Paul Klee dizia que “desenhar era levar uma linha a dar um passeio”. Mesmo sabendo que o artista suíço se referia essencialmente à sua prática pictórica, a famosa frase descreve na perfeição a arquitetura brasileira do século XX. Com muitas curvas e contracurvas, quadrados e retângulos, mas também esferas e ângulos indefiníveis, os grandes nomes do outro lado do Atlântico foram capazes de explorar os limites da disciplina, num hábil jogo entre matéria e vazio. Nas mãos dos arquitetos brasileiros, a linha que define cada projeto dança e passeia, numa festa das formas. É o que dá a ver Infinito Vão, uma retrospetiva comissariada por Fernando Serapião e Guilherme Wisnik.
O que mais se destaca na exposição é a diversidade. É certo que Oscar Niemeyer está no centro da arquitetura brasileira, com construções emblemáticas, nomeadamente em Brasília, mas a mostra percorre o trabalho de 136 criadores, com obras entre 1928 e 2018. Sugere-se até uma curiosa dicotomia entre duas escolas, uma radicada no Rio de Janeiro, outra em São Paulo. A primeira, mais dócil e sedutora; a segunda, mais radical e ideológica. Uma assente na curva e na leveza; outra feita de linhas retas e de betão. Ambas desafiadoras e originais.
A exposição divide-se em seis núcleos cronológicos, criados em torno de uma música. De 1928 a 1945, o mote é o samba A História do Brasil, de Lamartine Babo, que remete para o início do modernismo brasileiro. Seguem-se as décadas da ditadura brasileira, revisitadas ao som de Tom Jobim, de Caetano Veloso e de Chico Buarque de Holanda, com um contraste entre a falta de liberdade e o desenvolvimento económico. No fim, o rock dos anos 80, para as respetivas transformações políticas e sociais, com inevitáveis reflexos arquitetónicos, e o rap dos Racionais MC’s, para os desafios da atualidade. Apoiada numa investigação exaustiva, Infinito Vão apresenta-nos o desenho completo de uma arquitetura que, como poucas, marcou casas, cidades e a identidade do país.
Infinito Vão é complementada com a mostra Duas Casas, que apresenta dois projetos habitacionais de Paulo Mendes da Rocha, destacado arquiteto brasileiro e autor do Museu dos Coches, em Lisboa.
Infinito Vão – 90 anos de arquitetura brasileira > Casa da Arquitetura > Av. Menéres 456, Matosinhos > T. 22 240 4663 > até 28 abr, ter-sex 10h-18, sáb-dom e feriados 10h-19h > €5