O percurso cinematográfico de Bruno de Almeida observa-se através do cruzamento de dois mundos. Por um lado, o Portugal onde nasceu e atualmente vive, por outro, os Estados Unidos da América (e sobretudo Nova Iorque) onde estudou cinema e pelo qual mantém um imenso fascínio. Neste Cabaret Maxime tal torna-se mais visível do que nunca. Na sua essência, trata-se de um filme indie americano feito em Portugal. Apesar de todos os elementos identificáveis para quem conhece a geografia da cidade, este Cabaret Maxime passa-se numa Lisboa etérea, vaga, que pode ser confundida, por exemplo, com as docas de Nova Iorque – mas também uma cidade difusa no tempo, porque não existem elementos suficientes para nos prender a uma época histórica.
Contudo, não deixa de estar presente a homenagem ao Cabaret Maxime propriamente dito, um carismático espaço de diversão noturna na Praça da Alegria (no filme, é deslocado para o Cais do Sodré), que teve muitas vidas, a última das quais com gestão e direção artística de Manuel João Vieira (sendo o próprio Bruno de Almeida seu sócio). E é sobre esse fabuloso universo do artista plástico, ator e músico dos Ena Pá 2000 que se desenvolve o ambiente. E a criação desse ambiente é o que Cabaret Maxime tem de mais extraordinário.
Há uma espécie de elogio da decadência. Uma luta pela persistência, pela memória, de uma ideia de cabaret (ou de circo) familiar, kitsch, com a dançarina gorda, a loira que se despe ao lado do tigre, rancheras mexicanas e variedades à moda antiga. Tudo marcado pela ideia de um tempo em vias de extinção, uma era carismaticamente humana, errónea e errante, que dá inevitavelmente lugar a uma espécie de perfeição homogeneizada, tipo fast food. É isso que transforma este universo particular e difuso em algo extremamente universal, metaforicamente referindo-se à gentrificação que tem sofrido Lisboa nos últimos tempos.
Tudo o resto é festa. O fabuloso universo musical e performativo de Manuel João Vieira, com interpretações do próprio, de Selma Uamusse e de Phil Mendrix, entre outros. E boas atuações de um elenco excecional feito de americanos e portugueses, em que brilha uma grande senhora do cinema chamada Ana Padrão, emocionalmente arrebatadora.
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Cabaret Maxime > de Bruno de Almeida, com Michael Imperioli, Ana Padrão, David Proval, John Ventimiglia, Manuel João Vieira > 94 minutos