Durante os 104 minutos de Aqui, a câmara mantém-se estática, como se estivesse ali esquecida, sem qualquer tipo de movimento. Diante disto, podemos pensar que estamos perante um realizador minimalista europeu, que quer transportar para o cinema a liberdade de olhar dos espectadores de teatro. Mas não.
O realizador em causa é Robert Zemeckis, autor de grandes sucessos de bilheteira, incluindo a saga Regresso ao Futuro e Forrest Gump (aquele que roubou o Oscar a Pulp Fiction, num dos mais consensuais erros históricos da academia).
A imobilidade da câmara de Zemeckis é compensada pelo movimento do que se passa do lado de lá. Não é por a câmara não se mexer que se torna um filme parado. Aliás, a sua ousada lógica de movimento nem se aproxima assim tanto do teatro, afigura-se mais como um desafio tecnológico, algo que Zemeckis gosta e sabe explorar no seu cinema.
Se tudo tem um tempo e um espaço, em Aqui Zemeckis encontrou um subterfúgio para congelar o vetor espaço e assim debruçar-se plenamente sobre o vetor tempo, tornando-o um ponto de reflexão filosófica e até existencial.
Aqui parte da novela gráfica de Richard McGuire e conta com Eric Roth no argumento, que já trabalhara com Zemeckis em Forrest Gump
Aqui é um multiplot condensado num só enquadramento, em que mantemos o mesmo olhar sobre uma sala de estar americana ao longo de séculos.
Aliás, o filme passa mesmo pelo tempo anterior à construção da moradia, quando os nativos habitavam aquelas terras virgens. Zemeckis salta entre tempos e personagens de forma não cronológica, dando uma ideia de aleatoriedade, que é como quem diz, ao longo dos séculos as preocupações humanas mantêm-se: a vida, o nascimento, a morte, o amor, o desamor, etc…
Não obstante a alternância, acaba por se focar mais numa história familiar, dando protagonismo a Tom Hanks e Robin Wright. Zemeckis, que sempre foi um adepto da experimentação tecnológica, usa software para o rejuvenescimento digital das personagens. O resultado é impressionante, sobretudo em Hanks, que o recoloca na imagem que guardamos dele dos anos 80. O cinema sempre foi feito de pequenos e grandes truques.
Aqui é conceptual e tecnologicamente ousado, cheio de pirotecnia, mas não deixa de ser um bom filme de Natal, daqueles que só os americanos sabem fazer.
Aqui > De Robert Zemeckis, com Tom Hanks, Robin Wright, Paul Bettany > 104 min