Uma das questões principais que o Ministério Público pretende ver provada no julgamento dos autores do ataque à Academia do Sporting, em Alcochete, é o envolvimento do então presidente Bruno de Carvalho enquanto autor moral e mandante da invasão. Até ao momento, passaram pelo Tribunal de Monsanto pelo menos cinco testemunhas que, como os seus depoimentos, corroboram a teoria de que o ex-líder premeditou o ataque, por ter partido dele a decisão de alterar o treino da equipa da manhã de dia 15 para a tarde do mesmo dia, momento em que se deu a invasão, e por ter, na véspera dos acontecimentos, pedido apoio incondicional aos membros do seu staff, “acontecesse o que acontecesse” no dia seguinte. Claro ficou também, por estes depoimentos, que, ao contrário do que tem dito Bruno de Carvalho desde a data dos acontecimentos, no dia anterior ao ataque à academia, o presidente avançou mesmo com a vontade de despedir o treinador Jorge Jesus. Vejamos, então, os cinco depoimentos que tramam o ex-presidente do Sporting.
Ricardo Gonçalves, ex-coordenador de segurança da Academia de Alcochete
O antigo coordenador de segurança da Academia de Alcochete disse que Bruno de Carvalho reuniu com o staff um dia antes do ataque, perguntando “se estavam com ele, acontecesse o que acontecesse”.
Ricardo Gonçalves relatou ainda uma outra reunião, ocorrida em 7 de abril de 2018, só com o plantel, dois dias após uma derrota com o Atlético de Madrid, e do post publicado na rede social Facebook pelo antigo presidente do clube, a criticar os jogadores. Explicou que os elementos do staff não participaram nessa reunião, ficando do lado de fora do auditório, mas que foi possível ouvir “discussão, pois os ânimos exaltaram-se e as vozes aumentaram”. Gonçalves disse ter ouvido Bruno de Carvalho a chamar o guarda-redes Rui Patrício de “ingrato, armado em diva, vedeta e mimado”. Afirmou ainda que ouviu o jogador William Carvalho a acusar Bruno de Carvalho de ter telefonado a Nuno Mendes ‘Mustafá’, líder da claque Juventude Leonina, para “ameaçar e agredir os jogadores”.
Manuel Fernandes, ex-jogador, na altura, coordenador do departamento de scouting
“Tivemos uma reunião na véspera da invasão e o presidente disse uma frase que me fez pensar que ele se estava a referir ao despedimento do treinador”, afirmou Manuel Fernandes, aludindo à pergunta de Bruno de Carvalho: “Amanhã, vamos estar todos na academia às 16h00, e aconteça ou que acontecer vocês estão comigo?”.
Paulo Cintrão, assessor da equipa do Sporting
O assessor da equipa principal do Sporting estava na Academia na tarde do ataque de 15 de maio de 2018, e relatou em tribunal o cenário que encontrou no balneário. Tal como Manuel Fernandes, confirmou presença na reunião de dia 14. «O presidente foi muito objetivo. Disse qualquer coisa como aconteça o que acontecer amanhã, estarão comigo? O que pensámos foi: o Jorge Jesus já foi.»
Raul José, ex-adjunto de Jorge Jesus
O antigo treinador-adjunto do Sporting recorda que o reagendamento do treino de 15 de maio de 2018 foi feito por Bruno de Carvalho: “Houve uma reunião no dia 14 com a equipa técnica. Tivemos uma reunião para sermos despedidos. No fundo, fomos despedidos informalmente. A seguir houve reunião do Bruno de Carvalho com outros departamentos. O treino estava marcado para de manhã. Foi Bruno de Carvalho que sugeriu que o treino fosse marcado para a tarde, para recebermos a nota de culpa de manhã. Não havia nenhuma reunião marcada e nós pensámos que a sugestão tinha sido feita para que o departamento jurídico tivesse tempo para fazer a nota de culpa para sermos despedidos. Quando saímos da reunião, pensávamos que não íamos dar mais nenhum treino e que não iríamos ver mais Bruno de Carvalho.”
Miguel Quaresma, elemento da equipa técnica
Miguel Quaresma contou em tribunal os pormenores que se lembrava daquela reunião na tarde de dia 14 de maio, véspera do ataque: “Na segunda-feira à tarde chamaram a equipa técnica e disseram que era o fim da linha. Bruno de Carvalho manifestou o seu desagrado pela época […] Pela hora tardia a que acabou a reunião, ele sugeriu que a hora do treino fosse alterada para terem tempo para o documento ser redigido. Aliás, Bruno de Carvalho até disse que estava a ser nosso amigo porque a nossa ausência até podia motivar justa causa. Era para ser de manhã, passou para a tarde”