“É uma coisa que acontece muito frequentemente: fazermos aquilo que pensávamos que nunca faríamos. E isso significa, muitas vezes, um motivo de criação e de avanço no nosso trabalho.” Cláudia Jardim explica que não fazia sentido os Praga continuarem a trabalhar no modelo da trilogia sobre Shakespeare, já fechada, proposta pelo CCB para a escala do Grande Auditório, e foi assim que decidiram fazer agora um bailado, A Sagração da Primavera. Peça seminal do início do século XX, apresentada pela primeira vez em Paris pelos Ballets Russes, com música de Stravinsky e coreografia de Vaslav Nijinsky, A Sagração da Primavera retrata ritos pagãos russos e toda a energia celebrativa – e igualmente demoníaca – inerente ao ato de escolher e sacrificar uma jovem como oferenda à mãe-Natureza.
À semelhança das obras interpretadas pelos Ballet Russes, os Praga pensaram a sua A Sagração da Primavera em três atos: um prólogo – introdutório à peça de 1913, aos Praga, à sua visão da arte e da vida –, o ato criativo de montagem da peça tornado visível e, por fim, o bailado em si, dividido em duas partes, e acompanhado pela Orquestra Metropolitana de Lisboa. Os atores chegam ao palco numa carrinha pão de forma. “Tudo é sagração; a sagração é o ritual que este grupo de pessoas constrói – em direto e ao vivo – e o processo de chegar lá”, esclarece Cláudia Jardim, explicando não se tratar de uma desconstrução feita a este clássico de Stravinsky/ Nijinsky mas sim de uma extensão que lhe conferiram. É dar palco, como diz Diogo Bento, a todas as representações feitas deste espetáculo, inclusive as que estão por vir. A existência desse prolongamento, explicam-na através da simplicidade inerente ao desejo: “Porque nos apeteceu.” Um desejo, ou sucessão de desejos, que, para se materializar, necessita, asseguram os Praga, de muito trabalho e estruturação de pensamento. Como explica Diogo Bento, em personagem de cicerone do prólogo, que se assume como uma fraude: “O mundo é uma paisagem morta onde vamos injetar vida.”
A Sagração da Primavera > Centro Cultural de Belém > Pç. do Império, Lisboa > T. 21 361 2400 > 17-18 jun, sex 21h, sáb 19h > €18 a €30