Se em Django Libertado, de Quentin Tarantino, descobrimos uma forma original de reabrir e sarar as feridas da América esclavagista pré-Guerra Civil, em Lincoln, de Steven Spielberg, encontramos a sua sequela em termos históricos, mostrando que a História da América marca grande presença nos Oscars e só não chega a tempos mais recentes porque 00:30 A Hora Negra, de Kathryn Biggelow, que mostra a morte de Bin Laden, foi compreensivelmente esquecido pela academia. Tal como Django Libertado, Lincoln tem gerado alguma polémica, porventura inevitável quando se retrata uma das personagens mais queridas da América. Foi na presidência de Lincoln que se aboliu a escravatura, terminou a Guerra Civil e se reuniu os Estados Unidos. A América das liberdades e oportunidades começou ali. O que custa aos americanos digerir é que a famosa e tão nobre 13.ª emenda (imenso exemplo que a América deu ao mundo), passou na Casa dos Representantes em troca de 20 queijos limianos. Ou seja, foi tudo feito através de negociatas, pequenas corrupções, promessas de cargos, enfim, o mais sujo jogo político que, noutra escala, talvez ainda hoje permaneça, pelo menos no cenário americano. Mais ainda, sugere que grande parte dos próprios republicanos, que defendeu a aprovação da emenda (alguns pouco convencidos), fê-lo por estratégia política com o objetivo de vencer a guerra, e não tanto como por convicção moral e humanitária. Explique-se que, na altura, Republicanos e Democratas desempenhavam papeis opostos. Os primeiros eram antiesclavagistas, os segundos mais conservadores. E é o facto de ter sido por iniciativa dos Republicanos que a escravatura acabou que explica que, até ao aparecimento de Obama, grande parte da comunidade negra dos Estados Unidos votava no Partido Republicano. Se Tarantino e Spielberg quase fazem coincidir o período histórico, os filmes não poderiam estar mais distantes no resto. Tarantino fez um filme de ação, Spielberg um filme em que as ações são as palavras. Isto apesar de ter um excelente retrato do campo de batalha logo de início. Se por vezes os filmes de tribunais se tornam enfadonhos, o que dizer de um filme de parlamento? Lincoln não é sobre o lendário Presidente americano, mas antes sobre a 13.ª emenda e o processo politico que levou à sua aprovação. Por isso, as mais importantes cenas são de bastidores ou de alarve combate politico parlamentar. E também as mais marcantes. Daniel Day Lewis, a quem a Time apelidou de melhor ator do mundo, fica aquém das expetativas. Joaquin Phoenix desilude, mostrando-se um ator pouco versátil. O grande papel é o de Tommy Lee Jones. Até porque encarna a personagem de Thaddeus Stewart, o verdadeiro Lincoln vale pelo retrato de época e a pertinência histórica do tema. Mas há Spielbergs que valem bastante mais do que este. Lincoln, de Steven Spielberg, com Daniel Day Lewis, Tommy Lee Jones, Sally Field, Joseph Gordon-Levitt, Hal Holbrook, James Spader, 150 min