Não me recordo como conheci o Pedro Camacho, mas desde que o conheci que me lembro dele. Até certa altura foi o irmão do Paulo, meu camarada de redação no Expresso; quando a Impresa comprou a Visão e começámos a partilhar iniciativas e reuniões, o Paulo passou a ser o irmão do Pedro, troca de protagonismos que a nenhum deles importava. Discutimos, viajámos, confraternizámos em eventos. Eu gostava do Pedro.
Era um homem sério, um jornalista empenhado e intransigente. Sabia o que era ser e fazer jornalismo. Não era um desses modernos produtos, especialistas em Comunicação. Não. Ele era um homem dos jornais e do jornalismo.
Faltava-lhe um atributo. Não era cabrão. Quando entrei para os jornais, no Popular, salvo erro o Baptista-Bastos, costumava gritar lá do fundo da sala com a linguagem colorida da segunda metade dos anos 70: «Cada chefe cada cabrão».
Na altura, eu era o subordinado dos subordinados, pelo que era fácil concordar com ele. Anos depois, entrei na fileira dos chefes, por onde andei alguns anos. Sem me esquecer do escárnio do Bastos, sinto, no entanto, que fui ou pareci, por ação ou omissão, mais vezes do que gostaria, cabrão. Pesa-me a consciência
Acho que o Pedro nunca o terá sido. Era de consensos, de soluções serenas e repensadas, sem magoar quem quer que fosse. Partiu, certamente, de consciência tranquila, como se querem as boas consciências.
Um dia convidou-me para a Visão. Discutimos o projeto e, infelizmente, não conseguimos entrar num caminho comum. Ficámos tão próximos como éramos antes.
Mais tarde foi a administração da Impresa que me desafiou a suceder-lhe. Ele avisou-me que eu não iria conseguir chegar onde queria, que a sua revista sempre fora uma enteada na Impresa. Não acreditei, pensava que seria capaz e mantive essa convicção durante um ano. Até lhe dar razão e o futuro mostrar como ele sabia o que estava a dizer.
Passou a pasta como um homem de bem e profissional de respeito e só espero ter estado à altura da forma como me tratou.
O Pedro, o chefe que não sabia ser cabrão, sabia do que falava.