Michael Phelps nadou pela última vez nos Jogos Olímpicos e, finalmente, podem fechar-se as contas ao seu palmarés, sem receio de ficarmos desactualizados no dia seguinte: foram 28 medalhas olímpicas, 23 delas de ouro, três de prata e duas de bronze. Para as ganhar, ele teve que se atirar para a água em 63 provas, ao longo de cinco Jogos Olímpicos, num período de 16 anos, nadando um total de 11 800 metros. Das 30 finais em que participou, só por duas vezes (na estreia, em Sydney 2000, com apenas 15 anos, e nos 400m estilos de Londres 2012) não subiu ao pódium.
Para além destes números, Michael Phelps sabe que tem também uma outra medalha em seu poder, que não se materializa em metais preciosos, mas que foi um dos objectivos que ele mais perseguiu ao longo da sua carreira, conforma confessou no Rio de Janeiro, nas suas declarações de despedida. “Eu queria mudar este desporto e acho que o consegui”.
O seu legado é bem visível em muitos dos campeões consagrados nestes Jogos do Rio: jovens que começaram a treinar e a dar o máximo nas piscinas porque queriam “ser como Michael”. Jovens que Phelps inspirou, demonstrando que as metas aparentemente impossíveis podem ser alcançadas, desde que o atleta se comprometa com elas, não desista e tenha capacidade de sacrifício e de superação. Não é “conversa mole”, Michael Phelps provou que essa pode ser a realidade. E quem não acredita nisso é porque nunca o viu nadar ou não sabe contar medalhas – mas a verdade é que muito poucas pessoas sabem, realmente, o quanto custa ganhar uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos, o grau de exigência que é preciso meter em cada treino, todos os dias, ao longo de vários anos.
Michael Phelps com Joseph Schooling, vencedor dos 100 metros mariposa, em Singapura, em 2008
Katie Ledecky, Joseph Schooling e outros jovens campeões do Rio 2016 são a prova do legado deixado por Michael Phelps num desporto que ele mediatizou de uma forma global, e extremamente consistente, ao longo de década e meia. Quando ele começou a participar em Jogos Olímpicos, a maioria dos nadadores (com a excepção de Alexander Popov) retiravam-se, em média, ao fim de dois ou três ciclos olímpicos, e eram considerados veteranos depois dos 26 anos (Mark Spitz deixou as piscinas aos 22 anos). Phelps, com os seus desafios impossíveis, transformou o desporto a que dedicou a maior parte da sua vida. E fê-lo ao longo de anos de transformação: com fatos especiais ou apenas de calções, como jovem ou como veterano, frente a adversários da sua idade ou perante fogosas promessas. E, com isso, trouxe mais dinheiro e notoriedade para o seu desporto e, igualmente, para o olimpismo em geral.
Agora, com a sua retirada, fica campo aberto para muitos jovens tentarem ocupar o seu lugar. E quase todos eles com um ponto em comum: começaram a nadar inspirados pelos feitos extraordinários de Michael Phelps.
Quando tinha 9 anos, Katie Ledecky pediu para lhe tirarem uma fotografia com o seu ídolo. Depois das suas impressionantes cinco medalhas (quatro de ouro e uma de prata) nos Jogos do Rio, é a nadadora que está em melhor posição para seguir o legado de Phelps, podendo, igualmente, acumular um número impressionante de medalhas olímpicas – tem apenas 19 anos e, no mínimo, mais três Jogos à sua frente.
Joseph Schooling, o nadador de 21 anos de Singapura, foi o mais rápido de todos a começar a ocupar os lugares que o mestre vai deixar vago. Oito anos depois de ter tirado também uma foto com Phelps, roubou-lhe o ouro, no Rio, nos 100 metros mariposa.
No pódium dos 200 metros mariposa – a prova que Phelps dominou de forma mais consistente ao longo da sua carreira e de que se sagrou recordista mundial com apenas 15 anos – os medalhados de prata e bronze foram também dois dos representantes da nova geração Phelps que começa a surgir: o japonês Masato Sakai e o húngaro Tamas Kenderesi. O primeiro tem 21 anos e o segundo acaba de completar 19 anos. Ambos se dizem inspirados por Phelps.

O nadador japonês Maiya Seto, medalha de bronze nos 400 metros estilos, quando tinha 8 anos e pediu para tirar uma foto com Michael Phelps
O mesmo acontece com Daiya Seto, outro nadador japonês, de 22 anos, medalha de bronze nos 400 metros estilos, no Rio. Quando tinha oito anos, ele também pediu para tirar uma foto com Phelps.
Mas é porventura na equipa dos Estados Unidos que melhor se percebe o quanto o exemplo de Michael Phelps encontrou seguidores. Quando ele chegou à selecção americana, começava a desaparecer a hegemonia que os EUA tinham tido, durante décadas, na maior parte das provas. Novas fornadas de nadadores australianos, franceses, holandeses, brasileiros, sul-africanos e húngaros irrompiam e tinham até o descaramento de derrotar os americanos nas estafetas mais emblemáticas.
No Rio de Janeiro, os EUA voltaram a ser a potência dominante da natação. É o primeiro sinal da geração Phelps.