As questões de género tornaram-se o tema central da nossa sociedade, mas nem sempre é fácil encontrar um filme que aborde o tema de forma certeira, pertinente e original. Em 20 000 Espécies de Abelhas, Estibaliz Urresola Solaguren consegue fazê-lo até determinado ponto, através de uma abordagem naturalista, quase sempre convincente.
Trata-se da primeira longa-metragem da realizadora, que já havia dado nas vistas com as suas curtas-metragens, e à qual o Curtas de Vila do Conde dedicou este ano um Foco. O filme, de resto, foi premiado em diversos festivais, com destaque para Berlim.
Talvez o elemento mais diferenciador de 20 000 Espécies de Abelhas seja a idade da protagonista. O filme procura abordar a questão da identidade de género, de uma rapariga que nasce no corpo de um rapaz, de forma muito precoce, apenas aos oito anos. E mostra tal num caso exemplar, claríssimo, em que na perspetiva de um olhar exterior, a do espectador, não sobram dúvidas quanto ao verdadeiro género da protagonista.
Assim, mais do que a autodescoberta, também focada, trata-se da construção ou desconstrução social, de uma batalha para a transformação e aceitação comunitária, num contexto de relativa hostilidade e permeável ao choque. Sendo que a própria protagonista, demasiado jovem, ainda está à procura das ferramentas para se impor ou defender no seio de uma família, por si só, conflituosa e distópica, tendo como grande figura de descomplexificação psicológica a tia apicultora. Tudo o resto se traduz numa rede ampla de conflitos familiares exacerbados.
Estibaliz arrisca construir um filme nas costas de uma jovem atriz que, apesar de algumas fragilidades, é bem-sucedida. Mas, à parte de Sofía Otero, a jovem que se revela mais do que promissora, o grande papel é o de Patricia López Arnaiz, enquanto mãe, que nunca perde o sentido puro do afeto durante as turbulências do processo.
20 000 Espécies de Abelhas > De Estibaliz Urresola Solaguren, com Sofía Otero, Patricia López Arnaiz > 128 min