A ideia foi do festival de arte pública Walk & Talk, que termina este sábado, 1 de agosto, em São Miguel, nos Açores: juntar, numa residência artística, o designer do Porto Nuno Coelho, a fábrica Gorreana e a Tipografia Micaelense. O resultado já é visível: quatro novas embalagens de chás com uma imagem simples, inspirada no passado para chegar ao futuro. Uma edição limitada, que, espera-se, chegue depressa a algumas lojas.
O projeto começou em maio, quando Nuno Coelho visitou, pela primeira vez, a fábrica Gorreana, aberta desde 1883 e única na Europa. “Confesso que fiquei dececionado porque vendiam-se exatamente os mesmos pacotes de chá que em qualquer outra loja. Não havia nada que me dissesse ‘eu vim à fábrica’. E a verdade é que ali já existe tudo, neste trabalho não foi preciso inventar nada”, diz o designer de 39 anos. Resolveu ir em busca do espólio da Gorreana e mergulhou nos arquivos: entre os caixotes de rótulos antigos que ainda há por ali e jornais de outras épocas, descobriu apenas três anúncios aos chás (que hão de ser transformados em postais) e alguns pormenores de design em que pegou para modificar as embalagens prateadas e coloridas que agora se vendem.
E se um Nuno pode muito, dois Nunos mais ainda, acredite-se. Nuno Coelho convidou Nuno Neves, das Publicações Serrote, para conceber com ele as novas imagens na Tipografia Micaelense. A trabalhar há 10 anos (tem 39, também) com caracteres tipográficos móveis entre Algés e a Serra da Lousã, quase parece fácil o que faz, quando o vemos manipular de forma minuciosa e precisa, com a ajuda de uma pinça, as minúsculas peças de chumbo. Escolhidas entre os milhares que existem na tipografia de Ponta Delgada, compõem agora as imagens criadas para as novas embalagens. Com elas, os designers “desenharam” um bule de chá, que depois dividiram em quatro partes iguais – a cada uma atribuíram uma das qualidades de chá mais populares na Gorreana (os pretos Pekoe, Orange Pekoe e Broken Leaf, e o verde Hysson) e uma das quatro cores já usadas pela marca (vermelho, azul escuro, azul claro e verde). Comum a todas as embalagens é o papel craft e o castanho das letras ( no entanto, o tipo escolhido para o nome varia consoante a leveza do chá).
Com a ajuda do açoriano Dinis, que comprou a Tipografia Micaelense em 1996, e numa máquina de impressão que não terá muito menos anos do que esta casa aberta desde 1957, os dois Nunos apuraram as cores, a localização exata dos carateres móveis, a pressão com que estes imprimem o papel. Pouco depois, estavam já na fábrica Gorreana, a ver as folhas serem transformadas em embalagens como ainda se faz por ali: à mão, com a ajuda de um paralelepípedo de madeira. Tão simples e artesanal como o chá que levam dentro e a imagem que agora ostentam por fora.