Há um incêndio a arder-lhe no discurso: Valter Hugo Mãe escreveu um poderosíssimo novo romance, o seu oitavo, dedicado às raízes e cicatrizes do colonialismo. E o escritor tem muito que dizer sobre o assunto. As Doenças do Brasil, contado do ponto de vista dos oprimidos vermelhos e negros, desatou a conversa sobre preconceitos, justiça histórica, estátuas colonialistas e vontade de correr riscos literários – algo que este galardoado com o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores 2021, por Contra Mim, defende ainda e sempre. E já o gravador parara de rodar quando Valter revelou o próximo projeto: “Vou escrever sobre a ilha da Madeira, é um regresso literário a Portugal. Há uma personagem muito forte que me persegue há mais de dez anos. Vai desdobrar-se num casal, nos anos 1970. O enfoque principal tem que ver com a questão de fé: vou criar um estranho profeta nas falésias da Madeira…”. Por agora, é o seu amado Brasil que marca o mapa.
Para a badana d’ As Doenças do Brasil foi fotografado a arrastar uma raiz de árvore e cumpriu agora 50 anos… São pistas para dizer que é capaz de se pôr na pele do Outro?
Eu não tenho a certeza absoluta, e provavelmente nunca terei, dessa urgência que é verdadeiramente entendermos a pele do Outro. Mas é verdade que a maneira como os meus livros me acontecem passa, cada vez mais, pela sensação de lidar com um universo paralelo, algo que me obriga a sair da minha realidade. Este livro é-me desconhecido, no sentido em que não vem de nenhuma Ciência que eu sinta dominar.