Max Verstappen tem 25 anos e já é uma promessa na Fórmula 1 (F1). Foi duas vezes campeão mundial da modalidade, em 2021 e 2022, e terminou em terceiro lugar em 2019 e 2020 com a Red Bull Racing, equipa pela qual corre desde 2016.
Como piloto mais novo na história da F1, “Mad Max”, como é apelidado, estava destinado a ser um piloto de corrida. E desde a sua estreia bombástica, tem continuado a deixar uma marca neste desporto. Curiosamente, quem ocupava este posto era justamente o seu pai, Jos Verstappen: no início dos anos 90, começou a ouvir-se falar de Verstappen como uma grande promessa, tendo até sido apelidado de “Jos, the Boss”, ou “Jos, o Chefe”.
O jornalista desportivo James Gray quer, no livro que escreveu e que foi agora publicado, contar a história desta “lenda em ascenção”, que se acredita ainda ter muito para mostrar.
Max Verstappen: Uma biografia
Quando Max tinha onze anos, apareceu na televisão holandesa com o pai, para uma entrevista com Wilfried de Jong, num programa chamado Holland Sport. O entrevistador conversa inicialmente com Max, interrogando-o acerca dos seus resultados recentes (tudo vitórias, naturalmente). Max parece descontraído, rindo-se com De Jong enquanto o pai, ao lado dele, olha fixamente o vazio e junta ansiosamente as pontas dos dedos. A dinâmica está a tornar-se uma característica do papel de ambos em grandes eventos. Em todas as entrevistas que é possível encontrar com o jovem Max, ele mostra-se incrivelmente seguro de si, em comparação com outros rapazes da sua idade.
Quando Jos é finalmente interpelado, leva um momento a reagir, antes de contar a história de Max chorar por causa de Stan Pex poder andar de kart antes dele. De Jong sonda-o acerca da sua própria carreira e brinca com ele, usando a piada de ser bom a «estacionar». Mas é agora bem claro, se é que não era ainda, quais são as expectativas de Jos para o futuro.
«Fiz a 24 Horas Le Mans no ano passado, e gostaria de voltar a fazê-la. Ainda tenho contacto com algumas pessoas, por isso tenho alguma esperança», diz Jos. «Ando nas corridas desde os oito anos, portanto há vinte e nove, mas, quando vejo o meu filho correr, sinto mais orgulho no que ele faz do que naquilo que alguma vez fiz.»
Jos menciona que Max venceu 49 de 50 corridas, sendo que a única mancha adveio de se ter despistado ao passar numa zona molhada da pista. O incidente aconteceu em Eindhoven, onde tinha vencido as duas primeiras mangas do dia em condições de tempo seco. No entanto, havia uma curva na terceira e última corrida que tinha ficado com o piso molhado e Max não reparou, fazendo um pião e danificando os pneus, antes de colidir com outro piloto ao voltar a entrar na pista. Vindo da parte de trás do pelotão e num kart em más condições, conseguiu ganhar sete posições nas últimas seis voltas, terminando em 14.º lugar e conseguindo a 3.ª posição nos resultados gerais do dia.
«Parece que a forma como conduziu depois de ter ficado para trás foi uma loucura. Um revés não faz mal», disse Jos sobre esse dia. «Creio que coisas como esta servem para o tornar melhor.»
Publicamente, Jos aparentava calma em relação ao erro, mas, à medida que Max foi crescendo e falando mais sobre o relacionamento dos dois, parece óbvio que o erro foi discutido pormenorizadamente e sem poupar nas palavras. Os erros serviam para aprender com eles, naturalmente, mas sem nunca mais os repetir. Como tal, o deslize em Eindhoven foi um episódio raro. Já tinha vencido as primeiras duas rondas,
apesar de Jos estar longe, a fazer testes noutro lugar, e acabou por arrebatar o título Mini-Max da Bélgica por 37 pontos.
Embora Max fosse claramente talentoso, beneficiou de ter crescido em muitas das pistas usadas para corridas importantes. Em Genk, era praticamente imbatível. Em 2008, conquistou a Benelux Karting Series, em Horensbergdam, onde conhecia praticamente cada centímetro da estrada. Embora a tivessem pavimentado de novo pouco antes do fim de semana crucial, ele e Jos tinham lá ido na quarta-feira, para se certificarem de que sabiam o que tinham pela frente. Tendo sido apanhados desprevenidos algumas semanas antes, em Eindhoven, estavam mais determinados do que nunca em fazer as coisas bem. É difícil ver o karting como um castigo para Max, mas a sessão de treino extra foi seguramente motivada, em parte, pela dor dessa derrota. Acontece que a nova camada de asfalto era mais suave e pareceu ser mais adequada para Max. Quando o sábado chegou, conseguiu a pole position e venceu ambas as corridas, apesar de ter sido pressionado por Joel Affolter, que se aguentou sempre atrás dele, mas não o conseguiu ultrapassar.
«Foi emocionante, não foi?», gritou Max, depois da corrida. «O Joel foi rápido. Ele conseguiu acompanhar-me porque estava no cone de aspiração. Eu conduzi em linhas defensivas, para ele não me conseguir ultrapassar.»
A segunda vitória assegurou que não podia ser alcançado em termos de campeonato, mas ele regressou no sábado para arrecadar mais duas vitórias e levantar mais outro troféu em grande estilo, demonstrando exatamente por que razão a Pex Racing Team Kart era a número um. Tinha vencido onze das doze corridas da Benelux Series e, no entanto, a única que não venceu fica na cabeça da equipa. Não é necessariamente perfecionismo, mas antes pura competitividade que não perde o foco.
O nome Pex e Verstappen estavam a ficar rapidamente ligados. Max e os filhos de Richard Pex, Jorrit e Stan, eram todos estrelas em ascensão no mundo do karting, e os seus pais, ambos a viver uma segunda carreira através deles, tinham todo o prazer em continuar a apoiá-los. Embora Max corresse muitas vezes sob o nome de «Verstappen Racing» ou «Jos Verstappen», tinha feito parte da Pex Racing Team durante grande parte do seu sucesso inicial, numa rede de apoio inestimável. Embora Jos conte frequentemente a sua história de ele e Max contra o mundo, ele encontrava-se na plataforma de observação juntamente com Richard Pex e alguns outros, todos envergando o mesmo uniforme.
É claro que Jos estava focado em Max, mas não se coibia de ir dando ajuda e orientação a outros pilotos. Primeiro que tudo era pai, e a seguir professor, mas não limitava os conselhos ao seu filho. Estava dolorosamente ciente de que a sua carreira não era tão bem-sucedida como talvez devesse ter sido, e que se o seu próprio pai, Frans – um homem rigoroso e trabalhador, mas sem tradição familiar nas corridas
– tivesse tido à sua disposição o tipo de apoio financeiro e contactos que Jos viria a acumular, talvez tivesse acabado por lidar com as coisas de forma muito diferente. Quando ainda dirigia a equipa de karting, louvava os seus pilotos holandeses, mas precedia quase todos os comentários com a seguinte observação: «mas chegar à F1 não tem apenas que ver com talento», como que para reforçar o facto de ser suficientemente bom para ter êxito no desporto, mas não suficientemente sagaz para isso. Leiloava cursos de aperfeiçoamento de karting para ajudar obras de beneficência, e nunca se cansava de elogiar Robert Doornbos ou Christijan Albers, ou mais tarde Giedo van der Garde, que orientara pessoalmente.
Mas, com Max, tentava muitas vezes minimizar os seus talentos, embora o domínio absoluto dos seus resultados fosse difícil de esconder, e o clube de fãs dos Verstappen começava lentamente a passar das notícias sobre a carreira de Jos e dos comentários sobre desporto automóvel para relatos pormenorizados dos progressos de Max.
No final de 2008, Jos escreveu uma coluna no De Telegraaf, onde dizia estar a considerar parar por um ano, tirar uma licença sabática do automobilismo. Talvez fizesse a 24 Horas Le Mans – e, na realidade, acabou por correr com Anthony Davidson e Dafrren Turner pela Aston Martin – mas, fora isso, era boa altura para se retirar das corridas a tempo inteiro, sobretudo com a crise financeira a ter um efeito de contração na indústria automóvel, no seu todo.
Na verdade, a carreira de Jos já tinha acabado provavelmente há algum tempo, tendo cada vez mais dificuldade em conseguir garantir lugar numa equipa. Houve uma altura em que Huub Rothengatter ou, mais recentemente, Raymond Vermeulen conseguiam normalmente arranjar alguma coisa, com dois patrocinadores holandeses de peso e o lembrete oportuno de que Verstappen tinha uma velocidade que poucos possuíam. Mas, no Natal de 2008, Jos tinha 36 anos e há cinco que não pilotava numa série a tempo inteiro. O filho ia frequentar em breve a escola secundária (de vez em quando) e tinha uma carreira extremamente promissora como piloto de automóveis, e Jos estava sempre a perder partes dela, para fazer testes menores ou trabalhos de piloto em séries pouco importantes. A crise do crédito pode ter chegado precisamente na altura certa para ele a usar como cortina de fumo para se afastar.
Com a atenção focada exclusivamente em Max, torna-se notório que ele já não está a aprender grande coisa com as vitórias nos campeonatos de karting da Bélgica e do Benelux, por muito que isso possa reforçar a sua confiança. As únicas ultrapassagens que faz é nos treinos, porque parte invariavelmente da pole position, conduz um segundo mais rápido na primeira volta e depois controla a corrida, a partir daí. Jos insiste em dizer que Max tem «motivação suficiente para querer ficar na frente» e que os que vão atrás dele estão mais do que motivados para tentar deixá-lo para trás. Com Max a conservar agora os títulos que ganhou em 2008, o resto do panorama do karting começava a prestar-lhe atenção. Embora o termo hater ainda não estivesse cunhado, a verdade é que já existiam e atacavam em força. Nos fins de semana de corridas, havia acusações sussurradas de que Max tinha comprado o seu sucesso. Alguns pais dos rivais de Max chegaram mesmo a telefonar anonimamente para os jornais locais e nacionais que tinham começado a noticiar o seu sucesso, alegando que ele pilotava um kart ilegal. Nunca houve nenhuma prova disso e, quando muito, o facto de esses pais sentirem que tinham de fazê-lo demonstrava a capacidade de Max como piloto e da de Jos como mecânico. Jos aludiu às acusações numa entrevista onde mencionou que os karts «tinham de ser inspecionados novamente no final», por isso era impossível fazer batota. Na verdade, se a faziam, eram muito melhores do que qualquer um que já tivesse tentado, e continuaram a fazê-la até chegar à Fórmula 1. Parece pouco provável.
Jos estava bastante habituado às críticas e já estava ressentido por nunca se ter tornado o piloto de F1 que ele e outros achavam que podia ter sido. Entretanto, Max parecia alheio a tudo isso, fosse por escolha ou por acaso. Estava a viver o seu sonho e a caminho do objetivo que estabelecera antes de conseguir verdadeiramente expressá-lo: ser piloto de Fórmula 1.
Também houve outros sobressaltos, para além das suspeitas desagradáveis e infundadas de equipas rivais derivadas exclusivamente do facto de Max ser mais rápido do que eles. O Verstappen.nl publicou uma coluna intitulada «Value for Money», assinada por Frits van Eldik no verão de 2009, sobre os patrocínios e a vantagem de gastar uma soma relativamente pequena a patrocinar pilotos como Max, e o lucro que se podia obter quando ele chegasse à Fórmula 1, uns anos mais tarde. Frits, um fotógrafo de desporto automóvel holandês, conhecia Max desde que ele tinha uma semana e tirava fotografias a Jos desde o princípio da sua carreira, por isso dificilmente era neutro na matéria, mas isso é revelador do que os Verstappens sabiam que lá vinha. Iam ter de começar a viajar pela Europa, a pilotar e a prestar assistência a karts de maior dimensão, e isso ia começar a tornar-se muito dispendioso. Para além disso, se quisessem atrair o interesse de equipas seniores, ajudava terem uma série de patrocinadores a apoiá-los. Tinha sido isso que restringira Jos numa fase posterior da sua carreira, e ele não queria que a história se repetisse.
Por acaso, Max começou a enfrentar desafios em pista, ainda antes de terem feito a transição para a carreira internacional. Em Spa-Francorchamps, num circuito apertado no interior e na aproximação à famosa curva Blanchimont de alta velocidade, Max lutou contra a falta de aderência à estrada acidentada, como parecia acontecer a todos os carros produzidos pela CRG. Foi perseverante e venceu ambas as corridas no sábado, mas, quando regressaram no domingo, o dinamarquês Nicklas Nielsen no seu Tony Kart, cujo chassis lidava melhor com aquela superfície, bateu-o por duas vezes, mas Max não deixou de ganhar o título. Qualquer indivíduo à margem do desporto de elite que olhasse para o que aconteceu, um miúdo de onze anos a vencer mais um títulonacional e a triunfar em duas das quatro corridas num fim de semana, iria pensar que havia motivos para festejar. Mas não.
Max tinha vencido as dez corridas anteriores, e os seus dois segundos lugares no domingo confirmaram a renovação do título como campeão da Bélgica, desta vez na categoria de treze anos, quando ainda não tinha completado doze. Terminou o fim de semana no degrau mais alto do pódio, com mais um triunfo – mas sem a admiração do pai, que estava furioso com o facto de Max ter sido ultrapassado na última volta da última corrida.
«Fiquei muito desapontado! Nem mesmo na minha carreira me senti tão desapontado, depois de um incidente», disse Jos. «Ele ficou desapontado, mas quando viu a minha cara de zangado depois da corrida, não conseguiu fazer mais nada».
Max nunca tinha vivido uma situação destas. Portanto, não foi apenas o facto de ter perdido, mas também o de ser uma situação estranha. Aí está o motivo. Creio que é bom ter passado por isto uma vez, e ainda bem que aconteceu agora.»
Seria fácil ver estes incidentes pela perspetiva que Jos deseja que adotemos: que todos constituem experiências de aprendizagem e que, depois disso, é tudo um mar de rosas; que podem ser desvalorizados, considerando que é «só um jogo»; que a sua atitude em relação a Max era tão filosófica como a que tem posteriormente em relação aos jornalistas ou ao pessoal do clube de fãs dos Verstappen. Mas a verdade
é que vemos constantemente o temperamento e o espírito competitivo de Jos contaminar a relação entre ambos. Lembrem-se de que Max disse abertamente que a transição para a Fórmula 1 foi fácil porque nunca ninguém seria tão duro com ele como o pai. Nem mesmo o famosamente irascível e brutal Helmut Marko se compara com ele. Trabalhar sob a supervisão de Jos nem sempre terá propiciado um fim de semana agradável, mesmo quando Max vencia a maior parte das vezes.
Mas a engrenagem estava em movimento para levar Max a um patamar mais alto. Os regulamentos do karting, os mesmos que o tinham impedido de entrar em corridas até aos sete anos, impediam-no de competir internacionalmente, o que deve tê-lo deixado muito frustrado. Essa mesma raiva que o fizera chorar ao telefone com Jos, a pedir um kart aos quatro anos, voltou, provavelmente, quando o pai foi para Itália para o mundial, como mecânico de Jorrit Pex, enquanto Max era demasiado jovem para participar nas corridas. Max era mais rápido do que Jorrit, e sabia disso, mas não tinha idade suficiente. Anteriormente, no mundo do karting, isso nunca tinha constituído um verdadeiro problema, mas Max gostava de romper barreiras em todas as oportunidades.
O verão de 2009, depois de Jos ter despachado a sua participação na 24 Horas Le Mans pela Aston Martin (terminaram num dececionante 13.º lugar), foi passado a testar karts de fábrica na Alemanha, uma oportunidade para Max provar que não era apenas o melhor piloto da Bélgica; pelo meio, continuavam a esmagar a concorrência no panorama belga do karting, assim como a fazer uma ou outra corrida nos Países Baixos ou na França. Como era altura das férias de verão, Max podia pilotar praticamente todos os dias. Mas há uma corrida, numa rara viagem para correr no estrangeiro, apesar de fazer parte da série belga, que se destaca.
Em julho, tinham ido a Ostricourt, que ficava a apenas duas horas de viagem, do lado de lá da fronteira com a França. Um problema com o carburador na primeira corrida atirou Max para o fim do grupo, com uma volta de atraso, tendo terminado inevitavelmente em último. O que se seguiu é capaz de ter sido o desempenho que pôs em marcha o resto da sua carreira. Partindo em último para a segunda corrida, em rolling start, Max tem de abrir caminho por entre os outros, algo que raramente teve de fazer em toda a sua carreira. Os olhos do paddock estavam todos postos nele. Tinham visto aquele talento prodigioso dominar quando seguia na frente, «passear» através das qualificações e corridas, mas as únicas dúvidas que poderia haver eram
sobre a sua capacidade de lutar.
Ao fim da sétima volta, liderava a corrida. Uma câmara montada no seu motor permite-nos viver cada metro com ele.
Quando a corrida começou, ele tinha roubado uns metros extra de asfalto do lado direito para ultrapassar furtivamente quatro dos retardatários e, quando regressam à reta da partida/chegada ao fim de uma volta, já passara mais dois e está de olho noutro. Trata-se de Stan Pex, o rapaz que ele tinha visto a correr em Genk e que forçara os pais a comprar-lhe um kart. Os dois são colegas de equipa e amigos, mas isso significa pouco em pista. Max, tendo aquecido os pneus mais depressa, bem ao seu estilo, faz uma entrada por fora na primeira curva e regressa à trajetória com aderência superior para ultrapassar Pex. Não consegue resistir a fazer um pequeno aceno, ao ultrapassá-lo. Até ele sabe que foi um movimento bem executado, e que é pouco provável que o resto do pelotão lhe venha a causar grandes problemas. Como era de esperar, teve pouco trabalho com os dez primeiros e cruzou a meta com uma vitória confortável.
Durante o verão, Max parece ter dado um salto significativo enquanto piloto. Na pista perto de casa, em Genk, um circuito mais plano e simples, os rivais conseguiam, pelo menos, manter o contacto com ele, embora vencê-lo continuasse fora de questão. Nos outros sítios, como quando iam ao território de Schumacher, em Kerpen, Verstappen dominava de forma sensacional. O avanço em relação aos outros estava a tornar-se maior a cada semana e, juntamente com os resultados dos testes realizados nos bastidores e o desempenho em dia de corrida, um dos grandes nomes do karting europeu tinha visto o suficiente para apoiar Max na temporada seguinte. Em novembro, poucos meses depois de fazer 12 anos, assinou o seu primeiro grande contrato para se tornar piloto de fábrica da CRG na temporada de 2010. No seu comunicado de imprensa, a empresa italiana fez questão de referir o seu pedigree, listando os feitos de Jos antes dos do rapaz que tinham acabado de contratar.
Isto não foi porque a CRG quisesse alguma coisa de Jos. Estavam totalmente centrados em Max, embora os conhecimentos do pai ajudassem. A equipa da CRG nos Países Baixos era dirigida por Michel Vacirca, para quem Jos construíra motores, e que já tinha apoiado as iniciativas de Max no karting. Em Itália, sede da CRG, o fundador e proprietário Giancarlo Tinini estava de olho no seu progresso e, com a vantagem de falar a posteriori, admite que a sua contratação foi uma decisão fácil.
«Na realidade, o Max não foi uma descoberta minha! Qualquer pessoa que não fosse cega conseguia ver que ele era muito forte!», disse Tinini, anos mais tarde.
«A primeira vez que o vi foi [nos testes] em Muro Leccese, em 2009, creio eu. Não sabia quem ele era, apenas que conduzia um kart CRG e que gostava da forma um tanto louca como ele pilotava.
»Fui imediatamente falar com Max e disse-lhe que o queria na minha equipa, assim que tivesse a idade certa.»
Para Jos, isto deve ter começado a parecer uma repetição do início dos anos 1990, quando a sua carreira arrancou e todos os patrões da Fórmula 1 dignos desse nome ligavam a Huub Rothengatter, desesperados para porem o jovem holandês impetuoso no seu carro. Não foi a única semelhança. Toda a gente sabia que Jos era, no mínimo, um piloto decidido e Max, como Tinini diz, pilotava de uma «forma um tanto louca», que o atraía.
«Perguntaram-me muitas vezes qual era a sua principal característica», acrescentou Tinini. «Para mim, era o seu perfeito domínio do kart. Mesmo com pneus frios no início da corrida, ele consegue fazer o que quer do kart.
»Vemo-lo de imediato, já que há muito poucos pilotos capazes de fazer a diferença nas primeiras duas voltas de uma corrida. Um deles era Danilo Rossi [que correu contra Jos no karting], que não ganhou cinco campeonatos do mundo de karting por acaso.
»Outro traço distintivo é o estilo de corrida completamente agressivo, certamente herdado do pai, já que Jos era o bad boy típico contra quem ninguém gostava de correr.
»Max tem a mesma determinação e, comparado com ele, creio que é mais rápido. Digamos apenas que é uma grande mistura do pai e da mãe, Sophie Kumpen, que, por mérito próprio, é também uma bem-sucedida piloto de kart e carro.
»Além disso, Max tem um desejo inato de vencer, mesmo quando conduz um kart de aluguer. Nisso, lembra-me Hamilton, um piloto que queria ser primeiro, nem que tivesse de descer escadas».
Apesar da mudança para piloto de fábrica, em que a CRG fornecia a Max todos os karts de que precisasse, ele continuou a correr com o pai como mecânico principal, com a liberdade de ajustar e afinar os karts à medida do que fosse preciso. No fim de contas, Jos já tinha experiência naquele nível e estava em condições de fazer um melhor trabalho do que qualquer mecânico da fábrica CRG. Também não parecia preocupado com a forma como Max iria lidar com o aumento significativo de qualidade, a nível internacional. Em janeiro de 2010, viajaram para Lonato, em Itália, na ponta sul do Lago Garda – com uma paragem na sua estação de serviço favorita, pelo caminho – para uma sessão de testes. Os tempos por volta confirmaram aquilo de que Jos já desconfiava: que Max seria mais do que capaz de cuidar de si entre os maiores talentos do karting europeu. Porém, quando regressaram, um mês depois, para a primeira corrida da temporada, as coisas não foram assim tão simples. Os pneus Dunlop, uma versão mais dura do que nos anos anteriores, revelaram-se problemáticos, e as condições de frio e chuva, normalmente um ponto forte de Max, estavam a tornar mais difícil encontrar uma montagem que funcionasse de forma consistente. Jos estava perplexo. Estava tudo preparado. Até estava a chover, a especialidade de Max. O treino não tinha corrido bem.
Felizmente, a sorte de Max melhorou à tarde e ele qualificou-se com o quarto tempo mais rápido para a primeira de uma série de corridas que iria reduzir os cento e oito pilotos aos dezassete que disputariam a final. A corrida de sexta-feira à tarde seria uma de uma série de cinco contra o mesmo grupo de pilotos. Max estabeleceu a fasquia. Nas palavras do pai, ganhou «por uma rua». O almoço não lhes soubera particularmente bem, mas os Verstappens dormiram bem na sexta-feira à noite.
O sábado também correu bem e, quando alinharam para a final, no domingo, Max tinha derrotado todos os outros pilotos de fábrica da CRG. Partiu no 2.º lugar da grelha, normalmente uma posição que lhe garantiria praticamente a vitória. Mas, aqui, o nível era superior. Era praticamente a pessoa mais jovem na pista e Egor Orudzhev, que ocupava a pole position, tinha mais dois anos do que ele. Por mais que tentasse, Max não conseguiu arranjar forma de o ultrapassar e, quando a bandeira de xadrez desceu, cruzou a meta três décimas de segundo apenas atrás do russo, em 2.º lugar. Atrás dele ficaram nomes que se tornariam amigos e inimigos familiares ao longo dos anos seguintes: Alex Albon ficou em 3.º, Esteban Ocon em 7.º e Pierre Gasly em 9.º. Charles Leclerc não chegou sequer à final. Todos eles haveriam de correr contra Max ao mais alto nível, anos mais tarde.
O que é interessante notar é que, mesmo sendo tão jovens, estes pilotos já estão no radar das equipas de topo. Leclerc corre pela Maranello e será recrutado em breve pela empresa de gestão de carreiras de Nicolas Todt, cujo pai, Jean, correu pela Ferrari durante muitos anos. Albon sobe ao pódio, ao lado de Verstappen, com um macacão da Red Bull. Ocon, tal como Max, diz que sentiu que era apenas ele e o pai a lutar contra as grandes equipas no primeiro ano em que estiveram no karting internacional. O seu próprio pai, Laurent, era mecânico de profissão, mas não tinha a experiência de corridas de que Jos se gabava.
Max, e já agora Esteban, não tardaria a chamar a atenção, mas por agora ainda tinha muito para provar. Nas fotografias, está no segundo degrau do pódio, território a que não está habituado, e sorri para as câmaras. É um começo, mas nada mais.
«Umas vezes ganha-se, outras vezes perde-se», admite o pai. «Sejamos realistas, o Max só tem doze anos.»
No que parece ser um tema recorrente, a idade de Max não o deteve. Duas semanas depois, na pista de testes onde tinha chamado a atenção a Tinini, em Muro Leccese, garantiu a sua primeira vitória a nível internacional. Ocupa o degrau mais alto do pódio, mas mesmo assim os dois rapazes ao seu lado são mais altos do que ele, além de que mal consegue levantar o troféu, não que isso tenha alguma importância, é
claro; a única coisa que interessa é ele conseguir controlar o kart, e sobre isso ninguém tem dúvidas.
Chega a Genk para a penúltima ronda da Euro Series com o título da categoria KF3 ao seu alcance. Consegui-lo na pista onde cresceu, com tantos amigos e familiares a assistir, seria maravilhoso. No seu caminho estão dois homens que acabariam por vir a ser seus colegas de equipa na Red Bull. Partindo em terceiro lugar na final, e sabendo que só uma vitória lhe daria o título, ultrapassou Gasly ao arrancar da linha de partida, antes de um enorme acidente mais atrás levar à neutralização da corrida por bandeiras amarelas. «Eu estava a deslizar», diz Max, depois. «Os pneus já estavam bastante gastos esta manhã, e era difícil mantê-los quentes.»
Ainda assim, tenta desesperadamente ultrapassar Albon. Sem ameaças por trás, pode concentrar-se na ultrapassagem e num primeiro título em frente ao público da casa. Vai-se aproximando mais a cada volta, até sentir o motor começar a ceder. Não lhe está a dar a mesma força e os pneus deslizam para todo o lado. Mas Max mantém a calma. Faz um ajuste, para dar mais potência ao motor nas baixas e altas rotações, e isso parece corrigir o problema. Está novamente colado a Albon, mas não consegue encontrar forma de o ultrapassar. O piloto da Red Bull é o principal rival de Max na luta pelo título, e o holandês tem 77 pontos de avanço. Vencer esta última manga aumentaria ainda mais essa distância, mas ser eliminado reduziria o seu avanço para metade, se Albon acabasse por ganhar a corrida. O rapaz de 12 anos põe de lado a veia impetuosa que herdou do pai e conduz para os pontos, mostrando uma maturidade muito superior à sua tenra idade. Um mês depois, conquista a WSK Euro Series (categoria KF3) no sul da Itália. É a confirmação, se necessária fosse, de que Max tinha mais do que o suficiente para dominar a KF3, o primeiro nível do karting internacional, e já começa a falar na Super KF, embora só lhe permitam competir nessa categoria aos 14 anos.
Porém, não é insuperável. Albon pressionou-o o tempo todo na Euro Series e, quando voltaram a enfrentar-se no campeonato do mundo, em Portugal, o piloto anglo-tailandês com quase mais dois anos de experiência, levou a melhor sobre ele. «Só comemoro o 13.º aniversário na próxima semana, por isso não é assim tão mau», diz Max filosoficamente, depois disso.
Não há Albon quando viajam para o Egito, para a final da World Series, em Sharm El-Sheikh, mas, mais uma vez, Max sofre um revés. Na pré-final, colide com Robert Visoiu, defendendo a sua posição na reta passando para o lado interior da pista, antes de o romeno lhe bater por trás. Os comissários advertem Max, em vez de Visoiu, por condução perigosa e ambos iniciaram a final na primeira fila. Desta vez, foi Verstappen que perseguiu Visoiu e, num incidente quase idêntico, mas ao contrário, uma vez que foi Max quem bateu por trás. No entanto, desta vez, os comissários penalizaram o piloto que seguia à retaguarda e excluíram Max dos resultados da corrida, após o segundo aviso durante o fim de semana. Inicialmente, fica muito desanimado, o que é compreensível, mas mesmo assim reuniu pontos suficientes para conquistar o título da World Series. No entanto, isso é fraco consolo para Jos. Até agora, o filho parece ter aceitado a derrota com gentileza, humildade e maturidade, olhando para o panorama geral a maior parte do tempo. Para Jos, o panorama geral era de desigualdade, de mentalidade de cerco.
«Se é assim que vai ser, vamos deixar de participar nos campeonatos da WSK», diz Jos, furioso, à sua equipa de imprensa. «Eu tento pôr o meu filho a competir, tendo presente os valores importantes, e a honestidade também faz parte disso, mas é difícil de encontrar por aqui.
»Todas as ações de Max são vistas à lupa. Tentam abrandá-lo dessa forma, porque é a única que lhes resta. Na pista, dificilmente alguém consegue seguir Max.»
Embora a teoria da conspiração possa ser rebuscada, não está enganado no que se refere à competição em pista. Albon é o único a desafiá-lo de forma consistente e, na cerimónia de entrega de prémios da CRG, no final do ano, recebe a medalha de ouro das mãos do proprietário, Giancarlo Tinini, por ter conquistado o título da World Series. Um mês depois, na cerimónia mais alargada da WSK, ele e Jos recebem três
troféus pelos três títulos que alcançou.
As restrições etárias significam que tem de ficar na mesma categoria para a temporada de 2011, mas esta acaba por não ser pera doce para Verstappen. Os deuses caprichosos do karting e o tempo desempenham um papel importante, obrigando-o a exibir as suas capacidades de ultrapassagem na primeira parte da temporada, uma vez que faz piões em finais consecutivas após contacto, mas em ambas as ocasiões consegue voltar e abrir caminho até ao pódio. Esteban Ocon, agora no seu segundo ano de KF3, tal como Max, revela-se o seu principal rival, embora o futuro piloto de F1 George Russell também seja extremamente rápido, mas a capacidade de Verstappen para recuperar pontos em fins de semana difíceis é vital, e consegue uma almofada de pontos importante na Euro Series. Quando vão para La Conca, no sul da Itália, para a penúltima corrida da série, Max já está em posição de garantir o título um fim de semana antes. Depois, ocorre um desastre. Pela primeira vez na sua jovem carreira, Max encontra-se fisicamente incapaz de correr. A seguir ao treino de quarta-feira, sai do kart a queixar-se de uma costela dorida. Jos manda vir um fisioterapeuta holandês de avião para o observar, e Max não conduz durante todo o dia de quinta-feira, para ver se a dor desaparece. Corajosamente, tenta conduzir na sexta-feira, mas só consegue dar quatro voltas. Com a possibilidade de conquistar o título, pai e filho estão decididos a superar a barreira da dor. Mas, no sábado, torna-se demasiado forte e, a cinco voltas da qualificação, Max regressa às boxes, incapaz de continuar. As suas costelas e, agora, também as costas doem insuportavelmente a cada curva. São obrigados a desistir.
Os exames efetuados depois de regressar a casa não mostram lesões graves, e Max recupera a tempo do Campeonato Europeu, para aquilo que virá a designar por corrida de «carrinhos de choque». Consegue terminar apenas em 14.º lugar, depois de múltiplas colisões, e George Russell arrecada a vitória. Pelo menos, na semana a seguir, consegue conquistar o título da Euro Series, apesar de ter falhado um dos quatro fins de semana de corridas por causa da lesão e de um problema grave no motor. O seu regresso à World Cup, onde Albon o batera em 2010, viu-o colidir com outro futuro rival na F1, quando Charles Leclerc o ultrapassou e lhe bateu na roda da frente ao fazê-lo. «Parece que fez de propósito», disse Max, mais tarde. Na verdade, ele não tinha encontrado o ritmo certo durante todo o fim de semana, e Jos culpava-se por não ter afinado corretamente o kart. Max tenta dormir no regresso a casa de Itália, num esforço para estar pronto para a escola de manhã, mas as frustrações do dia tornam isso difícil. Mesmo assim, e embora Max possa não estar a vencer tantas corridas, a consistência dos seus resultados é o bastante para mostrar a quem tenha interesse nisso que ele é suficientemente bom para todas. E também não há falta de pessoas interessadas nele. O «Intrepid Driver Programme» (Programa para Pilotos Intrépidos), que já conta com Albon, Leclerc e Russell nos seus registos, anda atrás de Max desde que ele assinou pela CRG e, no final da temporada de 2011, os Verstappens acabam por ceder. Estaria agora nos mesmos karts do que alguns dos seus maiores rivais no karting, depois do ano provavelmente mais desafiante da sua carreira. Era óbvio que alguma coisa tinha feito bem, e poderia agora provar de uma vez por todas que era mais do que apenas filho de quem era.