revisão das condições salariais (sem alterações desde 2010), das categorias e das funções profissionais e mudanças no recrutamento. A Porlis, por sua vez, comprometia-se a não contratar mais trabalhadores para além dos que estavam ao serviço até 15 de setembro de 2015. Mas as negociações foram suspensas por, entre outras razões, não ter havido um entendimento em relação à progressão automática na carreira, que os operadores recusam aceitar preferindo a avaliação por mérito
Serviços mínimos para as ilhas
No dia 10, o Ministério do Mar publicou um novo despacho para clarificar os serviços mínimos para as regiões autónomas durante a greve dos estivadores, no seguimento de uma queixa do Governo Regional da Madeira. O sindicato foi acusado de ter feito uma leitura restritiva das suas obrigações, considerando que apenas os bens essenciais, como os produtos alimentares e os perecíveis, estavam abrangidos pelos serviços mínimos. Mas o novo despacho especifica que os trabalhadores em greve terão de assegurar a movimentação de “toda e qualquer carga de dois navios de cinco em cinco dias” destinados a cada uma das regiões – Açores e Madeira – , incluindo as de produtos de primeira necessidade. E “sem interrupções”, desde o início das operações de descarga ou carga até à sua conclusão, à excepção dos “intervalos e interrupções obrigatórias” previstas na lei. Os arquipélagos da Madeira e Açores estão fortemente dependentes do transporte marítimo para o seu abastecimento.