O melhor elogio que se pode fazer a One Love, o biopic de Bob Marley, é que se sai do cinema com vontade de voltar a ouvir as canções do músico jamaicano. One Love é a primeira grande produção que faz um retrato da maior lenda do reggae. Sobre ele juntavam-se muitas expectativas. Mas deve dizer-se que, sob muitos pontos de vista, fica aquém do que Marley merecia.
O problema base talvez seja a linguagem estética. Reinaldo Marcus Green quis fazer um filme muito limpinho, como se todas as personagens e ambientes passassem por um filtro de Photoshop. Falta sujidade àquela Jamaica e crueza ao ambiente retratado. Tanto que demora bastante tempo até conseguirmos acreditar que Bob Marley está ali à nossa frente.
Talvez aí o maior problema seja mesmo Kingsley Ben-Adir. O ator é demasiado bonitinho e não é capaz de transmitir verdadeiramente a dimensão humana de Marley, a dureza da sua história, as marcas de vida que trazia estampadas no rosto, apesar da sua morte precoce, aos 36 anos.
À parte isso, One Love é um filme que puxa pelo lado místico. Nesse sentido, é um filme religioso, que expande o rastafári como uma religião que ultrapassa o contexto artístico. Aliás, fica clara a ideia de que a música dos Wailers está para servir a entidade suprema de Jah e nunca ao contrário.
Reinaldo Marcus Green não resiste a uma certa idolatria, que enfraquece a personagem. Ainda assim, consegue explicar, em duas pinceladas, os contextos políticos, familiares e da própria indústria discográfica. A política acaba mesmo por dominar o ambiente numa Jamaica à beira de uma guerra civil, em que Marley assume o papel de mediador e herói, sobretudo depois de ter sobrevivido a uma tentativa de atentado. Há também uma ideia política mais abrangente e universal, inspirada em Jah, que defende a emancipação negra, dos povos oprimidos de África, que se aplica naturalmente às Caraíbas. Mas sobretudo faz um apelo universal à paz, à fraternidade e à tolerância. Esse é, ainda hoje, o maior legado de Bob Marley.
Bob Marley, One Love > De Reinaldo Marcus Green, com Kingsley Ben-Adir, James Norton, Lashana Lynch, Michael Gandolfini > 104 min